Atender crianças e adolescentes com direitos violados ou ameaçados é a principal função do Conselho Tutelar, estabelecido na lei que ficou conhecida como ECA, criada há mais de 30 anos, como explica a Defensora Pública no Estado de Minas Gerais e titular da 4ª Defensoria dos Direitos da Criança e do Adolescente de Belo Horizonte, Daniele Bellettato.
“É uma função que foi trazida no Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990 com a finalidade de desjudicializar as políticas públicas de proteção à criança. E a ideia é que o Conselho Tutelar seja composto por quem esteja mais próximo da comunidade”, explicou a defensora.
Um tipo de violência comum sofrida por crianças e adolescentes é a sexual. No Brasil, estupros e exploração sexual de menores de idade cresceram mais de 15% no ano passado, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. A defensora pública reforça que o conselheiro tutelar deve fiscalizar e agir quando esta ou outras situações de violências forem identificadas.
“Algumas situações de atuação muito importante do Conselho Tutelar são quando o órgão se depara com uma situação emergencial, quando a criança está naquele momento numa situação de risco por violação de direitos, por abandono ou quando os pais saíram e deixaram aquela criança sozinha em casa ou não tão levando essa criança pra escola… ou não tão fazendo um tratamento de saúde adequado”, disse Bellettato.
Em outubro, novos conselheiros tutelares foram eleitos em todo o Brasil para o mandato que começa no ano que vem e vai até 2028. Em São Paulo, 260 vagas serão ocupadas nos 52 conselhos tutelares da cidade. São cinco profissionais para cada Conselho.
Entre os requisitos para o cargo de conselheiro, na capital paulista, a novidade foi a exigência de diploma de conclusão do Ensino Médio. Porém, a reportagem do Brasil de Fato já publicou que houve inconsistências nos documentos de alguns candidatos. Apesar disso, partindo de um estudo dos candidatos em Minas Gerais, a pesquisadora Elaine Cristina da Silva, que também é advogada e professora na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), ressalta que muitos que concorrem costumam ter formação superior, o que é importante.
“O que nós percebemos é que boa parte desses conselheiros têm uma formação de ensino superior nas áreas de Educação, na área de Serviço Social ou mesmo de Psicologia e esses profissionais não atuam como tais na função de conselheiro tutelar. Só que eles têm uma bagagem dessas formações que eles tiveram do ensino superior pra poder atuar. Então, é muito importante que os conselheiros tenham uma formação continuada para além desta inicial no sentido de trabalhar escuta, pra poder identificar essas violências”, pontua a especialista.
Em janeiro, 180 dos 260 conselheiros serão pessoas novas na função, ou seja, que não estão no mandato atual. Além da alta renovação, houve maior participação de eleitores. Em relação ao pleito de 2019, o número de votantes cresceu 35% na capital paulista. Porém, há uma estimativa, conforme mapeamento feito pelo Instituto de Cooperação Pública e Social, de que quase 60% dos eleitos sejam do campo conservador e ligados a igrejas neopentecostais, o que pode influenciar na atuação exigida de um conselheiro.
“O Estatuto da Criança e do Adolescente prevê que os conselhos tutelares tenham independência e autonomia. Então, esses vínculos podem gerar violações aos direitos na medida em que tivemos um avanço de setores fundamentalistas religiosos. É possível que quando chegue uma denúncia contra determinada liderança religiosa no Conselho Tutelar, aquilo não seja apurado de forma adequada porque os membros do Conselho não possuem autonomia e independência com relação a pessoa que está sendo investigada”, exemplifica o advogado e membro do Instituto dos Direitos da Criança e do Adolescente (Indica), Ariel de Castro Alves.
Conselheira eleita para o órgão da Lapa, na Zona Oeste de São Paulo, Patrícia Tavares é militante de movimentos sociais. Formada em Economia e especialista em Planejamento Urbano, teve diferentes experiências também ligadas às crianças e adolescentes e fala da expectativa para o mandato.
“A gente assume dia 10 de janeiro. Aqui na Lapa, apesar de ter tido algumas impugnações, enfim, atualmente o cenário que a gente tem é bastante positivo, porque foram 5 mulheres eleitas, sendo três delas reeleitas, que já tinham experiência no Conselho Tutelar. E todas com uma perspectiva bastante progressista. Então, mantendo esse cenário, eu acho que a gente tem condições de avançar bastante”, disse a futura conselheira.
Edição: Rebeca Cavalcante