Mais de 7500 crianças aguardam por uma vaga nos Centros Municipais de Educação Infantil (Cmeis), na rede municipal de Curitiba, em berçários e maternais.
Os dados que revelam este grande déficit foram divulgados em fevereiro deste ano pela própria Secretaria Municipal de Educação (SME), a pedido da Câmara Municipal. Um grande número de famílias vem tentando buscar solução via justiça, mas mães que moram na ocupação Vila União, no bairro Tatuquara, alegam dificuldades para acessar as informações e também preconceito.
Na comunidade Vila União, que reúne cerca de 200 famílias, de acordo com uma das coordenadoras, a professora Márcia Regina da Silva, são muitas as crianças que estão aguardando vagas nos Cmeis da região. Hoje, Curitiba tem 237 Cmeis, sendo que 24 estão na região do Tatuquara.
“São muitas famílias na comunidade que aguardam uma vaga. Algumas crianças foram contempladas, mas não no bairro onde vivem, o que acaba sendo difícil porque mal conseguem suprir as necessidades básicas, quanto mais pagar duas passagens por dia durante cinco dias. As mães já estão cansadas de ir ao conselho e ao núcleo de educação. Segundo o Estatuto da Criança, é dever do Estado, da família e da comunidade cuidar dos pequenos. Estamos fazendo nossa parte cobrando a quem compete, no entanto não estamos sendo atendidos,” diz.
Atualmente a única forma de tentar uma vaga é via cadastro online no site da SME. Nem toda a mãe moradora em ocupações, como a Vila União, tem acesso com facilidade à internet. Muitas não conseguem documentos como comprovante de residência, bem como ficam sem informações a respeito do processo da fila de espera.
Mãe de quatro filhos, a moradora da Vila União, Regiane Soares dos Santos, aguarda desde 2022 uma vaga para a filha menor de 4 anos e diz que sente dificuldades de entender porque anda não conseguiu a vaga.
“Estou atrás de vaga para minha menina desde 2022, fazendo cadastro online e não consegui. Já fui várias vezes no Cmei, eles falam pra fazer o cadastro e nada sabemos quando teremos a vaga, se fizemos certo. Agora, a gente fica sabendo que tem gente que não mora aqui e consegue vagas antes da minha", afirma.
Por não conseguir, teve que deixar o emprego para poder cuidar da filha. “Por isso, precisei sair do meu trabalho porque não tinha ninguém para cuidar dela porque como mãe fico preocupada. Como disse, não tenho dinheiro para pagar para alguém ficar com minha filha e eu preciso trabalhar. Por isso, a creche é tão importante para nós e para as crianças,” cita.
Preconceito
Para Regiane, além das dificuldades para obter informações sobre o processo do cadastro, ela acredita que exista preconceito com as famílias de áreas de ocupação. “Toda hora vou lá tentar entender porque nunca tem vaga para minha filha. No final, acho que tem preconceito porque moramos em comunidade. Tem gente que nem precisa trabalhar, tem vaga lá,” diz.
Outra moradora da comunidade, Paola Ferreira Silva, também aguarda há meses uma vaga para seu filho de dois anos em algum Cmei da região. “Já fui ao núcleo três vezes e só o que falam para mim é que não podem fazer nada. São meses indo e voltando sem nenhuma esperança,” conta.
Sistema excludente
Juliana Mildemberg, presidente do Sindicato dos Servidores Públicos Municipais de Curitiba (Sismuc), diz que o modelo todo de inscrição para vagas é excludente.
“O sistema de cadastro, que a prefeitura utiliza pede comprovante de residência e muitas dessas famílias não têm. Então, isso faz com que elas estejam sendo excluídas e não tem essa informação. É diferente do cadastro que acontece no CRAS, por exemplo, do Cadastro Único. As pessoas podem utilizar e colocar lá o seu endereço,” cita.
A sindicalista diz que o sindicato tem reivindicado a solução deste problema com a construção de mais unidades. “A gestão Greca/ Pimentel não abre uma vaga real para essas crianças que estão na lista de espera. Falta uma política da prefeitura municipal voltada à construção de mais unidades, a fim de garantir que as mais de sete mil crianças sejam contempladas com a vaga próxima à sua residência preferencialmente. A prefeitura hoje precisaria de no mínimo mais 30 Cmeis espalhados pela cidade e não há nenhuma sinalização por parte da prefeitura de abrir mais unidades,” diz.
Regiane Soares dos Santos aguarda desde 2022 uma vaga para a filha menor de 4 anos / Arquivo pessoal
O que diz a prefeitura:
Em nota, a assessoria da SME, diz que “a gestão do prefeito Rafael Greca abriu, nos últimos sete anos, 11 mil novas vagas em creches de Curitiba. Desde 2017, a Prefeitura da capital, através da Secretaria Municipal de Educação, tem realizado diversas estratégias para ampliar o atendimento na educação infantil, com a abertura de 32 novos CMEIs, totalizando hoje 237 unidades, e contratação de mais CEIs (o número passou de 90 para 159). Com isso, o número de vagas subiu de 45 mil para mais de 56 mil. A Secretaria Municipal da Educação esclarece que as crianças são contempladas respeitando os critérios de prioridade, como casos de vulnerabilidade
Vale lembrar que a fila para novas vagas nos CMEIs e CEIs é dinâmica, pois ao mesmo tempo que o município abre novas vagas para suprir a demanda em determinado ano, mais crianças são cadastradas no sistema pelos país.”