Em 8 de maio de 2014, após 75 anos de muito sorriso, alegria e emoção, a força de Jair Rodrigues se resguardou. Foi uma carreira meteórica que começou despretensiosamente em cidades do interior de São Paulo, próximas a Igarapava, onde o artista nasceu em 1939.
A capital paulista foi o trampolim. Após se apresentarem em bares, ao lado de Hermeto Pascoal, por exemplo, Jair Rodrigues subiu no palco ao lado de Elis Regina, em um dos momentos, até hoje, icônicos da música brasileira, em 1964.
Três álbuns saíram desta apresentação, Dois na Bossa volume 1,2 e 3, gravados ao vivo no Teatro Paramount, em São Paulo, eternizando canções como O Morro Não Tem Vez, Arrastão e Acender as Velas.
"Ele teve uma bravura por ser um homem preto, vindo da situação rural. Ele nasceu no interior do Brasil, no interior de São Paulo, em Igarapava, quase Minas Gerais, numa fazenda de cana, onde minha avó, dona Conceição, trabalhava, e ele nasceu nessa situação bastante humilde, bastante precária", conta Jair Oliveira, o Jairzinho, filho do músico, em entrevista ao programa Bem Viver desta quarta-feira (8).
O sucesso no samba não satisfez Jair Rodrigues. O artista se destacou pela versatilidade de ritmos que dominava. Algo que ficou evidente ainda no começo da carreira.
Um ano após se apresentar com Elis Regina, Jair Rodrigues subiu no famoso palco do Festival da MPB realizado pela TV Record. Ele apresentou a música Disparada, de Geraldo Vandré e Théo de Barros, acompanhado do conjunto Quarteto Novo.
A Banda, de Chico Buarque e interpretada por Nara Leão, era a favorita a ganhar o prêmio daquele ano. Mas o festival acabou empatado, e o júri decidiu que as duas apresentações, de Jair e Nara, seriam as vencedoras. A partir daquele momento a carreira de Jair decolou e seu talento assegurou décadas de sucesso ao cantor.
Além do talento musical, Jairzinho guarda o sorriso do pai como herança
"Ele era uma pessoa muito genuína mesmo, ele tinha aquela alegria. Eu posso afirmar com toda a certeza do mundo, é a pessoa mais feliz que eu já conheci na minha vida, assim, a pessoa mais feliz, com a maior disponibilidade de aceitar essa felicidade, de agradecer por essa felicidade, então ele realmente era aquilo que ele demonstrava ser e muito mais."
Confira a entrevista completa
Além de ter uma força na voz incomparável, Jair Rodrigues tinha uma desenvoltura no corpo impressionante também. Você mesmo comentou em algumas oportunidades que era a característica mais difícil de imitar dele
Era impressionante. Muita gente já me perguntou assim: "pô, mas seu pai era assim mesmo?" Eu e minha irmã sempre respondíamos que ele era ainda mais fora das câmeras. Porque ele era uma pessoa muito genuína mesmo, ele tinha aquela alegria.
Posso afirmar com toda a certeza do mundo, é a pessoa mais feliz que eu já conheci na minha vida, assim, a pessoa mais feliz, com a maior disponibilidade de aceitar essa felicidade, de agradecer por essa felicidade, então ele realmente era aquilo que ele demonstrava ser e muito mais.
Claro que assim, vi meu pai triste algumas vezes na vida, sim vi, vi ele preocupado, vi ele nervoso. Isso é do ser humano, mas era impressionante a capacidade que ele tinha de agradecer pela vida e de tentar levar da maneira mais leve e alegre possível.
Ele tinha mesmo essa coisa, que muitas vezes, como você bem mencionou, ele demonstrava na maneira corporal, ele não era simplesmente um músico, um cantor, ele era um showman, ele dançava, ele mostrava a alegria dele através do sorriso e do corpo inteiro.
