Durante cinco dias, Walter Kiner Júnior foi dado como desaparecido. Ele, a esposa e a filha de 14 anos ficaram ilhados em casa após as enchentes que inundaram o bairro Mathias Velho na cidade de Canoas, região Metropolitana de Porto Alegre. O escritor, que também é ativista ambiental, mora na cidade há 46 anos e nunca havia vivido situação semelhante.
Confiando na orientação da prefeitura, Walter acreditou que a inundação não alcançaria o segundo pavimento da sua casa e por isso decidiu permanecer por lá com a sua família. "Mas a água só subia, só subia. A energia acabou e eu fiquei sem celular e assim ficamos cinco dias sem contato com ninguém", relata.
Após o tumulto dos resgates emergenciais, os amigos de Walter sentiram sua falta e então acionaram as equipes de busca que realizaram o resgate da família. "Foi uma reviravolta na nossa vida, praticamente a metade da cidade foi devastada e teve que ir para o outro lado e agora estamos todos vivendo em um espaço minúsculo", desabafa.
"Para chegar a esse ponto, antes aconteceu um crime ambiental. É uma crise ambiental resultado das ações humanas, que só pensam em ganhar dinheiro, explorar a natureza", completa.
Seja descascando os legumes ou ajudando no descarregamento das doações, o escritor tem contribuído em diversas tarefas na cozinha. Para ele, a solidariedade nesse momento é algo fundamental e que também pode contribuir para a conscientização sobre a situação enfrentada. "Em outubro a gente tem que se lembrar quem contribuiu para chegarmos a esse ponto e quem esteve ao nosso lado no momento de crise", reforça.
Moradora do mesmo bairro, a cuidadora de idosos Patrícia Menezes é outra atingida voluntária na Cozinha Solidária de Canoas. Ela foi resgatada pelos amigos antes de as águas invadirem completamente a sua casa. Desde então, o trabalho voluntário têm sido uma terapia para encarar o momento.
"O pessoal me pergunta: você não vai procurar um emprego para tentar retomar a sua vida? Gente, eu não consigo. Nesse momento a única coisa que faz sentido para mim é estar aqui na cozinha, ajudando neste trabalho voluntário. Eu não posso parar, porque o choro vem todos os dias", explica.
Além do preparo dos alimentos, Patrícia também contribui com a alegria do ambiente. Nas horas vagas, ela canta em diversos bares de Porto Alegre e com o seu vozerão contagia a cozinha de Canoas. Durante este período, a cantora também se apresentou de forma voluntária na Universidade Luterana do Brasil (Ulbra), onde está localizado o maior abrigo de Canoas, que aloja cerca de seis mil pessoas.
"Eu fiquei muito feliz, foi muito bom cantar um pouquinho. É uma terapia para mim e acredito que também foi bom para eles", conta sorridente.
À frente do Sindicato dos Petroleiros do Rio Grande do Sul (Sindipetro-RS), Miriam Cabreira também é uma das atingidas pelas enchentes. "Eu estou na casa de amigos da minha sogra para ajudar a acompanhar a saúde dela, minha filha está na casa de amigas para conseguir assistir a aula que está sendo remota e meu marido tem ido todos os dias para ver como está a casa", conta.
"Eu agradeço muito por ter essa rede de apoio porque só com ela é que é possível estar a frente do Sindipetro ajudando a construir essa iniciativa tão importante para a população neste momento", agradece.
Entre as preocupações com a casa, que segue inundada, e a cozinha, a dirigente não tem medido esforços para construir e manter a iniciativa. "Nós mobilizamos entidades parceiras, como a Transpetro e reorganizamos nossa sede para abrigar a cozinha solidária. Com os movimentos sociais conseguimos colocar a cozinha em operação", relata.
Seja voluntário
Se você é de Canoas ou região, pode se inscrever para atuar como voluntário na produção da cozinha, nas tele-entregas ou na limpeza do espaço. Mas se você está fora da região, pode contribuir com qualquer quantia no Pix da campanha que subsidia a compra de equipamentos e alimentos para a cozinha: 73316457/0001-83.
* Jornalista do MAB
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Marcelo Ferreira