Mobilização

Ato em solidariedade ao povo palestino reúne pessoas de diversas nacionalidades em São Paulo

Desde o último sábado, quando Israel respondeu aos ataques do Hamas, 263.934 palestinos deixaram suas casas

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Ato ocorreu no Galpão da Alameda Eduardo Prado, na região central de São Paulo - Marcelo Cruz/Brasil de Fato

Palestinos, libaneses e egípcios se juntaram na noite desta quarta-feira (11), no Galpão da Alameda Eduardo Prado, região central de São Paulo, em um ato de solidariedade aos palestinos da Faixa de Gaza e da Cisjordânia. Também estiveram presentes representantes de movimentos populares e representações diplomáticas. 

Desde a madrugada do último sábado (7), quando Israel respondeu aos ataques do grupo Hamas, 263.934 pessoas em Gaza fugiram de suas casas, de acordo com levantamento do Escritório de Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha), da Organização das Nações Unidas (ONU), divulgado na noite desta terça-feira (10).

Cerca de 70 mil palestinos buscam refúgio em escolas. O governo da extrema direita de Benjamin Netanyahu iniciou um cerco à Faixa de Gaza, com bloqueio de suprimentos e intensificação dos ataques.

Segundo o Ministério da Saúde da Palestina, quase 60% dos feridos na Faixa de Gaza são mulheres e crianças. O número foi publicado na manhã desta quarta-feira (11). Até este momento, foram contabilizados 1.055 palestinos mortos e 5.184 outros cidadãos gravemente feridos. Em Israel, são pelo menos 1.200 mortos e 2.700 feridos.  

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A reação de Israel, que vem bombardeando a Faixa de Gaza de forma ininterrupta, tem sido considerada desproporcional pela comunidade internacional. Habib Mohammed, de 34 anos, é natural da cidade de Hebron, na Cisjordânia. No ato desta quarta-feira, ele afirmou que o conflito atual tem raiz em décadas de confronto entre Israel e Palestina.

As ofensivas do Hamas foram justificadas como resposta ao aumento da violência contra o povo palestino, à proposta de anexação de partes da Cisjordânia e aos ataques contra a Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém. O local é considerado sagrado pelos muçulmanos e tem sido alvo de ações violentas da polícia israelense e de fundamentalistas religiosos judeus. 

"Nós temos vivido uma ocupação muito severa e dura, com uma vida muito difícil, e agora as pessoas nos chamam de terroristas. Mas, mesmo assim, nós continuamos em frente. Quando os ucranianos atacaram os russos, eles estavam reagindo, atacando de volta, e eles são tidos como heróis. Mas quando os palestinos fazem o mesmo, eles são sempre terroristas. Isso levanta uma grande questão: por que essa diferença? É por que somos árabes? É por que somos muçulmanos?", questiona Mohammed.  

"Essa questão fica ressoando na nossa cabeça e nós ficamos muito preocupados com isso. A gente espera que isso mude, mas o que escutamos das notícias é que Israel já ia atacar palestinos de qualquer jeito, ia acontecer nas próximas semanas ou no próximo mês. Então, as tropas de resistência palestina fizeram uma ação preventiva para poder reagir aos ataques antes da mídia", defende.  

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Mohammed está no Brasil com sua esposa há cerca de um ano, mas ainda tem familiares em Hebron. "Nós temos ocupações israelenses ilegais no coração de Hebron há mais de 50 anos. E o que o mundo faz? Nada. Meu pai foi preso, meu sogro foi preso, meus irmãos foram presos, eu perdi três amigos nesta guerra e as famílias deles estão em Gaza nesta semana. Cada um deles perdeu de 10 a 15 pessoas das famílias, incluindo eles mesmos. E aí as pessoas falam que nós somos terroristas?" 

Na mesma linha, o palestino Hisham Al-kami afirma que seu povo está lutando há cerca de 70 anos. "Nunca vamos deixar de lutar até que conquistemos todos os nossos direitos e todo o nosso território. Essa ação de solidariedade não é somente importante para o povo palestino, mas é importante para mostrar algumas mensagens diferentes de diferentes lados. Sabemos que a propaganda sionista está praticamente falsificando a realidade do conflito", afirma. 