E além de ter aquele vozeirão que, na minha opinião, é claro que eu sou filho, eu sou um pouco suspeito para falar, mas falando como produtor musical, como admirador da música internacional, eu considero Jair Rodrigues como um dos maiores intérpretes de todos os tempos, porque foi um cara que não só se prendeu ao estilo que o lançou e com o qual ele sempre teve muita afinidade que foi o samba, mas também passeou com muita facilidade pelo sertanejo, pela música regional, pelo rap, pelo pop… Sempre foi um cara muito conectado.
E você mencionou aí também o documentário, que é um documentário lindo, feito pelo Rubens Rewald, um documentário chamado Deixa que digam que conta essa história de de Jair Rodrigues de uma maneira emocionante.
O Rubens, além de me convidar como um depoimentista, também me convidou para interpretar meu pai em algumas partes do documentário. E aí, é realmente o que você falou, eu, apesar de filho, de ter convivido com toda aquela energia, com aquela alegria corporal dele, na hora de fazer, eu sou um cara muito mais pra dentro, muito mais tímido. Na hora de interpretá-lo, foi um desafio.
Mas, ao mesmo tempo, acho que não só pela genética, mas pela convivência com meu pai eu acabei pegando muitas coisas dele, da maneira corporal, da maneira de falar, porque ele falava sempre com muito entusiasmo.
A casa inteira, na verdade, a cidade inteira ouvia, dele dando a entrevista porque ele falava com realmente muito entusiasmo.
Podemos dizer que, em alguma medida, ele foi um transgressor, certo? Porque ele rompeu com essa ideia de que ou você é sambista, ou você é sertanejo. Ainda mais pensando que era um homem negro, por tanto sofria das imposições de uma sociedade racista de limitar a atuação da população negra
Poxa, eu acho que a gente pode [dizer] sim, com certeza. Porque, ele teve uma bravura por ser um homem preto, vindo da situação rural. Ele nasceu no interior do Brasil, no interior de São Paulo, em Igarapava, quase Minas Gerais, numa fazenda de cana, onde minha avó, dona Conceição, trabalhava, e ele nasceu nessa situação bastante humilde, bastante precária.
Então só de ter conseguido o lugar de destaque que ele conseguiu na cultura nacional e internacional já é um ato de bravura.
E, ao mesmo tempo, acho que pelas opções musicais dele, de querer sempre trazer essa alegria, de trazer um interesse pela vida, pelas coisas boas.
Foi um cara que também sempre se preocupou em mostrar o lado bom das coisas, mas também tendo uma responsabilidade, que eu acho que o documentário mostra bem isso, que meu pai, apesar de não ter sido um cara militante na política, e nem nessas questões que hoje em dia que tem muita visibilidade, eu acho que com razão, a questão racial, a questão social, a questão político, financeira, enfim.
Lembrando que ele viveu ali num momento difícil, politicamente, do Brasil, passando pela ditadura militar e tudo. Ele sempre foi um cara que conversou muito bem com todas as opiniões, com todos os artistas que tinham opiniões diferentes e tal, mas, ao mesmo tempo, meu pai sempre glorificou muito o papel da cultura preta, o papel das religiões africanas.
Ele era católico, né, e acreditava muito em Jesus e tendo a sua fé. Mas ele cantava a cultura preta, sempre cantou, foi um dos primeiros a gravar também Festa Para um Rei Negro.
Ele sempre teve esse compromisso com a própria raiz, com a identidade. Então, não só para mim ou para minha família, mas ele foi um exemplo dessa postura, de exaltar a cultura preta e tal, mas fez isso sempre de uma maneira muito alegre, muito musical, sempre através das escolhas musicais dele, e eu acho que nisso ele também deixou um importante legado para todo mundo.
Tem alguns artistas que defendem que Jair Rodrigues foi precursor do rap no Brasil, você concorda?
É, 1964, né. A gente tá falando dessa canção [Deixa Isso Pra Lá] que, pra muita gente, é um dos primeiros raps da história. Porque tem uma parte falada, essa canção de Alberto Paes e Edson Menezes e que meu pai interpretou de maneira brilhante e marcante.
