Desde os 15 anos de idade, Kaoane Schlukebier, 23, vem traçando seu caminho como empreendedora através da venda de roupas de segunda mão. Nascida e criada na Fazenda Rio Grande, ela viu no brechó uma oportunidade não apenas para ajudar a sustentar sua família, composta por sua mãe e três irmãos, mas também para seguir seu grande sonho: a dança.
“Eu sempre sonhei em dançar, mas minha mãe não tinha condições de me dar dinheiro para treinar e fazer as aulas, por isso comecei a procurar outras fontes de renda. Antes do brechó eu catava latinha e fazia acessórios, como brincos e chaveiros, para ter dinheiro e poder ir dançar”, conta Kaoane.
Durante os eventos de dança, levava consigo seus acessórios e sacolas de roupas. Entre uma apresentação e outra, aproveitava para expor seus produtos e vender suas peças. Além desses espaços, também criou o Brechó Kaw Black (@brecho.kawblack), para expandir o público e realizar vendas online.
Aos 17 anos, foi a mais jovem de um grupo de empreendedoras da periferia que ocupavam a Praça de Bolso do Ciclista, localizada no centro histórico, para expor as peças do brechó. Todos os sábados, a Coletiva Brechó reunia mulheres de diferentes cidades e bairros da Grande Curitiba, que se deslocavam até o centro para fortalecer suas causas sociais e disputar a economia central.
“Nessa época, eu vinha da Fazenda Rio Grande para o centro com um carrinho de feira e uma arara de roupa no ônibus. Algumas pessoas achavam que eu estava indo acampar, mas dizia que ia vender roupa mesmo”, relembra Kaoane.
Brechó como alternativa sustentável
Em meio ao crescente impacto ambiental da indústria da moda, os brechós surgem como uma resposta consciente e sustentável ao fenômeno do fast fashion, termo utilizado para definir a constante renovação das peças vendidas no varejo da moda.
Com peças até 60% mais acessíveis do que os das grandes marcas, os brechós não apenas oferecem uma alternativa econômica, mas também promovem o consumo consciente de roupas, contrapondo a tendência de descarte rápido que domina o mercado atual.
A indústria têxtil é uma das responsáveis pelo consumo excessivo dos recursos naturais, uma vez que necessita de muita água e de terrenos para o cultivo de algodão e outras fibras.
Segundo relatório produzido pela Agência Europeia do Ambiente, a produção de uma única camiseta de algodão consome cerca de 2700 litros de água doce, a quantidade média de água que uma pessoa bebe em dois anos e meio.
Além disso, estima-se que essa indústria seja responsável por 10% de emissão dos gases causadores do efeito estufa, superando as emissões da aviação e do transporte marítimo juntos. De acordo com o relatório "A New Textiles Economy: Redesigning fashion's future", da Fundação MacArthur, anualmente são desperdiçados US$ 500 bilhões com roupas descartadas, muitas vão direto para lixões sem sequer serem recicladas. Apenas no Brasil, mais de 180 mil toneladas de roupas são descartadas por ano.
Iniciativas como bazares e brechós representam uma alternativa à lógica de consumo descartável das peças de roupas, garantindo a reutilização das mesmas. Para comunidades periféricas, esses empreendimentos representam fontes sustentáveis, com um preço justo e acessível para quem não tem condições de consumir as grandes marcas.
“Eu venho de uma família que não tinha tantas condições, sempre compramos em brechó ou ganhamos doação. Os bazares e brechós sempre foram nosso shopping”, afirma Kaoane.
Atualmente, os brechós também têm se tornado muito mais do que estabelecimentos comerciais. Representam uma oportunidade para discutir as relações de consumo, especialmente para mulheres jovens, mães, negras e periféricas, que encontram nesses espaços uma plataforma para liderar seus próprios negócios, tanto online quanto físicos.
“Eu acho muito importante essa alternativa para pessoas igual eu que não tem condição de pagar caro em roupas. Podemos estar estilosos e na moda, mas pagando dois ou 20 reais na peça”, ressalta Kaoane.
A ascensão das redes sociais tem sido um grande impulsionador para os brechós, permitindo que jovens empreendedores sociais como Kaoane alcancem um público mais amplo e diversificado.
Para ela, que é mãe de uma criança de 1 ano de dois meses, o brechó se tornou ainda mais importante, desempenhando papel principal como fonte de renda, apesar de complementar seus trabalhos através da dança.
“Nessa nova caminhada quero atualizar a página do brechó e postar mais novidades, também já estou garimpando novamente”, conclui ela, demonstrando sua determinação em manter viva sua paixão pela moda sustentável.
Fonte: BdF Paraná
Edição: Pedro Carrano