Quando as pessoas chegam ao terreiro entendem que o lugar é muito parecido com o Cras ou Crea
Mais velho, senhor de todas as possibilidades e Pai da Criação nas religiões de matriz africana, Oxalá é o mais respeitado entre todos os orixás.
O pouco para ele se torna muito, não para si, mas para dividir com os outros. Por isso, as oferendas para Oxalá são simples.
Na gastronomia oferecida a esse orixá, até os preparos são simbolizados dessa forma. O ebô, por exemplo, não leva sal nem nenhum condimento.
"Nas casas, nos templos religiosos, nos terreiros de candomblé, o ebô de Oxalá é feito com arroz branco, leva a lobassa e leva insaba, a folha de Oxalá, que é arriado para dar equilíbrio a casa para trazer paz, trazer saúde", explica o babalorixá [sacerdote do candomblé, conhecido popularmente como pai de santo], Douglas Doguimaleci, do terreiro Nzazi Baru Olosso Yelodemi Doguimaleci, em Jaboatão dos Guararapes (PE).
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No sentido de buscar paz, saúde e tranquilidade, o ebô faz parte do conjunto de comidas funfun, na língua iorubá, comidas brancas. Além da cor, as formas, cheiros e sabores representam os princípios da criação do mundo e da humanidade.
"Geralmente são comidas votivas para equilíbrio de firmeza de cabeça, para pedir a paz dentro de um terreiro de candomblé, para pedir a união. Oxalá é o orixá mais velho. É aquele que todo mundo bate cabeça e deve pedir água, benção e banda gira. E essas comidas são ofertadas para o médium, para a casa, mediante também as necessidades, principalmente ligada à saúde e união", afirma Douglas.
O acaçá é outro exemplo de comida funfun, oferecida a Oxalá. Feito de farinha de milho branco, o alimento é preparado como mingau e enrolado na folha de bananeira.
"Nós temos o acaçá, que está presente em toda ritualística. Onde tem ritualística, cerimônia, tem um acaçá. Ele está ofertado à casa e também é ofertado também ao ori, a cabeça", destaca Douglas.
O milho branco está presente em toda gastronomia para Oxalá. A ritualística ainda inclui as insabas, ou seja, folhas. Alguns exemplos são o conhecido ‘tapete de Oxalá’, a corona ou a hortelã. Também são oferecidas frutas como maçã, pera e uvas verdes e claras.
Assim, o branco da comida não se separa da cor das roupas e de outros objetos durante o ajeun, ou seja, do se alimentar junto entre as pessoas e os orixás.
"Cada grão e cada comida que a gente oferta tem um significado, um símbolo dentro do estético, do físico e também do interno e do espiritual, que está para além de nós", aponta o babalorixá.
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Embora as comidas, folhas, preceitos, variem de casa para casa, o branco é a cor e identificação predominante de Oxalá em todos os lugares das religiões de matriz africana.
Os alimentos para Oxalá e outros orixás, fazem parte de uma teia ancestral entre o mitológico e o social. De uma alimentação de corpo e de alma, essas comidas também buscam nutrir a paz nas comunidades.
"Quando as pessoas chegam ao terreiro, elas chegam entendendo que aquele lugar ali é muito parecido com o movimento do Cras [Centro de Referência de Assistência Social], do Creas [Centros de Referência Especializados de Assistência Social], que é uma conotação política. Porque a gente, de fato, acolhe essas pessoas que estão ali. Então a gente alimenta o corpo, sacia a fome, o imediato. A gente organiza as pessoas para, a partir de então, ter uma vivência mais comunitária, mais familiar", explica o babalorixá Wesley Máximo, do terreiro Ilê àse Alakatu Oju Oniê, de Olinda (PE).
Edição: Thalita Pires