Não é essa economia capitalista, mas uma economia emancipatória, uma economia nossa
As mulheres do Assentamento Terra Vista, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Arataca, no sul da Bahia, produzem óleos essenciais com essências extraídas do limão, da pimenta rosa, do lírio do brejo, de citronela e de pitanga. As espécies são cultivadas na própria área do MST, que passa por um processo de reflorestamento e transição ecológica desde a ocupação da área, em 1992.
A agricultora Valdeci Conceição Dias conta de onde vem o amor e a relação com as plantas. Ela integra o grupo de mulheres sem-terra do assentamento, que produzem óleos essenciais com essências extraídas de plantas como Capim Santo, Pimenta rosa, Lírio do brejo, Citronela e Pitanga.
"Tem a Lumã, que é bom pra remédio. Hortelã miúdo também. Que são os principais. De parteira fazer aquela beberagem pras mulher, quando ganhava o neném. Aí fazia aquelas temperada boa pra tomar remédio e um monte de folha que é bom pra remédio. Se a gente for falar tudo aí o tempo não dá, né?", brinca Valdeci.
Os óleos essenciais interagem com o corpo por meio do olfato e da pele. Ao inalarmos o aroma desses produtos naturais estimulamos o sistema límbico do cérebro, responsável por controlar o humor, a memória e os níveis de estresse. A agricultora Solange Brito Soares explica a importância da produção dos óleos essenciais para as mulheres sem-terra.
"Nós sem-terra, nós lutadoras pretas, sem-terra indígena, a gente já nasce empoderada. Mas essa questão da do fortalecimento, de fortalecer essas mulheres, de fazer com que essas mulheres se sintam protagonistas do processo. Então, os óleos essenciais são mais uma ferramenta pra isso. No sentido pedagógico, no sentido político, no sentido econômico. E a economia que eu falo para além do capital. Não é essa economia capitalista, mas uma economia emancipatória, uma economia nossa, que a gente possa permanecer aqui dentro, no assentamento, vivendo bem, tendo uma renda pras mulheres", explica Solange.
Todos os produtos da marca Arte da Terra são naturais e orgânicos. As espécies são cultivadas na própria área do MST, que passa por um processo de reflorestamento e transição agroecológica desde a ocupação da área, em 1992. Valdeci ressalta a variedade de plantas usadas na produção dos óleos essenciais.
"A gente faz de aroeira, do capim-santo, a citronela, a pitanga. O lírio-do-brejo que a gente faz também. E tudo dá o óleo essencial", conta.
Andreia define o conceito de agroecologia para as mulheres do assentamento como um "modo de vida". "A agroecologia é você cuidar de tudo, das pessoas, dos demais, da mata, do rio, proteger. Você não ter indiferença nas coisas. Respeitar o espaço de cada pessoa, respeitar o seu território, respeitar os povos tradicionais, as sementes crioulas. Acreditar nisso", afirma.
O primeiro contato das mulheres do Terra Vista com a produção de óleos essenciais veio em 2017. Anos mais tarde chegam os destiladores e a produção teve sua escala ampliada. Rosimery Souza Floriano, a Branca, diz que sua planta favorita é o manjericão e explica como é o processo de produção.
"A gente colhe com a carroça, depois coloca no destilador, traz até aqui o laboratório, coloca um destilado. Você vai gastar em torno de cinco horas de relógio, o tempo de destilar, dele começar gotejar. É de quarenta minutos a cinquenta, depende da potência do fogo", conta.
Foi a partir da chegada dos destiladores que o grupo de mulheres também estruturou o espaço de cultivo das plantas medicinais, que chamam de Mandala. "Ali a gente cultivava plantas de ciclo curto e que são cultivadas mesmo. São as plantas mais conhecidas na região. A gente adquiriu aqui na comunidade, nos territórios aqui por perto, nos territórios indígenas, quilombolas. A gente consegue onde a gente viaja e leva mudas. É uma troca", explica Andreia.
Ela destaca que as mulheres sempre tiveram um papel muito importante e primordial na agricultura, como guardiãs desse conhecimento das ervas. Hoje, além dos óleos, também começam a surgir outros produtos, como sabonetes de aroeira, de manjericão, de chocolate, de alfazema; além dos repelentes líquido e creme.
A venda dos produtos se dá em feiras, eventos e, também, no próprio assentamento. Mas para essas mulheres, mães e produtoras agroecológicas, a produção vai muito além da parte econômica e é uma luta que vem há tempos, desde o início da ocupação, como parte do processo de relação com a terra.
"O trabalho que a gente vem desenvolvendo com as mulheres aqui é desde a ocupação. Então assim, não é uma coisa de hoje. Ela é fruto de uma luta. Inclusive a luta pela terra aqui, as mulheres sempre estiveram na frente, as lideranças femininas sempre estiveram na frente da luta, no confronto em defesa da terra", conclui Andreia.
Edição: Thalita Pires