Quase 50 anos depois da morte de Carolina Maria de Jesus, seu legado está vivo e muito bem cuidado. A filha da escritora, Vera Eunice, é uma das responsáveis pelos mais de 20 manuscritos deixados pela mãe. Esse material será editado e dará origem a novas obras. Uma delas é O Escravo, que será lançado no dia 11 de dezembro pela editora Companhia das Letras.
"A minha opção é não corrigir o livro da Carolina, é um apanhado sozinho que a gente faz. Às vezes ela começa a escrever aqui e você vê que ela finalizou lá, a gente faz muito pouco, mexe muito pouco, então está bem original dela mesmo", conta Vera ao Bem Viver, programa do Brasil de Fato, sobre a obra, que de acordo com ela, "briga muito com o português".
"Eu vejo que ela, agora, não de acordo com o nosso português, mas tem muitas palavras cultas demais. Eu estou grifando, isso aqui eu tenho que procurar e já era pra saber, eu sou formada, já tantos anos trabalhando, e tem palavras que eu tenho que procurar".
Vera é professora, e apesar de já ter idade para se aposentar, não abre mão de estar na sala. "Eu gosto muito de trabalhar na periferia, as minhas escolhas nas escolas sempre são em periferia, porque periferia é onde eu nasci. Eu sinto as crianças passam as mesmas coisas que eu passei. Mas eu tive uma mãe e ali eu sinto muito falta disso nas escolas, porque eu tinha uma mãe que cantava, que ia nas reuniões, uma mãe que lia, que olhava os cadernos, uma mãe presente e eu não vejo isso", afirma.
Ela relembra que ao morrer, Carolina deixou uma carta para ela com pedidos. Entre eles estava o da filha ser professora. Inclusive, a mãe chegou a aprender com ela enquanto fazia as lições de casa de português.
"Minha mãe tinha uma sede muito grande de aprender. Ela sabia das deficiências dela, né? E quando eu disse que minha mãe era semianalfabeta, a Conceição Evaristo já chamava minha atenção. 'Sua mãe vivia no letramento, sua mãe não era semianalfabeta'", explica.
Quando se trata de escrever as próprias obras, Vera se esquiva e diz que "nunca quis". O desejo só se desperta quando se trata da biografia da mãe, já que para ela os biógrafos que tentam contar essa história trazem inverdades sobre a relação com a família, como no cuidado com os filhos e até um casamento.
"São algumas coisas que eles vão colocando e eu não vou aceitando. Aí eu já estou escrevendo esse livro", conta Vera, que também celebra que o legado e as sementes de sua mãe seguem espalhadas pelo país.
"Conceição Evaristo se espelhou bastante em Carolina. Eliana Alves, Djamila Ribeiro. Agora, eu tenho visto muitas Carolinas. Todo lugar que eu vou eu vejo muitas Carolinas", conta a filha da autora.
E tem mais...
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Edição: Marina Duarte de Souza