Na manhã desta segunda-feira (15), cerca de 200 famílias do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ocuparam uma fazenda improdutiva na cidade de Campinas (SP). A área de aproximadamente 200 hectares, tomada por pastagem degradada, é de propriedade de uma empresa do setor imobiliário, a Zezito Empreendimentos Ltda.
A ocupação integra o Abril Vermelho, jornada nacional de lutas que o MST faz anualmente no mês em que, em 1996, aconteceu o Massacre de Eldorado do Carajás. Neste ano, o lema da jornada é “Ocupar para o Brasil alimentar”.
Além de fazer a denúncia da quantidade de terras na região que, sem cumprir a função social, servem apenas à especulação imobiliária, afirmou Patrícia Maria, do MST, a ocupação demanda "que essa terra seja destinada para a reforma agrária, para produzir alimentos saudáveis, para reflorestar esse solo degradado e para construir novas relações humanas".
A primeira assembleia da ocupação, na qual as famílias se dividiram em grupos como de saúde, alimentação e de montagem de estruturas coletivas, aconteceu debaixo de uma das poucas árvores remanescentes em meio ao pasto da Fazenda Santa Mariana. "Deixaram este jatobá como testemunha da destruição da Mata Atlântica. Em volta dele vamos construir nossos barracos", disse Jelson Souza, membro do MST, ao lembrar que "as terrras dessa região foram cultivados por pessoas negras escravizadas ao longo de muitos anos. Campinas foi uma das últimas cidades a abolir a escravidão, mesmo após a Lei Áurea".
Sete viaturas da Polícia Militar e da Guarda Civil Municipal de Campinas chegaram à área por volta das 8h e, até o fechamento desta matéria, permaneciam na entrada do acampamento.
O Brasil de Fato entrou em contato com a empresa, via e-mail, e aguarda posicionamento para atualização da matéria.
Proprietária autodeclara improdutividade da área
"Nosso lema esse ano pretende dialogar com a sociedade sobre a importância da terra cumprir sua função social", ressaltou Margarida Silva, da coordenação nacional do MST.
"Nós ocupamos para questionar porque que a lei não é cumprida. Uma política de reforma agrária séria deve desapropriar latifúndios que não cumprem que não produzem, que cometem crimes ambientais ou que submetem pessoas a trabalho análogo à escravidão", explicou Silva, citando o artigo 184 da Constituição Federal, que determina que "compete à União desapropriar por interesse social, para fins de reforma agrária, o imóvel rural que não esteja cumprindo sua função social".
Em um documento enviado à prefeitura de Campinas em 2015 no âmbito da revisão do Plano Diretor, a empresa Zezito Empreendimentos Ltda autodeclarou a impossibilidade de viabilizar atividades produtivas no local.
"O desenvolvimento das atividades rurais para se manter é inviável nessa localidade, o que atualmente tão somente gera prejuízos e despesas de grande monta", afirmou a proprietária, ao solicitar uma alteração do zoneamento da cidade para que a área seja considerada de expansão urbana.
No mesmo documento, a empresa diz almejar que a destinação da área seja para interesse social. Em nota, o MST afirma que tem mesmo desejo. "Reivindicamos que o terreno seja destinado para fins de reforma agrária tornando-se, enfim, produtivo".
"A Fazenda Santa Mariana é improdutiva, antigamente fazia parte da Fazenda São Bento, um grande latifúndio que foi desmembrado", explica Jelson. "Já foi comprovado que o interesse da empresa proprietária não é a produção agrícola. Pretendem construir casas, provavelmemte um condomínio nessa área. Então o MST faz essa ação para denunciar os empreendimentos imobiliários que usurpam essas áreas na região metropolitana de São Paulo que se utilizam do capital especulativo para aumentar seus lucros e usam o argumento de que irão construir habitação de interesse social para abocanhar o fundo público", salientou.
Pressão no governo
A ocupação em Campinas, assim como outras ações que o MST realiza nesta segunda-feira (15) e ao longo da semana, acontece em momento em que movimentos populares do campo criticam a insuficiência das políticas de reforma agrária por parte do governo federal.
Além de reivindicar maior orçamento voltado à área, o MST demanda a desburocratização do acesso de agricultores à crédito e políticas públicas e o assentamento de 65 mil famílias que vivem acampadas no país.
"São um ano e quatro meses de governo Lula, e a gente avalia que o governo tem tomado várias iniciativas para o conjunto da população, mas para a questão agrária ainda está muito aquém", ressalta Margarida Silva.
Edição: Vivian Virissimo