A nova edição da chamada “lista suja” do trabalho escravo, divulgada nesta quinta-feira (05) pelo governo federal, inclui 13 empregadores envolvidos com garimpos no Pará, Mato Grosso e Bahia, além de cinco fornecedores de gado da gigante de proteína animal JBS.
Em nota encaminhada à Repórter Brasil, a assessoria de imprensa da empresa afirmou que “todos os cinco produtores foram bloqueados pela JBS no dia de hoje, assim que foi divulgada a atualização da Lista Suja do Trabalho Escravo”. Ainda segundo o texto, a medida reforça o compromisso da companhia “com uma cadeia de valor sustentável”. Confira o posicionamento na íntegra.
Dentre os pecuaristas que encaminharam bois para frigoríficos da JBS está Vanúbia Silvia Rodrigues. Em 2022, ela foi responsabilizada pela exploração de mão de obra análoga à de escrava na Fazenda Presente de Deus, localizada em Ourilândia do Norte (PA).
Também no ano passado, a propriedade forneceu animais para as unidades de Redenção (PA) e Santana do Araguaia (PA) do frigorífico, segundo documentos de trânsito de gado acessados pela Repórter Brasil.
Outro caso no Pará é o da pecuarista Lenir Maria Pimenta. Em 2021, três trabalhadores foram resgatados na Fazenda Serra Rica, de sua propriedade, localizada em Cumarú do Norte. A fazendeira também encaminhou animais para serem abatidos na unidade de Santana do Araguaia (PA) da JBS, em 2021 e 2022.
Procurado, o advogado de Pimenta, Adilson Vitorino da Silva, afirmou que “há um grande equívoco” e que sua cliente “não tem qualquer correlação com esse pessoal que estava trabalhando”. Ele admite, no entanto, que Pimenta é a dona da fazenda onde os trabalhadores foram resgatados. Porém, “quem toma conta lá são parentes”, disse.
No Mato Grosso, a unidade da JBS em Colíder comprou gado este ano da Estância Marupá, localizada em Guarantã do Norte. A fazenda pertence a Mercídio Panosso, prefeito do município entre 2008 a 2011, e alvo de uma fiscalização em 2021. Seis trabalhadores foram encontrados no local em condições análogas à escravidão.
A relação de fornecedores da multinacional inclui ainda dois pecuaristas de Nova Crixás (GO). A Fazenda Gramado, de Clóvis Guimarães Andrade – onde seis trabalhadores submetidos ao trabalho escravo foram encontrados em 2021 –, forneceu gado para as unidades de Goiânia (GO) e Mozarlândia (GO) da JBS, entre 2021 e 2023.
O advogado de Andrade, João Marques Evangelista, informou à reportagem que não há “nada pendente”. A defesa argumenta que ingressou com ação “mostrando as correções” e que “houve determinação judicial para retirada” do nome de seu cliente da lista suja.
As mesmas plantas de abate também receberam animais da Fazenda Nossa Senhora Aparecida entre 2022 e 2023. Pertencente à pecuarista Rosa Maria de Oliveira Guimarães, a propriedade foi fiscalizada em 2021. Cinco trabalhadores foram resgatados no local.
A advogada de Guimarães, Larissa Moura de Azambuja, disse que a situação na fazenda teria sido regularizada após a assinatura de um termo de ajustamento de conduta (TAC) firmado com o Ministério Público do Trabalho (MPT), em abril de 2022.
No entanto, o TAC evita apenas que o caso seja discutido na Justiça. A Lista Suja, por sua vez, é um cadastro mantido pelo poder executivo e não é influenciado pelo acordo firmado entre empregadores e o MPT.
Além da JBS, a unidade de Palmeira de Goiás do frigorífico Minerva também foi abastecida pela Fazenda Nossa Senhora Aparecida em 2021 e 2022. A assessoria da empresa informou que, diante das informações da nova atualização, “incluiu a fornecedora no sistema de bloqueio”. O texto diz ainda que “essa análise depende da disponibilidade pública de informações através do Ministério do Trabalho e Emprego”. Leia o posicionamento completo.
Trabalho escravo em garimpos ilegais
Um dos empregadores incluídos na lista suja é Adriano Salomão Costa de Carvalho, pai do atual prefeito de Santa Maria das Barreiras (PA). De acordo com as informações do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), oito pessoas foram resgatadas durante a “Operação Cangaia Gold”, em Cumarú do Norte (PA), em maio de 2021.
Realizada em 2021, a ação tinha como objetivo fechar garimpos ilegais. O relatório aponta que os trabalhadores dormiam em barracos de lona. Além disso, utilizavam a água de uma nascente a 3 km do alojamento para beber, tomar banho e lavar roupas. Segundo a fiscalização, o garimpo utilizava ilegalmente mercúrio para a extração do ouro, contaminando o curso d’água e expondo os trabalhadores à substância tóxica.
Ainda de acordo com o relatório da operação, o gerente do “garimpo do Salomão”, como era conhecido o local, era ex-funcionário de uma empresa em nome de Maria José Henrique Guimarães, esposa de Adriano Salomão e mãe do prefeito de Santa Maria das Barreiras.
Segundo a investigação, o garimpo funcionava em uma área de propriedade da pecuarista Lenir Maria Pimenta — que também aparece na atual versão da lista suja e vende gado para a JBS. Ainda de acordo com o relatório da operação, ela recebia valores em ouro para permitir a exploração do local, ou seja, alugava a área de sua fazenda para a exploração ilegal do minério.
O advogado de Adriano Salomão, Walteir Gomes Rezende, nega que o seu cliente tenha relações com garimpo. “A informação dos auditores do trabalho não é verdadeira, pois nunca teve atividade de garimpo por parte do senhor Adriano Salomão nem a contratação de 8 pessoas no mencionado local”. De acordo com o advogado, tanto a ação movida pelo Ministério Público do Trabalho quanto o inquérito policial ainda estão tramitando. Veja o posicionamento.
Adilson Vitorino da Silva, advogado de Lenir Maria Pimenta, também nega que sua cliente tenha relação com mineração. “Não tem nada disso aí, é tudo ilação. Não existe qualquer ligação, ela jamais opera ouro, o negócio dela é pecuária”, reforçou por telefone.
De acordo com informações da Polícia Federal, a extração de minério no vale do rio Cangaia era feita desde setembro de 2020 e não tinha autorização da Agência Nacional de Mineração (ANM), nem o devido licenciamento ambiental.
Outro nome ligado à mineração de ouro e que aparece na nova atualização da lista suja é o de Raimunda Oliveira Nunes, controladora de garimpos espalhados por Itaituba e Jacareacanga, no Pará. Em 2018, uma investigação da Repórter Brasil detalhou o funcionamento dos garimpos ligados a Raimunda. Em outubro de 2020, ela foi novamente autuada por trabalho escravo. Na ocasião, 36 pessoas foram resgatadas do Garimpo do Pau Rosa.
A reportagem tentou contato com Mercídio Panosso, Raimunda Oliveira Nunes, Vanúbia Silvia Rodrigues, além da Prefeitura de Santa Maria das Barreiras, mas não obteve resposta até a publicação desta matéria. O texto será atualizado caso os posicionamentos sejam enviados.