Solidariedade

Comunidade palestina de Santana do Livramento mobiliza ajuda para atingidos no RS

Estado abriga a maior quantidade de comunidades palestinas em diáspora, segundo a Fepal

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Juventude palestina e comunidade árabe de Santana do Livramento mobilizaram ajuda para as vítimas das enchentes no RS - Kais Hussein

A comunidade palestina da cidade de Santana do Livramento (RS) se mobilizou para enviar mantimentos, roupas, mantas e itens de higiene pessoal para as cidades atingidas pela enchente no Rio Grande do Sul, estado do Brasil que abriga a maior quantidade de comunidades palestinas em diáspora, segundo a Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal). 

Água mineral, roupas, calçados, alimentos e itens de higiene pessoal foram arrecadados pela juventude palestina junto à comunidade árabe. A mesquita da cidade foi responsável por arrecadar os itens entregues para a prefeitura, que se encarregará de levar a ajuda até o posto de distribuição em Santa Maria (RS).

“Nós como palestinos sentimos o prazer de ajudar o povo gaúcho e qualquer povo no Brasil que estiver sofrendo ou passando por uma necessidade”, disse ao Brasil de Fato Kais Hussein, jornalista e jovem palestino da cidade. 

"Nós sabemos da dor e ela é forte. Lá em Gaza, na Cisjordânia, em todo o território palestino ocupado, nós sentimos essa dor há 75 anos e agora nesse exato momento, mais sete meses de genocídio."

Confira a entrevista:

Brasil de Fato: Como a comunidade palestina da cidade de Santana do Livramento organizou o envio de ajuda para os atingidos no estado? 

Kais Hussein: Essa foi uma iniciativa organizada pela juventude palestina da comunidade de Santana do Livramento. Desde o início da semana, a juventude se reuniu, discutiu e iniciou o trabalho de divulgação desta campanha de doação e começou a ir nos locais da comunidade árabe, como lojas, mesquitas e também ofícios para conversar com a comunidade para fazer o recolhimento dessas doações. Durante a semana, a comunidade árabe palestina de Santana do Livramento foi doando para a mesquita, que era o local de ponto de coleta, vários fardos de água, fardos de mantas e cobertores, fardos de meias, centenas de roupas e também galões de água, que era o que mais se necessitava, e produtos de higiene pessoal. Então a juventude organizou os fardos e marcou com um adesivo que esta doação era da comunidade palestina de Santana do Livramento para a população gaúcha afetada pelas enchentes. E nós entregamos para a prefeitura, que está enviando para um campo de distribuição em Santa Maria, que é o único local de mais fácil acesso para a distribuição dessas doações para os diversos municípios afetados.

Como tem sido articular essas ações de solidariedade enquanto muitas dessas pessoas têm familiares em Gaza que também precisam de auxílio?

Nós, como um povo sofrido, despejados forçadamente do nosso território; nós, povo palestino que somos da diáspora, muitos de nós que não podemos acessar o nosso próprio território, muitos refugiados e migrantes palestinos que tiveram que deixar as suas vidas para trás forçadamente, que perderam tudo: suas casas, sua dignidade... foram expulsos etnicamente, viram suas vidas, seus sonhos e suas esperanças sendo destruídos por uma força maior, que é a ocupação israelense... nós entendemos a dor da perda. E nada mais justo para o estado do Rio Grande do Sul e para a população gaúcha que nos acolheu aqui neste estado, e nos reconhece e nos respeita tão bem, que nós devemos fazer a nossa parte. É importante pra comunidade palestina fazer a sua parte solidária com a população gaúcha nesse exato momento. 

Torna-se mais fácil fazer doações para o nosso estado, onde estamos, do que para Gaza, que enfrenta diversos bloqueios pela ocupação israelense e nada chega lá dentro. Mas tentamos articular sempre, ajudando ambos. Doamos para a Palestina nesses mais de sete meses e continuaremos doando, e faremos o possível para ajudar a população gaúcha na medida e no nosso alcance. Nós como palestinos sentimos o prazer de ajudar o povo gaúcho e qualquer povo no Brasil que estiver sofrendo ou passando por uma necessidade. Essa é a coisa mais admirável na população palestina. É a resiliência, é a força de vontade, de se unir e de reconstruir um mundo melhor. É algo que eu enxergo muito em diversos gaúchos e gaúchas nesse estado. 

Qual é a relação da comunidade palestina com o estado do Rio Grande do Sul?

Muitas das pessoas palestinas que existem aqui no Rio Grande do Sul fazem parte da Cisjordânia. No meu caso, eu tenho amigos e amigas em Gaza, eu perdi contatos em Gaza por conta de bombardeios. Pessoas essas que se tornaram famílias minhas quando eu estive na Palestina. Nós palestinos não enxergamos o parentesco como se fosse o único para o cuidado com o nosso povo. Nós vemos o nosso povo como um todo. Somos todos irmãos e irmãs e nos preocupamos por todos e todas. Nós choramos pela perda de cada palestino, isso é importante. E a gente enxerga isso também na população gaúcha. A perda de nossos irmãos e irmãs, o sofrimento nos municípios dói em cada gaúcho e gaúcha tanto nos municípios não afetados, ou nas pessoas que conseguiram sobreviver e não tiveram as casas afetadas pelas enchentes. Nós sabemos da dor e ela é forte. Lá em Gaza, na Cisjordânia, em todo o território palestino ocupado, nós sentimos essa dor há 75 anos e agora nesse exato momento, mais sete meses de genocídio.

Edição: Raquel Setz