Coluna

O circo de bichos

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"Tenho um leão aqui que come demais. É um punhado de cachorro e gato todos os dias!" - Creative Commons
Combinaram que ele forneceria quantos cachorros e gatos fosse preciso

A chegada do primeiro circo de bichos em Guaxupé, há muitos anos, mexeu com o Sudoeste de Minas. Muita gente da região ia lá pra ver leões e outros bichos só vistos antes em filmes do Tarzan.

Ali perto, numa cidadezinha de menos de mil habitantes, morava o senhor Eleutério, que tinha uma venda e comprava e vendia qualquer coisa que pudesse dar algum lucro.

Ele ouvia os relatos de quem ia ver o circo de bichos, babava de vontade de ir também, mas ir lá custaria dinheiro, e ele era bem pão-duro. Os olhos do Eleutério brilhavam, quando ouvia alguém falar daqueles bichos. Mais brilho que aquele, nos seus olhos, só quando aparecia a oportunidade de ganhar uma boa grana. 

Um dia, o Davi, um gozador, estava em Guaxupé, fez uma ligação para o telefone público, que era o único que existia naquela cidadezinha, e pediu pra chamar o Eleutério, que foi correndo atender.  

— Senhor Eleutério — disse ele — aqui é o dono do circo de bichos de Guaxupé. Estou pensando em ir aí pra sua terra, mas tenho um problema...

— Qual é o problema? Fala que a gente resolve — respondeu excitado.

— É que tenho um leão aqui que come demais. É um punhado de cachorro e gato todos os dias! Então, eu tenho medo de ir praí e não achar um fornecedor para alimentar meu leão.  Eu pago bem, mas sei lá se vou encontrar quem venda, né?

Falou o preço que pagaria por qualquer cachorro e qualquer gato e o Eleutério vibrava: iria, enfim, poder ver o circo de bichos e ainda ganhar um bom dinheiro. Nem pensou que a cidadezinha não comportava um circo daqueles. 

Combinaram que ele forneceria quantos cachorros e gatos fosse preciso. Ele cercou duas áreas no quintal — uma pros cachorros e outra pros gatos — e começou a juntar bichos.

:: Meu banco e as estátuas bêbadas ::

Qualquer roceiro que parava na venda com algum cachorro acompanhando o cavalo, o Eleutério pedia. Se o cara não desse, ele tentava comprar.

Começou a trocar doces por gatos com a molecada, fazia qualquer negócio, pensando no lucro que ia ter.

Juntou muitos cachorros e gatos, e alimentar tantos bichos já estava ficando caro. Enfim veio a notícia de que o circo foi pra outra cidade e o Eleutério xingou mais de um mês o "fedorento do lazarento do dono do circo, que em vez de vir para cá foi pros quintos dos infernos". Anos depois, ele ainda odiava cachorros, gatos e donos de circo.

 

*Mouzar Benedito é escritor, geógrafo e contador de causos. Leia outros textos

**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Daniel Lamir