A reitoria da Universidade de São Paulo (USP) afirmou que as faculdades e escolas que passaram e passam por greve estudantil poderão adaptar as aulas ministradas, para que os estudantes consigam cumprir a carga horária necessária. O comunicado foi emitido depois que a Pró-Reitoria de Graduação decidiu não abonar as aulas que não foram dadas durante a paralisação.
O comunicado assinado pelo reitor Carlos Gilberto Carlotti Junior afirma que o cumprimento da frequência mínima exigida é “factível” e que caberá a cada professor registrar a frequência dos estudantes “levando em consideração as situações específicas”. Por fim, disse que a universidade “não tem intenção de promover perseguição e retaliação de qualquer natureza”. O reitor não deixa claro, no entanto, se haverá ou não reprovação.
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Na última terça-feira (24), dois outros membros da direção da entidade, o pró-reitor Aluisio Augusto Cotrim Segurado e o pró-reitor adjunto Marcos Garcia Neira da graduação da USP emitiram um comunicado no qual determinam o registro de até 68% de presença dos alunos no caso de seis semanas de greve. A frequência mínima para não haver reprovação por falta, no entanto, é de 75%, abaixo do determinado pela reitoria. Na prática, isso pode significar a reprovação em massa dos alunos.
Michele Schultz, presidenta da Associação dos Docentes da USP (Adusp) classificou a medida como uma “retaliação” aos alunos pela greve que começou em 18 de setembro. “Os programas das disciplinas foram construídos de acordo com o calendário oficial da USP, cujo encerramento do semestre se daria no 22 de dezembro. Como a PRG e a Reitoria pressupõem que não será necessária reposição de aulas depois de encerrada a greve?”, questionou Schultz em reportagem publicada no site da Adusp.
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“O comunicado da Reitoria da semana passada já pressupunha que não haveria necessidade de reposição ao dizer que o calendário estava mantido. A circular da PRG ratifica esse posicionamento e vai além: admite punição às e aos estudantes que aderiram à greve”, afirma. “Isso é um ataque bastante sério ao movimento grevista. É urgente que a Reitoria e PRG revejam suas posições, como solicitam conjuntamente o presidente da CG e diretor da FFLCH.”
A União Nacional dos Estudantes (UNE), por sua vez, considerou “gravíssimo” o ato de determinar as frequências máximas. Em seu perfil no X, antigo Twitter, a instituição disse que “seguirá em contato com diversos coletivos e entidades representativas dos estudantes. Não aceitaremos nenhuma forma de perseguição ou criminalização dos estudantes em sua justa luta por um ensino de melhor qualidade e pela contratação de mais professores”.
A tabela divulgada pela pró-reitoria estabelece a frequência máxima que pode ser registrada de acordo com a quantidade de semanas de greve. A próxima semana, entre 30 e de outubro e 3 de novembro, é a sexta semana de greve na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH). As demais 40 escolas e faculdades da universidade estão com atividades normais.
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De acordo com a circular, o sistema JúpiterWeb, onde os docentes registram as notas e presenças dos alunos, será ajustado para cada curso, conforme a quantidade de semanas em que as atividades didáticas efetivamente aconteceram. “Assim sendo”, conclui o documento da PRG, “o lançamento da frequência no sistema respeitará os percentuais máximos descritos na tabela a seguir”. A tabela estabelece seis diferentes “percentuais máximos de frequência”, que variam entre 95%, para uma semana, e 68%, para seis semanas.
“Ressalta-se que na EACH estamos na quinta semana de paralisação. Seguindo o calendário letivo de 2023, que não será modificado conforme enfatizado pela reitoria, se a paralisação entrar na sexta semana será possível registrar no máximo 68% de frequência no Sistema Júpiter. Isso significaria reprovação por falta para todos os estudantes matriculados nas disciplinas de graduação na EACH”, afirmam a direção e a Comissão de Graduação da unidade em e-mail enviado à comunidade uspiana nesta quarta-feira (25).
Da mesma forma, o presidente da Comissão de Graduação da FFLCH, Eduardo Donizeti Girotto, e o diretor da unidade, Paulo Martins, encaminharam uma carta ao pró-reitor também pedindo a revogação da medida. Ambos sugerem que as aulas que não foram ministradas sejam repostas a fim de garantir as 19 semanas letivas previstas no semestre. “Tal medida, se posta em prática, acarretará prejuízos a toda a comunidade da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas”, diz o texto da FFLCH.
Contexto
A paralisação iniciada pelos alunos começou em 18 de setembro. No total, os estudantes têm cinco eixos de demandas: contratação de quase 1,7 mil professores, aumento de auxílio para permanência estudantil, melhorias estruturais na USP Leste (reitoria anunciou a construção de uma creche na unidade), promoção de vestibular indígena e valorização dos direitos estudantis.
Pressionada, a reitoria atendeu a algumas das demandas, como a antecipação de concursos para a contratação de docentes, a contratação imediata de professores temporários e reposição das vagas decorrentes de aposentadorias em 2022. As outras demandas, no entanto, ficaram em aberto.
“Alguns cursos da USP correm o risco de serem extintos por falta de professores e funcionários, como os cursos de Letras-Coreano, Editoração, Formação de atores e Pedagogia RP [Ribeirão Preto]. Pela contração urgente de docentes e técnicos-administrativos em regime de dedicação integral para que estudantes possam se formar e pela reposição do quadro de docentes defasado a partir de 2014”, afirmam os estudantes no perfil do Diretório Central dos Estudantes (DCE) Livre da USP Alexandre Vannucchi Leme.
Edição: Rodrigo Durão Coelho