"Estão dizendo que é uma guerra entre Hamas e Israel. Mas não é assim. É entre o povo palestino com todas as suas partes e o estado israelita. É uma mensagem que queremos que leve ao nosso povo, em Gaza, estamos muito longe de nossa pátria. Estamos com todo o nosso coração com o nosso povo e a com a nossa resistência”, diz Al-kami ao falar sobre o conflito.  

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Os palestinos receberam apoio de pessoas de outras nacionalidades. Mussa Atwi, de 35 anos, da comunidade libanesa no Brasil, foi um dos participantes que prestou solidariedade. "Eu venho dizer a todo mundo que os palestinos e as palestinas merecem a liberdade, viver bem, merecem paz, porque estão sofrendo muito. Como eu sou libanês, eu vivi em guerra desde que eu nasci até 2006. Eu sofri a guerra no Líbano. Eu sei que como é o sofrimento. Como é estar dentro de casa, país, família e tudo que está ao seu lado está morrendo, está morto, está sofrendo, não tem liberdade, não tem paz."

"O mundo inteiro está vendo o ataque do Hamas, mas não veem mais de 60 anos da bomba que Israel joga na Palestina. Eles mataram crianças, jogaram as pessoas fora do país e depois vem falar que o Hamas, que não chega nem a 300 pessoas, está atacando Israel, que é o primeiro Exército do mundo", afirma.  

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Um dos organizadores do ato, Iago Montalvão, do Comitê de Solidariedade ao Povo Palestino, afirmou que a manifestação é importante para demonstrar que existe uma "força relevante" de apoio e solidariedade ao povo palestino. "É importante que a gente trave essa disputa, porque hoje na grande imprensa, controlada por um oligopólio de grupos economicamente poderosos, a única narrativa que está posta é aquela que ignora a versão palestina, que privilegia uma versão mentirosa, inclusive, de movimentos sionistas, que tentam colocar o povo palestino muçulmano como terroristas", afirma. 

"O Estado de Israel", afirma Montalvão, "se instalou ali ao longo de décadas, colonizando aquela região, isolando os palestinos. Criaram inclusive a Faixa de Gaza, que é uma verdadeira prisão a céu aberto. Eles controlam a entrada e a saída das pessoas ali. Consecutivamente fazem bombardeios, operações violentas, sequestros. É na verdade um terrorismo que parte do Estado. É um Estado terrorista que para ocupar territórios à força dispõe de toda essa violência armada."

Monique Brasil, do Movimento Brasil Popular, afirma que a população brasileira precisa defender a soberania dos povos. "O apartheid palestino precisa ter um fim. Hoje se encontram muitas famílias ilhadas, presas na Palestina. Pessoas que hoje não têm acesso à água potável, eletricidade, em território controlado por Israel. Nossos corações estão voltados para a Palestina para dizer que hoje nós queremos uma Palestina livre, uma Palestina soberana, onde as pessoas exercitar o seu livre direito à religião, onde as crianças tenham acesso à educação, onde os jovens tenham perspectiva de futuro."

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Outro ato em solidariedade ao povo palestino foi realizado na noite desta terça-feira (10), em frente ao restaurante Al Janiah, no bairro do Bixiga, na região central de São Paulo. Além de palestinos, judeus também marcaram presença no ato e manifestaram apoio à causa palestina. O cozinheiro Shajar Goldwaser, que nasceu em Jerusalém, reconhece a existência de um apartheid palestino e defende a criação de um estado independente. "É essencial ter judeus aqui nesse ato para provar para o mundo que a resistência palestina não é contra os judeus, mas contra o Estado de Israel, contra o estado sionista e contra o regime de apartheid", destacou no ato desta terça.  

O sírio Anas Obaid destacou a unidade árabe em torno da luta palestina. "Estamos aqui falando sobre a unidade da nossa terra, que foi dividida e colocada nas mãos de britânicos e franceses, que expulsaram milhares de pessoas — sírios, palestinos, libaneses — pelo mundo inteiro. Mas a única reação [do mundo] que a gente recebe é quando uma resistência palestina tenta retomar uma terra que foi retirada. A gente conta muito com as nossas resistências árabes, com essa alma, com o nosso ar, com a respiração que voltou para o peito depois de muitos anos", pontua o jovem que vive no Brasil há sete anos. 

Edição: Thalita Pires