Entre 2011 e 2021, o Brasil registrou 616 mil homicídios. Mas além dessas, houve mais 126.382 mortes violentas cuja causa não foi identificada e que podem ser classificadas como homicídios, acidentes ou suicídios, por exemplo. Além disso, outras 49.413 mortes tinham características de homicídio e ficaram de fora das estatísticas oficiais. São os chamados pela pesquisa de "homicídios ocultos".
Esses dados foram reunidos pelo Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), em parceria com o Fórum de Segurança Pública, no Atlas da Violência 2023. O documento sintetiza as informações de 2021 e compara com anos anteriores.
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Daniel Cerqueira, técnico de planejamento e pesquisa do Ipea e coordenador do Atlas da Violência 2023, participou do Central do Brasil desta quarta-feira (6) e explicou quais são as consequências diretas desse número alto de mortes violentas sem a causa identificada
"Os registros que aparecem como homicídios estão ainda subestimados, porque o que começou a acontecer, principalmente sobretudo de 2019 para cá? Vários óbitos violentos o Estado, simplesmente, não sabe por que a pessoa morreu. É como se, a cada ano, 4,5 mil pessoas morressem ou 150 Boeing 787 lotados caíssem e esse fato ficasse totalmente invisibilizado", descreve.
"A tragédia da violência segue com a pobreza na qualidade dos dados. O importante para a gente falar de políticas públicas efetivas que deem mais paz ao brasileiro é fazer política baseada em evidência. A gente tem um bom termômetro para medir o problema, fazer um bom diagnóstico, fazer um planejamento e um acompanhamento e avaliação de longo prazo. Fazendo uma analogia: é como se o médico fosse tratar do paciente com o termômetro quebrado".
O Atlas também percebeu que, apesar da taxa de homicídios ter sofrido uma redução ao longo dessa década – queda de 18,3% –, a população socialmente mais vulnerável segue sendo a mais afetada pela violência. O número total ainda está em um patamar muito alto, quando comparado com outros países.
"Esse número tem diminuído, desde 2018. No entanto, quando a gente considera numa comparação internacional, é um número absurdamente alto. Nós temos uma taxa de homicídio 20 vezes maior do que países da Europa. É algo que a gente não pode aceitar e naturalizar. É como se tivéssemos falando de uma cidade ou uma capital como Aracaju sendo dizimada", analisa.
As pessoas negras, por exemplo, representam 77% das vítimas dos mais de 616 mil homicídios ao longo de 10 anos no Brasil. Neste mesmo período, os homicídios de pessoas indígenas cresceram 29%. Os estados que mais concentram esse tipo de crime são Roraima, Amazonas e Mato Grosso do Sul.
A violência contra a mulher também é alarmante, segundo Atlas. Entre 2011 e 2021, 49 mil foram assassinadas. E a casa virou o lugar mais perigoso para elas. Nesta década, houve um aumento de 4,72% de assassinatos de mulheres dentro da própria residência. O principal alvo da violência de gênero, segundo o Atlas, são as mulheres negras. Elas morrem 1,8 vezes mais do que as mulheres não negras.
"Ao mesmo tempo que houve uma diminuição geral da violência letal no Brasil, esses grupos minoritários tiveram a sua vitimização majorada nesse período. Tivemos mais assassinatos de negros, mulheres, indígenas, população LGBTQIA+", aponta.
Cerqueira menciona que há algumas hipóteses para esse aumento da violência contra estes segmentos da população: a desestruturação e o desfinanciamento de politicas públicas e os efeitos da pandemia, em especial no caso de violência contra as mulheres.
A entrevista completa está disponível na edição desta quarta-feira (6) do Central do Brasil, no canal do Brasil de Fato no YouTube.
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Edição: Thalita Pires