Antes mesmo de tomar posse, o presidente eleito da Argentina, Javier Milei, foi a Washington formalizar seu alinhamento estratégico com os Estados Unidos para o mandato ultraliberal que pretende colocar em prática. Voltou dizendo que a viagem foi positiva e confirmou que o especialista em finanças Luis “Toto” Caputo será o ministro da Economia, aquele que vai enfrentar uma crise severa, com inflação anual de 140% e 40% da população na pobreza.
“Apresentamos o plano econômico e a resposta da Casa Branca foi extremamente favorável”, afirmou Milei ao desembarcar em Buenos Aires. Enquanto termina de definir seu gabinete, espera-se que ele encabece uma reunião com deputados e senadores para tentar avançar no pacote de leis de reforma do Estado, que planeja enviar para o Congresso no dia seguinte à posse, marcada para 10 de dezembro.
Sobre o futuro ministro, declarou: “Nós já o tínhamos definido. Quando se olha a natureza dos problemas argentinos, quando se nota que dos 15 pontos de déficit fiscal, a Argentina gera 10 no Banco Central, percebe-se que o primeiro problema a ser resolvido são as Leliq. Torna-se fundamental resolver esse problema com muita expertise, porque, caso contrário, terminamos em uma hiperinflação”.
Leliq são títulos emitidos pelo governo argentino, que oferecem liquidez em até 28 dias. Há um estoque dessa dívida que precisa ser limpo e isso representa um problema, porque requer converter essa dívida em dólares ou ter dólares para comprar essa dívida, explica ao Brasil de Fato o economista André Roncaglia, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) — o dólar oficial vale hoje 377 pesos para venda e o dólar blue (paralelo), 945.
Segundo ele, as Leliq são equivalentes ao overnight, operações de compra e venda de títulos públicos pelo prazo de uma noite, que se tornaram comuns no Brasil no início dos anos 1990, quando a inflação mensal chegou a 80%. A inflação na Argentina está longe disso, mas o economista considera a comparação válida, por ser um título que oferece liquidez para organizar as finanças bancárias.
Sobre Caputo, uma pessoa “ligada ao mercado financeiro e ao grupo do (ex-presidente Mauricio) Macri”, Roncaglia acredita que será um ministro mais moderado do que se previa e que vai impor limites ao discurso radicalizado do Milei. “Mas, em essência, é uma reedição do governo Macri (2015-2019). Vai defender reformas liberalizantes, mas nada tão radical como eliminar o Banco Central ou dolarizar a economia, o que, dentro dos padrões de conhecimento dos economistas, seria uma péssima ideia para a Argentina”.
No entanto, vale frisar que nos últimos dias, Milei ratificou seus planos de fechar o Banco Central, privatizar empresas estatais, realizar um forte ajuste econômico e paralisar toda e qualquer obra pública.
O novo ministro
Caputo foi ministro de Finanças e presidente do Banco Central na gestão de Macri, quando foi firmado empréstimo com o FMI (Fundo Monetário Internacional) atualmente em vigor, que impõe ao país regras rígidas de ajuste fiscal e deixou como legado o empréstimo mais extenso de sua história, um bônus de 100 anos qualificado como “desastroso” pela Auditoria Geral da Nação.
Formado em economia na Universidade de Buenos Aires, o ministro anunciado por Milei fez carreira em bancos como JP Morgan e Deutsche Bank, no qual chegou a presidir a filial argentina, antes de criar o Axis, seu próprio fundo de investimentos. É um especialista em finanças, tanto que quando Macri o convidou a trocar a pasta de Finanças pela de Economia, ele optou por ficar onde estava.
Os admiradores de sua gestão argumentam que ele propiciou a chegada dos recursos necessários para enfrentar o déficit fiscal. Destacam sua disposição para o trabalho e seu conhecimento das finanças internacionais, assim como a boa interlocução com Wall Street, sede do mercado financeiro dos EUA. Nos últimos tempos, quando seu nome já circulava como provável ministro, foi chamado de “Messi das finanças”, em referência ao jogador campeão mundial Lionel Messi.
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O nome de Caputo foi um dos mencionados no caso dos Paradise Papers, documentos vazados em 2017 que apontam investimentos em paraísos fiscais de grandes corporações, celebridades e pessoas de várias nações. Por essas denúncias, o futuro ministro teve que se apresentar ao Congresso para dar explicações sobre seu vínculo não declarado com empresas offshore.
Bullrich na Segurança
Embora fontes da coalizão eleita A Liberdade Avança tenham informado à imprensa argentina recentemente que Patricia Bullrich, candidata derrotada no primeiro turno e apoiadora de Milei no segundo, será ministra da Segurança, o presidente eleito não confirmou a informação na volta dos EUA. Questionado sobre esse tema numa entrevista a uma rádio, foi evasivo: “Estamos trabalhando nisso. As definições serão conhecidas no dia 10 de dezembro”.
Embaixadores nos EUA e no Brasil
Por outro lado, Milei confirmou que Gerardo Whertein será embaixador nos Estados Unidos e ratificou a continuidade de Daniel Scioli na Embaixada Argentina no Brasil, em declarações a uma emissora de rádio.
Com informações do Página 12 e do La Nación.
Edição: Leandro Melito