DESIGUALDADE SOCIAL

Ovos em vez de carne: por que a insegurança alimentar é maior no Norte do Brasil?

IBGE mostra que falta de acesso a alimentos é maior na região Norte, marcada por desigualdades sociais históricas

Brasil de Fato | Londrina (PR) |

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No interior da Amazônia, o déficit de infraestrutura para transporte de alimentos e a distância dos grandes centros são desafios recorrentes - Prefeitura de Manaus

A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua revelou que 27,6% dos domicílios brasileiros convivem com algum tipo de insegurança alimentar, a maioria nas regiões Norte e Nordeste do país. 

Os dados produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) representam uma queda da insegurança alimentar no Brasil de 9% em relação aos anos de 2017 e 2018, mas um aumento de 5% na comparação com 2013.

A região Norte concentra o maior índice de insegurança alimentar, com 39,7%, seguido pelo Nordeste, com 38,8%, Centro-Oeste (24,3%), Sudeste (23%) e Sul (16,6%).

Diferente da fome, a insegurança alimentar é uma condição em que as pessoas não têm acesso suficiente a alimentos em quantidade e qualidade adequadas, ou sentem ameaça de sofrer restrições alimentares no futuro próximo.

Lares chefiados por mulheres sofrem mais 

A Pnad Contínua também mostrou que o problema atinge com mais frequência domicílios chefiados por pessoas do sexo feminino. 59,4% dos lares brasileiros com insegurança alimentar são chefiados por mulheres, e 40,6% por homens.

Telma Quirino da Silva, moradora da periferia de Manaus (AM), enfrenta essa realidade diariamente. Aposentada com um salário mínimo comprometido por empréstimos consignados, ela divide o lar com a filha jovem, recentemente inserida no mercado de trabalho.

"Quando vou no mercado, tenho que escolher entre carne para o dia a dia ou outros produtos essenciais como arroz e itens de higiene. Optei por priorizar ovos, porque dá para fazer muita coisa com eles", contou Telma ao Brasil de Fato

Desigualdade histórica, avalia Rede Penssan

Segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), o índice mais alto na região Norte é explicado pela desigualdade social histórica no Brasil, que atinge com mais força essa parte do país.

"A visão romântica de uma região abundante em florestas e biodiversidade não reflete a realidade de abandono histórico enfrentado por essa população. As condições de vida das pessoas são mais precárias. Há populações relativamente isoladas, incluindo indígenas e quilombolas, muito relegados a uma situação de precariedade nos direitos sociais", explica a médica e pesquisadora da Rede Penssan, Ana Maria Segall.

A falta de acesso a alimentos é 3% maior na zona rural do que na urbana em todo o Brasil. No interior da Amazônia, o déficit de infraestrutura para transporte de alimentos e a distância dos grandes centros são desafios recorrentes.

"A floresta foi exposta a períodos de seca, onde os alimentos se tornam escassos e mais caros, seguidos por cheias que reproduzem o mesmo processo. As mudanças climáticas têm um enorme impacto nessa região, exigindo uma revisão e criação de políticas adequadas, avaliou Ana Maria Segall, da Rede Penssan. 

Edição: Matheus Alves de Almeida