Dissidência das Farc

Crise com guerrilha faz Petro mudar comando militar e criar Conselho de Segurança na Colômbia

Novo comandante foi escolhido por conhecer estado em conflito; presidente colombiano disse que situação é inaceitável'

Brasil de Fato | Caracas (Venezuela) |
Para especialista, medida de Gustavo Petro "trava" negociações com o EMC - Presidencia Colombia

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, determinou nesta segunda-feira (20) a troca no comando do Exército do país e a instalação de um Conselho de Segurança permanente no Estado de Cauca. As medidas foram tomadas depois de dois ataques no sudoeste do país. Segundo o governo, nove pessoas ficaram feridas e dois policiais morreram em ações do grupo Estado Maior Central (EMC), grupo dissidente das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC).

O novo comandante do Exército será Luis Emilio Cardozo. Ele havia ido para a reserva na reforma nas Forças Armadas realizada por Petro logo depois de tomar posse, em agosto de 2022. Na ocasião, mais de 40 integrantes do alto escalão das Forças Armadas foram para a reserva. Agora, ele substituirá Luis Mauricio Ospina, que estava no cargo.

Para o pesquisador colombiano do paramilitarismo Leonardo Luna Alzate, a troca do comando é uma estratégia do governo na região por colocar um nome que não só conhece bem as Forças Armadas, como também o território em disputa.

“O general Cardozo foi por mais 35 anos integrante das Forças Armadas e tem experiência em todos os setores da Aeronáutica e do Exército. Mas o fator determinante para a escolha dele é que ele nasceu na região, em Valle de Cauca, e conhece o território e a situação desse Estado”, disse ao Brasil de Fato

De acordo com o pesquisador, é importante que o comandante de uma operação como essa conheça o estado porque Cauca tem uma presença muito forte não só do grupo armado como também do grupo paramilitar Clã de Golfo. “Há uma forte tensão entre esses grupos e o governo na região. As negociações são muito importantes em Cauca por ter uma forte atuação desses grupos”, afirmou.

A troca no comando do Exército também ocorreu por uma série de crises causadas pelo comandante destituído Luis Mauricio Ospina. Segundo jornais colombianos, ele teria usado a inteligência colombiana para investigar o professor de inglês de sua esposa. Ele também foi questionado pela atuação de 10 militares em Tierralta e Córdoba, que ameaçaram uma série de produtores agrícolas da região com tortura e abusos sexuais.  

Entenda

O EMC tinha um acordo de cessar-fogo com o governo desde outubro de 2023. Em janeiro, as duas partes prorrogaram a trégua até 15 de julho. Após negociações realizadas em março em San José del Guaviare, o governo e o EMC se comprometeram a continuar as discussões e a avaliar e monitorar se as regras estabelecidas para o cessar-fogo estão sendo cumpridas. O acordo também estabelece uma comunicação permanente para evitar confrontos.

O governo colombiano também determinou que toda a alta cúpula das Forças Armadas e o ministro da Defesa, Iván Velásquez, estejam na região para acompanhar de perto a situação por meio de um Conselho de Segurança permanente. 

O presidente, Gustavo Petro, disse que a situação na região é “inaceitável” e anunciou pelas redes sociais a instalação do Conselho de Segurança.

“Não vamos tolerar que continuem a aterrorizar a população com ataques terroristas. Pedi ao ministro da Defesa que se deslocasse imediatamente com toda a liderança militar para Cauca e estabelecesse um conselho de segurança permanente”, disse em seu perfil na rede social X.

Para Alzate, as medidas do governo e a escalada de violência torna muito difícil o avanço dessas negociações por paz.

“Basicamente em primeira instância isso trava as negociações com o EMC e paralisa, ao menos de forma temporária, o cessar-fogo no território de Cauca. É um momento em que o EMC tenta retomar à força o controle territorial da região e coloca em xeque o processo de paz”, afirmou.

Segundo ele, é preciso considerar outros fatores para o processo de negociação. Primeiro, a legitimidade social do EMC no território. Para Alzate, a percepção da população sobre o grupo tem mudado depois de episódios envolvendo comunidades indígenas.

“Uma coisa é a vontade política do governo e do EMC e outra coisa é a legitimidade social para as negociações. O EMC ainda tem uma legitimidade social, mas em queda porque movimentos e comunidades indígenas começaram a denunciar o grupo como um ator paramilitar. As Farc não tinham tanto esse problema, porque tinham uma legitimidade social e um controle maior. Isso pode ser determinante nas negociações”, afirmou.

Alzate afirma também que o governo também precisa considerar o potencial militar do grupo, que ainda tem forte atuação na região.

Diálogos de paz

O presidente Gustavo Petro tem avançado nos diálogos de paz com grupos guerrilheiros, em especial com o Exército de Libertação Nacional (ELN).

Um dos trunfos para isso é a posição de Gustavo Petro na resolução desses conflitos. O diálogo permanente com os grupos armados é uma das políticas implementadas pelo colombiano desde o início do seu mandato em 2022. O presidente tornou oficial a busca pela paz ao transformar a ideia em política de Estado a partir da aprovação da lei 418, que firma o compromisso do Estado colombiano em manter contato para negociar o fim dos confrontos entre esses grupos.

As negociações com o EMC se somam a outras mesas de diálogos estabelecidas pelo governo. Até agora, o Estado conseguiu abrir diálogos com o Exército de Libertação Nacional (ELN) e com a Segunda Marquetalia, também surgido de dissidências das Farc.

Edição: Rodrigo Durão Coelho