Eu acho que até pela alegria, pelo jeitão de Jair Rodrigues, acho que essa música não teria como cair em outro colo.
Então, chegou para ele ali em 1964, ele sempre me contava essa história, que essa música, quando ele apresentou para o Alfredo Borba, que era o produtor da gravadora, na época, o Alfredo Borba acho que não curtiu muito a música, até porque tinha essa novidade, essa diferença, né, de ser um samba, mas que na primeira parte do samba era meio falado, né e tal.
Meu pai conta que o Alfredo falou assim, "não, não, não, essa música aí, não, cara, procurou outra música". Aí ele [Jair Rodrigues] tinha uma outra música e foi pegar um vinil, para o Alfredo Borba ouvir a música. Mas meu pai tinha aquele jeito meio estabanado e derrubou o vinil e o vinil quebrou, então o Alfredo Borba disse assim: "então grava isso aí mesmo, a sua outra que você me trouxe." Acabou vindo a ser um tremendo sucesso,
Meu pai estava no começo da carreira. Foi o primeiro grande sucesso dele em 1964. E acabou ficando marcado, porque meu pai deu toda essa interpretação junto com o Alfredo.
Em uma apresentação ao vivo que ele fazia, porque naquela época olha só que coisa interessante, ele era crooner numa boate em São Paulo, se eu não me engano era Stardust, e quem tocava com ele era o pessoal do Quarteto Novo, e o Hermeto Pascoal era o pianista da boate e Jair Rodrigues era o cantor.
Olha que época gloriosa, né? Onde você ia num bar, numa boate e tava lá pra tocar pra você, enquanto você bebeu seu uísque, o Hermeto Pascoal e Jair Rodrigues. E num desses ensaios que eles estavam fazendo, meu pai chegou e foi mostrar [Deixa Isso Pra Lá] pro Hermeto, e o Hermeto. começou a acompanhá-lo e falou: "Jair, mas eu não sei acompanhar fala, não. Como é que faz isso aí? Eu não sei acompanhar, fala."
E pra mostrar o que ele poderia fazer, meu pai fez aquele movimento com a mão que hoje todo mundo conhece por conta da música, mas era para pegar no cabelo do Hermeto, que era um cabelão. Aí ele passou no cabelo do Hermeto e ali se criou essa coreografia que quando todo mundo ouve essa música, até hoje, mesmo quem não conhece a história de Jair Rodrigues, acaba fazendo aquele movimento pra cima e pra baixo com a mão.
Então eu acho que assim, se você afirmar que é um dos primeiros raps do Brasil, pelo menos, eu acho que não tá errado não, porque toda a revolução do movimento hip hop, que foi muito importante para o rap e tal, que surgiu no Bronx em Nova York, veio anos depois no final da década de 1970, se eu não me engano.
Hoje você tem sua carreira musical, atua principalmente como produtor, mas por anos trabalhou junto com seu pai. Para você é uma responsabilidade, uma obrigação ou um prazer seguir tocando o legado do seu pai?
Eu acho que ser filho de Jair Rodrigues é óbvio que você tem aí algumas questões. Até algumas responsabilidades, mas não posso jamais dizer que é um peso, jamais.
Ser filho de Jair Rodrigues é uma honra, é uma glória. E é uma leveza carregar esse legado, e mostrar isso também pras pessoas, pras novas gerações, então é uma delícia ser filho de Jair Rodrigues.
Eu não sinto esse peso, porque eu acho que o peso muitas vezes vem de quem observa, fala assim: "Ah, mas você não é o seu pai, mas a sua irmã não canta igual a você quem".
E eu acho isso uma tremenda bobagem, porque somos artistas diferentes com muita influência um do outro, porque eu também acabei produzindo cinco discos para o meu pai. Eu, como produtor, trabalhei com ele em cinco discos, dois dos quais foram indicados ao Grammy latino, o 500 Anos de Folia e um outro disco chamado Intérprete.
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Edição: Thalita Pires