Solidariedade

Transição no Haiti é oportunidade para solução da crise sem intervenção militar, diz ativista do Quênia

Movimentos populares são contra o compromisso firmado pelo Quênia de enviar policiais ao Haiti

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Movimento popular no Quênia estabelece diálogo para apoio às demandas da população haitiana - LUIS TATO / AFP

O anúncio da renúncia do primeiro-ministro haitiano Ariel Henry, reconfigurou as peças na disputa política sobre a solução para a crise haitiana. Henry anunciou sua saída do governo menos de duas semanas após assinar um acordo de reciprocidade com o Quênia, país que se ofereceu para liderar a Missão Multinacional de Segurança, autorizada pelo Conselho de Segurança da ONU, e enviar mil policiais ao Haiti.

Com a renúncia de Henry, o presidente do Quênia, Willian Ruto, suspendeu o envio das tropas e condicionou o cumprimento do acordo à formação de um novo governo no Haiti. Gacheke Gachihi , líder do Centro de Justiça Social de Mathare, um movimento popular localizado na área urbana de Nairobi, capital do Quênia, considera que a transição no Haiti é uma oportunidade para encontrar uma solução haitiana para a crise, "longe de uma intervenção militar".  Ele defende a necessidade de uma solução ampla que inclua os movimentos populares do Haiti e crie uma liderança política alternativa baseada em justiça social e direitos humanos.

O Centro de Justiça Social de Mathare tem dialogado com os movimentos populares no Haiti para buscar uma solução que respeite a soberania haitiana, baseada na solidariedade. "Isso é solidariedade como aquela que o Haiti teve com os países da África e da América Latina durante a Revolução Haitiana. Então essa é uma grande oportunidade para para começarmos a articular agora a solução política, longe da solução militar e policial, fornecida por forças do imperialismo, que tem interesse em saquear os recursos e continuar a desestabilização."

Acordo para o envio de tropas

No final de fevereiro, Ariel Henry viajou para Nairóbi para assinar um “acordo recíproco” com o presidente queniano Willian Ruto, cujas bases foram estabelecidas em Washington na segunda semana de fevereiro, pelas delegações dos dois países com mediação dos Estados Unidos. Na ausência de Henry, grupos armados no Haiti lançaram uma grande ofensiva, impossibilitando seu retorno ao país.

"Os Estados Unidos e outros países imperialistas realmente contribuíram muito para a crise e a violência no Haiti. O primeiro ministro renunciou depois de estabelecer o acordo com o governo do Quênia, que é um governo reacionário", aponta Gachihi. "Nós temos trabalhado com o Movimento Indígena e Pan-Africano do Caribe e também organizamos uma campanha no Quênia contra o envio da polícia queniana para o Haiti. Portanto, damos as boas-vindas à transição", aponta Gachihi.

Em comunicado publicado no final de janeiro, os movimentos quenianos e caribenhos que se opõem ao envio de tropas, dizem uma missão militar liderada pelo Quênia no Haiti significa "jogar na lama" o nome do movimento Pan Africano, "que visa a emancipação completa dos africanos no continente e na diáspora, associando-o ao ataque criminoso dos EUA ao Haiti, que visa precisamente impedir essa emancipação."

Os Estados Unidos anunciaram US$ 200 milhões (quase R$ 1 bi) em financiamento para a missão, com 100 milhões de dólares adicionais em 11 de março, enquanto as Bahamas, Bangladesh, Barbados, Benin e Chade notificaram formalmente a ONU de sua intenção de fornecer pessoal para a implantação.

Mas no final de janeiro, o Tribunal Superior do Quênia declarou inconstitucional o envio de pessoal ao Haiti, decidindo que o Conselho Nacional de Segurança do país não tinha autoridade para enviar policiais para fora. A ordem foi uma extensão das medidas provisórias emitidas pelo tribunal em outubro, que o parlamento do Quênia desafiou para autorizar a missão. 

Edição: Rodrigo Durão Coelho