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Relatórios indicam falhas em câmeras de presídio de Mossoró (RN)

Causas da fuga inédita estão sendo investigadas pelas autoridades

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, chega ao Rio Grande do Norte - Jamile Ferraris/MJSP

*texto modificado às 17h31 de 18/02/2024 para inclusão do posicionamento do Ministério da Justiça

Relatórios internos revelados pelo jornal O Globo e o portal g1 indicam que o sistema de câmeras de vigilância da Penitenciária Federal de Mossoró (RN) operava com falhas e que deveria ter sido firmado contrato de manutenção do sistema de 2012 em diante.

Segundo divulgou a coluna Lauro Jardim, do Globo, 124 câmeras de vigilância estavam sem funcionar, de acordo com um relatório de inteligência produzido em 2021, na gestão Bolsonaro, por agentes penitenciários federais. 

Já o blog da jornalista Julia Duailibi, do g1, revelou que as falhas foram constatadas também em relatórios recentes, um deles em 13 de fevereiro, na véspera da fuga de dois detentos, a primeira já registrada no sistema penitenciário federal, considerado de segurança máxima. Além de câmeras inoperantes, o presídio teria alas com pontos cegos e equipamentos com má qualidade de imagem que já deveriam ter sido trocados. 

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"O sistema de monitoramento eletrônico opera em capacidade muito reduzida, devido a inúmeros problemas de funcionamento, dentre os quais destacam-se muitas câmeras inoperantes ou com qualidade ruim". E continua: "Isso provoca muitos pontos cegos sem monitoramento como em alas, pátios de sol, corredores de circulação, perímetro externo, entre outros", diz trecho do relatório revelado pelo g1

Segundo o portal, os equipamentos foram comprados em 2009 e teriam garantia de três anos, de forma que deveria ter sido feito um contrato de manutenção ainda em 2012. As imagens estariam se deteriorando desde 2015. 

Sistema de tubulação 

O g1 teve acesso às considerações finais de dois relatórios feitos por plantonistas de Mossoró, um no começo de janeiro de 2023 e outro no dia 13 de fevereiro de 2024. 

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Já a coluna Lauro Jardim teve acesso a um outro relatório, de agosto de 2023, que apontava um problema na área do shaft, região onde ficam as tubulações do presídio. O documento, que tem registros fotográficos do problema, alertava que era preciso resolver o problema "com urgência", uma vez que o shaft poderia ser acessado a partir da cela se um preso conseguisse retirar a luminária do local. 

Em coletiva de imprensa concedida pela equipe do Ministério da Justiça em Mossoró na tarde deste domingo (18), após a divulgação dos relatórios, o secretário nacional de Políticas Penais, André Garcia, afirmou que os documentos precisam ser lidos com cautela e contextualização. "Na administração pública é muito comum relatórios que apontam defeitos, alguns problemas, como esse relacionados às câmeras. O importante é a gente saber a partir do diagnóstico que está sendo feito, o que deve ser feito agora, para frente, para que esses problemas sejam sanados", afirmou

"Dentre outras [ações], uma das mais importantes é a revitalização e reforço do sistema de videomonitoramento dessas unidades. O que nós sabemos é que no passado recente, havendo algumas observações com relação a problemas de funcionamento de câmeras, elas vinham sendo já substituídas. Por isso que a gente pede a compreensão da avaliação e divulgação dessas informações, porque muitas vezes elas vêm truncados, relacionam realidades que não existem mais no sistema e muitas vezes elas desconsideram providências que já foram tomadas", completou.

Ministro está no RN 

O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, está no Rio Grande do Norte para acompanhar as operações de busca dos dois detentos, que pertencem ao Comando Vermelho, e também para acompanhar as investigações sobre a fuga ocorrida na quarta-feira, (14). Em um rápido pronunciamento ao chegar no estado neste domingo(18), o ministro afirmou que o episódio da fuga é uma "dificuldade momentânea".

"A minha presença aqui é, antes de mais nada, para mostrar que o governo federal está presente, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está aqui também prestigiando o estado, prestigiando as autoridades locais para que nós resolvamos esse problema que surgiu, que é um problema que, tenho que dizer, não afeta em hipótese nenhuma a segurança das cinco unidades prisionais federais, mas que é um problema localizado e que será superado em breve com a colaboração de todos", disse Lewandowski ao lado da governadora Fátima Bezerra. 

Mais cedo, em coletiva de imprensa na Etiópia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que pode ter havido a conivência de pessoas de dentro do sistema prisional apara a fuga. "Não quero acusar, mas teoricamente parece que teve conivência de alguém do sistema lá dentro, mas não posso acusar ninguém, sou obrigado a acreditar que uma investigação que está sendo feita pela polícia local e a Polícia Federal nos indique amanhã ou depois de amanhã o que aconteceu no presídio de Mossoró", afirmou o petista. 

Busca pelos detentos

Lewandowski afastou a direção da penitenciária no mesmo dia da fuga e nomeou um interventor, Carlos Luis Vieira Pires, que já dirigiu a penitenciária federal de Catanduvas (PR). A Polícia Federal apura se a fuga teve a a ajuda de um agente penitenciário ou operário de obras feitas na unidade. Ao todo, cerca de 300 agentes federais, drones e três helicópteros, com equipes especiais da Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal, estão sendo utilizados nas operações de busca.  

A forma como ambos escaparam está sendo investigada. Um buraco foi encontrado em uma parede, e suspeita-se que eles tenham usado ferramentas destinadas a uma obra interna. Em entrevista na quinta-feira, Lewandowski, afirmou que os fugitivos estavam a um raio de 15 quilômetros da prisão.  

Criado ainda no primeiro mandato do presidente Lula, em 2006, o sistema penitenciário federal foi uma resposta do Estado brasileiro ao avanço do crime organizado no país e para auxiliar os Estados, que são responsáveis pela segurança pública, no combate a essas facções. Consideradas invioláveis até então, as penitenciárias federais foram criadas com o objetivo de manter isolados, principalmente, os líderes de organizações criminosas e sempre contaram com um rigoroso sistema de segurança e controle de acesso, além de adotarem medidas como o rodízio de detentos entre os diferentes estados. 

Edição: Thalita Pires