Sob o rótulo de "sustentável", a soja segue avançando sobre comunidades tradicionais do Maranhão. A monocultura deve receber investimentos do mercado financeiro em torno de R$ 232 milhões para a expansão da safra 2023/2024 no Cerrado brasileiro, por meio dos chamados CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio).
No entanto, pesquisadores apontam que o novo nome acarreta os mesmos velhos problemas: desmatamento e violência no campo, como explica o pesquisador e advogado popular Diogo Cabral.
"Não há diferenças entre soja tradicional e soja sustentável. A soja sustentável é um termo, uma nomenclatura utilizada por grandes produtoras, em associação com o capital financeiro para criar um rótulo para esta commodity, e se trata de um conto de fadas, de um greenwashing, enfim, visto que a soja tradicional e a soja sustentável demandam grandes extensões de terra, uso intensivo de agrotóxico, destruição de novas áreas para sua implementação", explica.
Desmatamento
Desde janeiro, já foram destruídos 494 mil hectares de Cerrado na região de expansão agrícola chamada Matopiba, que compreende os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia e representa cerca de 75% da área desmatada de todo o Cerrado no ano.
"O que nós temos, essencialmente, é a ampliação do plantio desta cultura e o incremento do desmatamento e dos conflitos agrários e socioambientais. Maranhão e Bahia registram os maiores números de conflitos agrários no Nordeste, também no Matopiba, exatamente por conta da expansão desse monocultivo. Então não tem como se pensar na possibilidade de uma cadeia de soja sustentável, porque sua essencialidade é insustentável do ponto de vista social e ambiental", reforça Cabral.
O relatório publicado pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, em parceria com a Friends of the Earth, em maio de 2022, Empresas transnacionais do agronegócio causam violência, grilagem de terras e destruição no Cerrado, aponta a permanência da emissão de títulos falsos de propriedades e do desmatamento para o cultivo de soja na região.
Sobre essa realidade, a doutoranda em Estudos Sociais Agrários e dirigente do MST Gilvânia Ferreira aponta que a monocultura não respeita a diversidade produtiva, não respeita a natureza, não respeita os seres humanos que constroem no dia a dia, a sua sobrevivência nesses territórios e a sua relação respeitosa com a natureza.
"E essa soja que avança em nossos territórios com o trator e o correntão, que chega com os documentos grilados e diz que essa terra lhes pertence, pertence ao senhor que veio lá do Sul do Brasil ou de outras regiões, dizendo que essa terra tem um documento, mas essa terra pertence a essas comunidades há mais de 50, 60, 70 anos", complementa Gilvânia.
Conflitos agrários
No Maranhão, a região de Chapadinha foi a que teve o maior aumento da área de soja plantada nos últimos 20 anos. Em consequência, é uma das mais impactadas com registros de violência, assassinatos e ameaças a pequenos trabalhadores rurais e comunidades tradicionais e também um dos principais alvos de pulverização de agrotóxicos.
Antônio de Araújo, Presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares de Chapadinha, alerta ainda sobre a violência provocada pela pulverização de agrotóxicos.
"O avanço da soja só está causando prejuízo para o meio ambiente, prejuízo para as comunidades e prejuízo para a fauna, a flora. Porque a biodiversidade está sendo extinta pelo avanço da soja e impacto na saúde do povo por causa do agrotóxico que é colocado de aeronave. Aqui já tem riacho aterrado e muitos outros impactos, invasão de terras, como já foram invadidos dois assentamentos do Incra pelo agronegócio. Nós entramos na Justiça e estamos esperando justiça, porque é uma injustiça o que estão fazendo com a sociedade chapadinhense", denuncia Araújo.
Diogo Cabral alerta que para frear a violência no campo, passa essencialmente pela urgência em garantir a regularização de terras na região.
"O que nós temos denunciado sistematicamente é que esta cadeia, que envolve o plantio, mas envolve também a construção de corredores logísticos, estrada, ferrovia e porto tem causado forte impacto sobre comunidades tradicionais no estado do Maranhão, sejam elas indígenas, quilombolas, quebradeiras de coco e outras pertenças étnicas. Portanto, é fundamental face ao avanço significativo da soja, garantir a permanência dessas comunidades em seus territórios, por meio da política pública de reforma agrária, de titulação quilombola, de demarcação de territórios indígenas e regularização fundiária em prol das comunidades tradicionais."
O artigo de Diogo Cabral em parceria com o professor doutor em Geografia pela Universidade Federal do Maranhão, Ronaldo Barros Sodré pode ser consultado aqui.
Edição: Thalita Pires