Programa Bem Viver

Grandes projetos da ditadura para a Amazônia não melhoraram condições de vida da população

Professor da UFPA avalia que ideia equivocada de desenvolvimento da região segue mesmo após a redemocratização

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Projetos de infraestrutura aumentam concentração fundiária e intensificam conflitos por terra - Prefeitura de Manaus

O desenvolvimento da Amazônia é um ponto controverso na história brasileira. Entre propostas de desenvolvimento local, integração nacional, intensificação da ocupação humana e grandes projetos de engenharia, a região viu boa parte da floresta ser derrubada e a população crescer quase 1000% desde os anos 1960, com significativo agravamento de conflitos e pouca melhora nas condições de vida.  

Para o professor titular da Faculdade de História Universidade Federal do Pará (UFPA) e doutor em História Econômica da América Contemporânea pela Universidade de São Paulo (USP), Peri Petit, o desenvolvimento da Amazônia foi severamente impactado pela ditadura militar.  

"Temos várias fases dos governos militares nesses 21 anos. O que mais teve efeitos até hoje foi o governo do Geisel, que foi um pouco diferente, com aquela ideia muito vinculada à Sudam [Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia], de desenvolver a Amazônia, modernizar, industrializar. Com o Médici é quando entra mais a ideia de integração humana, com a Transamazônica. Aquela ideia de terra sem homens para homens sem-terra. Mas não era só isso, a ideia era integrar a Amazônia ao mercado nacional e internacional", explica.  

Petit destaca entre essas fases a de incentivo à migração e à instalação de empresas e grandes propriedades de terra, algumas ocupadas legalmente, outras ilegalmente, com incentivos fiscais imensos. Depois, há uma fase de extremo desmatamento da Amazônia. "Hoje, na Amazônia Legal, se considera que temos mais de 20% das terras desmatadas, desde os anos 1970. E muitas dessas políticas continuam em vigência até hoje", explica.   

Essa grande migração e apropriação de grandes porções de terras intensificam o intercâmbio cultural e econômico, mas vão também aceleram os conflitos de grandes mineradoras e proprietários de terras com as comunidades indígenas e quilombolas.   

"Também houve a priorização que os governos militares deram ao asfaltamento, às grandes estradas, inclusive em detrimento da mobilidade pelos rios da Amazônia. Sabemos o impacto que teve a rodovia Belém-Brasília, asfaltada em 1970. Aí começa o intercâmbio com outras partes do país, de produtos, de madeira. Mas também a chegada de milhares e milhares de pessoas. Hoje temos 30 milhões de habitantes na Amazônia Legal. No início dos anos 1960 eram cerca de 3 milhões", relata.  

Porém, esse projeto de desenvolvimento não foi interrompido, mesmo com o fim da ditadura. Não houve mudança significativa nas propostas apresentadas para a região pelos governos eleitos com a restauração da democracia, explica o professor.  

"Com o fim da ditadura militar, na essência, os governos da Nova República deram continuidade a esses grandes projetos. Sei que houve uma quebra em políticas sociais, de assistência, sobretudo no governo do PT. Mas a lógica que foram os próprios PACs [Programa de Aceleração do Crescimento], continuaram, inclusive aceleraram alguns projetos, como no caso das hidrelétricas. Hoje, Altamira, onde está Belo Monte, é o município que mais cresce demograficamente, percentualmente, no país. A desestruturação das comunidades indígenas, dos ribeirinhos, continua", afirma.

A continuidade desses projetos, apesar das grandes obras e de políticas de incentivo ao desenvolvimento econômico de empresas, como a zona franca de Manaus, não impacta positivamente na população.  

"Temos uma continuidade estratégica desses grandes projetos. Mas, apesar de todo esse avanço, da incorporação da Amazônia ao mercado nacional, da contribuição que faz a Amazônia nas exportações, apesar dessa importância, a região Norte segue a que tem o pior índice de desenvolvimento humano. Especialmente algumas áreas ainda estão muito longe da distribuição da riqueza para a maior parte da população", diz.

"Agora vamos ter um pouco de mudança, o governo Lula atual parou um pouco essa ofensiva de mais hidrelétricas na Amazônia", espera Petit.

Ouça a entrevista completa no programa Bem Viver.


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Edição: Matheus Alves de Almeida