ESSEQUIBO

Lula, Maduro e oposição: veja repercussões do referendo venezuelano sobre a região de Essequibo, disputada com a Guiana

Imensa maioria dos venezuelanos votou a favor da incorporação do território rico em petróleo no país vizinho. E agora?

Brasil de Fato | Botucatu (SP) |
Maduro: o povo falou "alto e claro" - Pedro Rances Mattey / AFP

Os venezuelanos aprovaram a ideia de transformação do território de Essequibo num estado da Venezuela em uma votação ocorrida no domingo (3). Como a consulta teve caráter não-vinculante, o resultado não deve ter consequência prática imediata. 

A imensa maioria do eleitorado demonstrou apoiar a reivindicação do governo venezuelano, de incorporar esta região rica em petróleo, que pertence oficialmente à Guiana desde 1899, mas é motivo de uma antiga discórdia. Em 2018, a Guiana levou o caso à Corte Internacional de Justiça, que declarou na semana passada que a Venzuela não deve tomar qualquer atitude que possa modificar a situação atual. Mas a Venezuela não reconhece a competência da corte em Haia para julgar o caso.

Segundo informação divulgada no domingo pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), 10,5 milhões de eleitores participaram do referendo e 95,93% aceitaram incorporar oficialmente Essequibo ao mapa do país, concedendo cidadania e documento de identidade aos guianenses que vivem no território. Posteriormente, surgiu uma releitura dos dados, segundo a qual esse 10,5 milhões representariam não o total de eleitores, mas de votos em cada uma das cinco perguntas do referendo. O percentual de votos a favor, no entanto, não foi questionado.

Veja a seguir a repercussão do referendo, tanto no que diz respeito à estatística quanto ao resultado, ao mérito da questão e possíveis desdobramentos.

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, acha que o país deu os primeiros passos de uma "nova etapa histórica" para lutar pela Guiana Essequiba, pela paz e recuperar o que "os libertadores e libertadoras deixaram para nós". "O povo falou alto e claro", declarou no X (antigo Twitter).

 

Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que espera "bom senso" e teme uma guerra na vizinhança. "Se tem uma coisa que a América do Sul não está precisando agora, é de confusão", declarou em entrevista coletiva em Dubai no domingo. Lula, que tem insistido no diálogo como saída para a divergência, disse ter conversado por telefone com o presidente da Guiana, Irfaan Ali, e lembrou que o assessor especial da Presidência, Celso Amorim, esteve em Caracas para tratar do tema com o presidente Nicolás Maduro e evitar uma escalada de tensões.

O deputado Jorge Rodríguez, do partido governista PSUV, presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, exaltou a participação do povo da Venezuela na construção do seu próprio destino e a disposição do eleitorado para votar no referendo. "Pela primeira vez na história da nossa República, o país decide perguntar ao seu povo sobre o destino da Guiana Essequiba."

 

Mas Henrique Capriles, líder da oposição venezuelana, questionou os dados apresentados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), disse que Maduro perdeu a oportunidade de fazer algo de bom para os venezuelanos e afirmou que o governo nunca fez nada por Essequibo.

 

Samuel Braun, professor de Políticas Públicas na UERJ, disse que uma prova de que o referendo foi um sucesso é que, considerando o total de votos afirmativos, a participação popular foi mais de 4 vezes maior que nas recentes prévias eleitorais da oposição. "Em Essequibo, sem tropas, indígenas baixam bandeira da Guiana e hasteiam da Venezuela", escreveu, junto com um vídeo que mostra esse fato.

 

Eugenio Martínez, jornalista venezuelano, afirmou que a emissora de TV estatal Venezolana de Televisión (VTV), o Canal 8, esclareceu o mistério do CNE, ao mostrar que se tratavam de 10 milhões de votos afirmativos, ou seja, 5 votos “sim” para cada eleitor, o que resultaria numa participação de 2,1 milhões de eleitores.

 

A própria VTV traz uma declaração de Elvis Amoroso, presidente do CNE. "Uma evidente vitória arrasadora do sim, com participação histórica que supera os 10.554.320 votos".

 

Oliver Stuenkel, professor de Relações Internacionais na FGV, opinou que a disputa pelo Essequibo pode representar problema para a estabilidade regional, devido ao que considera uma "narrativa agressiva" da Venezuela. Mencionou a possibilidade de uso de força e citou que a Guiana praticamente não tem Forças Armadas, enquanto a Venezuela conta com um operativo militar “sofisticado”.

@oliverstuenkel #venezuela #guyana #essequibo ♬ original sound - Oliver Stuenkel

Edição: Rodrigo Durão Coelho