Relato

Relato: Campanha Global pelo Retorno à Palestina realiza encontro histórico na África do Sul

Encontro ocorre em país que rompeu relações com Israel por causa do massacre em Gaza

Joanesburgo (África do Sul) |
Buzetto, Dutra e Ortega ao lado de Mandla Mandela - Marcelo Buzetto

A Campanha Global pelo Retorno à Palestina é uma articulação internacional que existe desde 2014. Suas atividades tiveram início no Líbano, país onde Israel sofreu uma dessas mais humilhantes derrotas, tanto no campo político, como nos campos moral e militar.

O objetivo original da campanha é resgatar a importância da Resolução 194 da ONU, que trata do direito de retorno dos refugiados palestinos. Somente entre 15 de maio de 1948 (fundação de Israel) e 15 de dezembro de 1949 surgiram 750 mil refugiados, resultado da política de genocídio, limpeza étnica e apartheid imposta.

Além de divulgar essa reivindicação inalienável do povo palestino, a Campanha Global hoje se dedica à organizar diversas formas de solidariedade concreta às famílias palestinas que resistem cotidianamente ao colonialismo israelense. 

Durante os dias 3 e 4 de dezembro ocorreu um encontro realmente histórico da Campanha Global pelo Retorno à Palestina. Reunidos em Joanesburgo,  África do Sul, cerca de 150 representantes e amigos da Campanha Global da Ásia, África, Oceania e América (América do Sul, EUA, Canadá) ouviram análises, depoimentos e fizeram propostas sobre a solidariedade à Palestina, especialmente à Gaza.

Essa 5ª Convenção da Campanha Global pelo Retorno à Palestina teve um caráter especial por causa da presença ativa de Mandla Mandela, deputado e neto de Nelson Mandela. Mandla Mandela abriu o evento afirmando que "Madiba (Nelson Mandela) sempre disse: 'a libertação da África do Sul estará incompleta enquanto não houver a libertação da Palestina do colonialismo israelense".

Durante todo o encontro, ocorreram muitas referências à luta contra o racismo e o regime do apartheid sul-africano, que adotou políticas de intensa repressão e violência contra a  população negra do país. Entre 1992 e 1994, após cumprir 27 anos de prisão, Nelson Mandela foi eleito presidente da República. 

Representantes dos partidos Congresso Nacional Africano CNA e Partido Comunista da África do Sul SACP falaram da história das mobilizações populares e da resistência armada contra o apartheid. 

A delegação brasileira foi formada por André Dutra, Gabriela Ortega e eu, Marcelo Buzetto. Durante a Convenção, falei sobre a solidariedade brasileira com o povo palestino, destacando as mobilizações nas ruas de várias cidades do Brasil e a iniciativa do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra MST, que está organizado a doação de 100 toneladas de alimentos para Gaza, com apoio do governo Lula. Duas toneladas já foram enviadas, através do Egito. 

A  5ª Convenção da Campanha Global pelo Retorno à Palestina contou com a presença de importantes lideranças de organizações da resistência anticolonialista e anti-imperialista, além de parlamentares e representantes de governos, como o ex-ministro da Defesa da Grécia Costas Isihos. 

A atividade ocorre num momento simbólico e histórico para a luta contra o colonialismo israelense, pois a África do Sul rompeu relações com Israel, expulsou o embaixador e fechou a embaixada, numa ofensiva diplomática após os bombardeios contra civis em Gaza, e a quantidade de crianças mortas, dos ataques a escolas e hospitais, do assassinato de jornalistas e funcionários da ONU. A posição sul-africana colocou o país na vanguarda pela paz justa e duradoura para o povo palestino. 

A 5ª Convenção da Campanha Global pelo Retorno à Palestina é uma das mais importantes articulações internacionais de apoio à causa Palestina, pois se orienta pelas reivindicações elaboradas pelos próprios palestinos e suas legítimas organizações, principalmente as que fazem parte da linha de frente da mobilização anticolonialista e antissionista.

Também marcaram presença lideranças religiosas cristãs, judaicas e muçulmanas. Um destaque para representantes do movimento Neturei Karta, judeus que vieram dos EUA para dizer que "judaísmo  é sionismo são coisas opostas. Judaísmo é a religião, que prega a paz e o amor. Sionismo é um movimento político racista e colonialista, não representa o judaísmo. Os verdadeiros judeus são contra a existência do Estado de Israel,  que nasceu tomando as terras dos árabes, seus legítimos donos!"

A 5ª Convenção da Campanha Global pelo Retorno à Palestina termina com a elaboração de um documento que defende o cessar fogo imediato, o fim dos bombardeios israelenses, a retirada das tropas de Israel de Gaza, o fim do bloqueio e o direito do povo palestino à resistência diante do colonialismo israelense, como sempre fizeram todos os povos que desejam obter soberania nacional e independência.

Sem dúvida foi um encontro histórico, que vai alterar a qualidade da solidariedade internacionalista para essa justa luta do povo palestino por um mundo de paz, onde será possível a coexistência pacífica entre judeus, cristãos e muçulmanos, numa Palestina Livre, com direitos iguais, do Rio Jordão ao Mar Mediterrâneo.

 

*Marcelo Buzetto é autor do livro A Questão Palestina

**Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Rodrigo Durão Coelho