“Israel não alcançou seus principais objetivos na guerra”, nos quais, segundo a nação, consistem na libertação de reféns e na “destruição total do Hamas”. É o que diz uma reportagem publicada pelo jornal The New York Times, em 22 de abril.
Segundo o veículo norte-americano, foram mais de seis meses de um conflito custoso no qual Tel Aviv ficou à mercê de seus aliados próximos, enquanto gerou tensões globais decorrentes do alto número de palestinos massacrados pelas Forças de Defesa de Israel (IDF, na sigla em inglês), da fome instalada em Gaza e dos assassinatos a funcionários humanitários que auxiliavam as vítimas da guerra na região.
Dados apontados pela matéria indicam que as baixas militares de Israel começaram a aumentar, com cerca de 260 mortos e mais de 1.500 feridos desde que a nação intensificou suas operações no território palestino, em 7 de outubro de 2023.
As autoridades de Tel Aviv afirmam que cerca de 133 israelenses permanecem reféns em Gaza. No entanto, as negociações para garantir um acordo que possibilite o retorno de pelo menos alguns deles em troca do cessar-fogo e da libertação de prisioneiros palestinos, exigido pelo Hamas, seguem num impasse.
Em um contexto em que as forças israelenses relatam um aumento no número de baixas do grupo de resistência palestino, sem nenhum soldado de seu exército sendo morto desde 6 de abril, e as crescentes ameaças do premiê Benjamin Netanyahu para invadir Rafah, considerado o “último abrigo humanitário” dos palestinos, o The New York Times questiona: “quem governará Gaza e fornecerá sua segurança se os combates acabarem?”
Para a pergunta, autoridades norte-americanas e israelenses, membros do Hamas e palestinos no enclave foram ouvidos pela reportagem.
Douglas London, oficial aposentado da CIA que trabalhou 34 anos na agência, responde que “por mais danos que Israel possa ter infligido ao Hamas, o grupo ainda tem capacidade, resiliência, financiamento e uma longa fila de pessoas esperando para se integrar ao grupo”.
Tel Aviv crê que quatro batalhões do Hamas estão baseados na cidade de Rafah, e que milhares de outros combatentes se refugiaram na região, em meio a um milhão de civis palestinos. E para as IDF, esses batalhões devem ser desmantelados por meio de uma incursão terrestre.
No entanto, essa possível invasão se tornou um ponto de atrito com os Estados Unidos que, segundo suas autoridades, Israel não desenvolveu um plano para evacuar os civis de Rafah, o que causaria uma crise catastrófica e um aumento expressivo no número de fatalidades em Gaza, que atualmente ultrapassa da marca dos 34 mil.
A orientação israelense para que os palestinos se “desloquem a áreas mais seguras” entra em contradição, segundo Washington, uma vez que grande parte do enclave já está inabitável em decorrência dos seis meses de ataques.
“É um momento oportuno para Israel fazer a transição para uma nova fase [da guerra], focada em operações de contraterrorismo muito precisas, particularmente dada a situação de 1,2 a 1,3 milhão de palestinos, todos agrupados dentro de Rafah e seus arredores”, disse o tenente-general Mark C. Schwartz, comandante aposentado de Operações Especiais dos Estados Unidos, que coordenou a segurança norte-americana para Israel e para a Autoridade Palestina.
Os planos de invasão a Rafah também são obstáculos nas negociações sobre um acordo de cessar-fogo temporário e libertação de reféns.
William J. Burns, diretor da CIA, culpou o Hamas pela falta de progresso nas negociações e pelo rechaço a uma proposta apoiada pelos Estados Unidos, apresentada em abril. Mas, de acordo com o grupo palestino, os documentos projetados por Israel não atendem às suas demandas.
Segundo a reportagem, se por um lado as autoridades norte-americanas entendem que a única maneira de fazer Israel parar a operação de Rafah é por meio de um acordo de libertação de reféns, por outro, as autoridades israelenses acreditam que é apenas a iminente operação em Rafah que manteve o Hamas em negociações.
À medida que as negociações continuam, famílias de reféns expressam fúria em relação ao fracasso israelense em trazer seus entes queridos para casa.
“Eles abandonaram os reféns”, disse Gilad Korngold, de 62 anos, cujo filho Tal Shoham é um dos reféns, acrescentando que foi tomado por sentimentos de “desespero, frustração, raiva e medo” por causa da falta de competência do governo em fechar um acordo para libertar os reféns.
Jay Tabb, oficial da Marinha que lutou no Iraque e serviu como alto executivo do FBI, acredita que “a recuperação dos reféns se resume a negociações ponderadas e unificadas, e isso provavelmente não acontecerá até que Israel retire o martelo”.
Em relação aos túneis quilométricos subterrâneos instalados no território palestino que, segundo os governos israelense e norte-americano, o Hamas usou como esconderijo, prisão de reféns e atalho de fuga contra ofensivas, o The New York Times afirma que “Israel não foi capaz de destruí-los”, embora o Exército de Tel Aviv relate que cerca de 70% dos complexos tenham sido eliminados.
Autoridades de Israel também afirmam que mataram até 13.000 membros do Hamas, e que 19 dos 24 batalhões do grupo palestino não estão mais funcionando – embora especialistas alertem que quaisquer números são imprecisos, dado o caos da guerra.
“Mas veteranos das guerras dos Estados Unidos dizem que o número de soldados inimigos mortos, ou postos de comando destruídos, provou ser um fato totalmente irrelevante e uma medida profundamente enganosa de sucesso em uma campanha militar. Com certeza, as agências de inteligência norte-americanas avaliam que o Hamas perdeu uma quantidade significativa de poder de combate, e que a reconstrução levará tempo”, diz a reportagem.
Autoridades e analistas norte-americanos concluem que o Hamas continuará resistindo em Gaza, independente do cenário no futuro. Já em relação à rapidez com que se poderá reconstruir dependerá das decisões que Israel tomar nas próximas fases da guerra.
“Estamos passando por uma experiência terrível […] só queremos voltar para nossas casas”, disse Khalil el-Halabi, de 70 anos, morador da cidade de Gaza, abrigado em uma tenda em Rafah.
Apesar do apelo internacional por contenção, “todos”, segundo o jornal, sabem que Israel invadirá Rafah: “a verdadeira questão é o que acontecerá depois disso”.
Em janeiro, Benny Gantz, membro do gabinete de guerra de Israel, disse a um grupo de israelenses que a guerra poderia durar “um ano, uma década ou uma geração”, de acordo com uma pessoa que participou da reunião.
Já as autoridades de Washington rebatem sugestões de que operações israelenses poderiam durar mais dois meses, quanto mais dois anos.