A gente já está acostumado a conviver com lixo esparramado pelo chão das ruas, em terrenos baldios, nas rodovias e por tudo que é lugar que se vá por aí. Não tem jeito. Falta civilização. Não adianta criticar A ou B, catador ou gente que vive de restos... e há muitos neste Brasil amargurado e desigual como se sabe muito bem.
Certa vez, querendo bancar o limpinho, solicitei a um catador que não deixasse sujeira em torno do contêiner e levei uma carraspana: "Nós somos os maiores recicladores da cidade. Vivemos disso e deixa que sei fazer o meu serviço". Lição dada, lição assimilada.
Raros são os lugares que vi nos últimos tempos em que o lixo está no seu lugar certo ou que não há vestígios de coisas fora do seu lugar. No Litoral Norte do Rio Grande do Sul, então, nem se fala. A selvageria, a falta de respeito com a natureza, as cidades e balneários que não param de crescer sem considerar qualquer infraestrutura minimamente razoável estão gerando caos e desordem.
Todos são culpados por tanta bagunça e por tanta degradação. Vale a pena pensar: Tem jeito de fugir disso? Vale a pena turistar por ali? A resposta é não. Não queremos viver de sonhos, utopias, mas realmente estamos mudados para piorar. Cada um vive no seu quadrado e o resto que se exploda. É a mentalidade vigente. Ninguém quer saber quem é o João na fila do pão.
Entre tantas estultices que se vê por aí, gostaria de falar de um lugar – Parque Natural Municipal Tupancy (mãe de deus em tupi-guarani), uma unidade de conservação ambiental bem cuidada. É um verdadeiro santuário de fauna silvestre no município litorâneo de Arroio do Sal. Um contraste brutal com o resto da paisagem litorânea.
Claro que não é uma perfeição, um negócio fenomenal, de outro mundo. É bem simples, mas criado e mantido por gente que faz destas coisas simples lugares agradáveis e, até poderia se dizer, exemplares. Com 21 hectares, é limpo, bonito, tem mais de 100 tipos de aves para serem observadas, trilhas, mantenedor da fauna silvestre, centro de visitantes, duas passarelas para se admirar e tirar fotos e alguns outros bichos mais, como ratos de banhado, jabutis, lagartos, etc. Só não tem mais capivaras. Elas sumiram. Me dizem que foram morrendo e não houve procriação. Visitação grátis. E uma exigência: nada de lixo por ali, nem barulho.
Tem poucos recursos federais, estaduais, municipais, mas faz um bom serviço, bem mais que modesto, para os turistas e para as crianças e escolares que ali vão o ano todo buscando conhecimento e educação ambiental. Fica a oito quilômetros do centro da cidade de Arroio do Sal, entre as praias de Rondinha Velha e Balneário Atlântico e faz um trabalho bem legal de proteger os recursos naturais característicos da Zona Costeira e da Mata Atlântica do RS, como os raros e cada vez menores ecossistemas de dunas, lagos interiores, banhados, mata de restinga, fauna e flora associadas a esses ambientes. A Lagoa Tupancy também é um espetáculo, com águas cristalinas e sem nenhum sinal de agressão dos frequentadores. É uma beleza.
É de se perguntar, então: por que não ampliar esta preocupação com a natureza para o restante do Litoral? Simples: não há interesse.
As corporações imobiliárias tomaram conta da região e não querem nem saber com a amplitude necessária para onde vai o esgoto, os dejetos humanos e a gigantesca produção de lixo que ocorre principalmente no verão.
Capão da Canoa teve mais de 500 mil pessoas na virada do ano. O que se viu depois? Porcaria por todos os lados, com perdão aos porcos. Olhando de longe, pela Estrada do Mar, Capão parece uma metrópole, cheia de prédios. Tem condições infraestruturais para suportar? Claro que não.
Torres e Tramandaí estão na mesma toada de Capão e um pouco mais longe está Camboriú, catarinense que escondeu o sol dos veranistas na maior parte do dia com um prédio de mais de 70 andares. Vergonha pura.
Cuidar do lixo, do esgoto e da infraestrutura das cidades são elementos vitais para a sobrevivência digna da população e para a sua saúde. Os governantes estaduais e municipais pelo jeito não estão nem aí. Estão aí para fazer obras caras, com editais dúbios e cheios de manobras impuras. Hora de acordar. Hora de tentar dar um salto para uma vida mais saudável.
* Jornalista, ex-editor-chefe e ex-editor de Economia do Correio do Povo.
** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Katia Marko