Para revertermos isso, é preciso que haja um grande empenho do governo e da sociedade como um todo
Instituída em 2009, a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) ainda não conseguiu ser implementada na totalidade dos municípios brasileiros. Ela reconhece que o racismo e as desigualdades étnico-raciais são determinantes para as condições de saúde e traz ações para combater essa realidade.
Dados de 2019 apontam que, na ocasião, menos de 30% das cidades brasileiras haviam colocado em prática aspectos do PNSIPN. Apenas 3% criaram órgãos para acompanhar e monitorar a implementação da política. O desfinanciamento e desmonte de programas sociais entre os anos de 2016 e 2021 indicam que essa realidade pode ter se tornado ainda mais crítica.
"Dentro desse balanço dos 15 anos da política, vimos que, a partir de 2016, entra Michel Temer (MDB), que nada faz para levar em consideração e ter responsabilidade com os programas e as políticas de melhoria da qualidade de vida das populações. Em seguida, o desastre do presidente Jair Bolsonaro (PL), que só fez aprofundar a desigualdade. É claro que a implementação dessa política ficou parada", afirma Edna Araújo, especialista em saúde pública.
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Em conversa com o podcast Repórter SUS, a professora da Universidade Estadual de Feira de Santana e membro do GT Racismo e Saúde da Associação Brasileira de Saúde ressalta que o governo atual tem demonstrado vontade política de reverter o cenário.
Há cerca de um mês, a gestão federal instituiu o Comitê Técnico Interministerial de Saúde da População Negra no Ministério da Saúde, em parceria com as pastas da Igualdade Racial e dos Direitos Humanos e Cidadania. O objetivo é gerir e avaliar ações de prevenção, promoção e atenção à saúde da população negra dentro do Sistema Único de Saúde (SUS)
Uma das tarefas do órgão é justamente apoiar a implementação dos comitês técnicos nos estados e municípios para que as ações da PNSIPN sejam colocadas em prática. O grupo conta com representantes de movimentos sociais e populares.
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Edna Araújo explica que a participação da sociedade civil é uma premissa essencial para que o país finalmente consiga implementar políticas de saúde que combatam a desigualdade de acesso e atendimento. "Não é uma política que foi criada pelo governo, é uma política que foi criada, pressionada e tensionada a acontecer pelos movimentos sociais."
De acordo com a especialista, a falta de equidade no acesso já era diagnosticada historicamente por essas organizações. "O movimento negro e vários outros movimentos, pesquisadores, intelectuais, teóricos acompanhavam há muito tempo a situação de vida e de saúde da população e viram o quanto a falta de acesso aos direitos, o tratamento desigual, a discriminação e o racismo fazem com que nós tenhamos dois países diferentes. O dos brancos, com indicadores elevados e o dos pretos, indígenas e pobres, com indicadores muito baixos."
Ela pontua também que os avanços alcançados até agora, embora tímidos, são fruto direto da pressão dos movimentos e cita como exemplo o aumento de consultas entre mulheres negras. Edna Araújo salienta que, além da participação social, a implementação total da pesquisa também vai depender de ações que envolvam todas as instâncias da sociedade e do poder público.
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"O racismo está em toda a sociedade e afeta todas as áreas de conhecimento. Para ter saúde é preciso ter habitação, escola, alimentação, condições básicas de sobrevivência. Quem não tem acesso a isso são as populações que estão nessa situação de desigualdade em nosso país. Para revertermos isso, é preciso que haja um grande empenho do governo e da sociedade como um todo para essa desconstrução."
*O Repórter SUS é uma parceria entre o Brasil de Fato e a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz).
Edição: Thalita Pires