A política é bem estruturada, o problema está na prática.
Mais de dez anos após ser instituída, a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora ainda não conseguiu alcançar a totalidade dos objetivos que estabeleceu. A portaria de 2012 define diretrizes e estratégias na gestão do SUS para o combate e o tratamento de doenças causadas pelas atividades profissionais.
Ela define ações com foco na garantia de acesso, na prevenção e no acompanhamento integral. O texto prevê articulação e atuação em rede, das unidades básicas à alta complexidade e com outros setores do poder público. No entanto, o Brasil ainda tem um longo caminho para que as metas sejam totalmente alcançadas.
“A política é bem estruturada, o problema está na prática. Ela ficou muito dentro do próprio SUS – que é um braço fundamental e essencial para isso – mas ela não se encerra aí”, afirma a pesquisadora Rita Mattos, coordenadora do Centro de Estudos da Saúde e do Trabalhador na Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (Cesteh/ENSP) da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em conversa com o podcast Repórter SUS.
Mattos aponta que a articulação das diversas áreas para implementação da política não foi efetivada. “Nós não conseguimos a implementação por completo, ela não consegue ainda articular a questão da interseccionalidade e da institucionalidade. Também passamos por um período de desmantelamento, desde o golpe de 2016, com a reforma administrativa e a reforma trabalhista.”
No mais recente episódio do podcast, a pesquisadora citou estruturas que conseguiram permanecer ativas, mas que também precisam de fortalecimento. Entre elas estão os Centros de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) e a Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador (RENAST). Mattos também ressaltou a importância da participação do Ministério Público do Trabalho, ampliada nas últimas décadas.
Hoje, quando um trabalhador ou trabalhadora sofre um acidente de trabalho, as empresas são obrigadas a notificar o ocorrido. O primeiro passo é registrar a situação com profissionais da saúde. Depois disso, é preciso emitir a Comunicação de Acidente do Trabalho (CAT).
O documento é essencial para recebimento do auxílio doença acidentário no INSS. Se a empresa não cumprir essa obrigação, a própria pessoa acidentada pode realizar o processo. O CAT também pode ser registrado por entidades sindicais, médicos e médicas e autoridades como o Ministério Público.
Em casos de doenças desenvolvidas por causa da atividade profissional o processo é um pouco mais elaborado. Para comprovar que o problema surgiu no trabalho, é preciso reunir as informações do exame adicional, de laudos médicos e de atendimento. Muitas vezes, a questão só é resolvida na justiça.
Participação e diálogo
No próximo ano, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) deve realizar a 5ª Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (5ª CNSTT). Até lá, eventos estaduais, municipais e regionais devem levar sociedade civil, movimentos populares e trabalhadores e trabalhadoras da saúde a discutir o tema.
O CNS divulgou um Documento Orientador que detalha eixos, subeixos e perguntas direcionadoras para orientar os debates preparatórios. O tema central da 5ª CNSTT é Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora como Direito Humano
“Essa conferência traz a possibilidade de mudar de patamar a questão do trabalho. Coloca o trabalho como um direito. Além de ser o que a gente chama de um determinante social importantíssimo na vida, ele vai mudar de patamar. Trata (o trabalho) como um direito humano, porque ainda vivemos problemas como trabalho escravo, trabalho infantil, número grande de acidentes de trabalho”, definiu Rita Mattos.
O Repórter SUS é uma parceria entre o Brasil de Fato e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz).
Edição: Matheus Alves de Almeida