A Justiça chilena ordenou nesta segunda-feira (3) a prisão preventiva, por supostos crimes de corrupção, de Daniel Jadue, ex-candidato presidencial e uma das maiores figuras do Partido Comunista, que faz parte da coalizão do governo.
Prefeito do município de Recoleta, Jadue foi acusado de suborno, administração desleal, fraude fiscal e fraude na gestão das chamadas “Farmácias Populares”, que ele promoveu como alternativa de baixo custo às redes comerciais.
Segundo a juíza Paulina Moya, que pediu a prisão conforme solicitado pelo Ministério Público, a liberdade de Jadue seria “perigosa para a segurança da sociedade”. “Julgam-me por nossa gestão transformadora. (...) Vamos recorrer desta medida desproporcional!”, reagiu ele na rede social X. Sua defesa alega que o caso configura perseguição política.
Apesar de seu partido integrar o governo, o prefeito é um forte crítico do presidente Gabriel Boric, que o derrotou em uma eleição primária em julho de 2021.
O Foro de São Paulo, que reúne partidos e grupos de esquerda na região, expressou seu apoio a Jadue e disse que a guerra judicial “é uma prática que pune os projetos emancipadores e que colocam no centro a transformação do neoliberalismo que violenta os povos”.
Juristas denunciam lawfare
A Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) foi uma das organizações signatárias da Carta de Apoio ao Companheiro Daniel Jadue, que afirma que o prefeito chileno é vítima de uma perseguição judicial politicamente motivada.
"Aqueles que tiveram seus interesses ameaçados começaram uma intensa campanha difamatória contra Daniel Jadue. Assim como ocorreu no Brasil, o lawfare se propaga no Chile como método para inviabilizar lideranças democráticas", diz nota da ABJD.
A associação de juristas aponta Jardue está sendo vítima dessa prática por desafiar as estruturas do poder em seu país e destaca a experiência progressista promovida por ele à frente da gestão municipal.
"A experiência de Recoleta demonstrou que outro Chile é possível. Farmácias populares, óticas populares, livraria popular, imobiliária popular, escola e universidade abertas compõem um ecossistema que rompeu com a lógica de mercantilização da vida materializada pela Constituição de Pinochet, de 1980", diz nota.
Leia a íntegra da Carta de Apoio a Daniel Jadue
A guerra judicial, ou Lawfare, é uma prática que assola projetos emancipatórios e coloca no centro a transformação do neoliberalismo que empobrece e violenta os povos. As elites nacionais, regionais e globais, e defensoras dos interesses do capital financeiro internacional, passaram anos lutando contra políticas sociais destinadas a erradicar a pobreza e reduzir profundas desigualdades sociais, usando suas defesas corporativas como pretexto para atacar projetos e líderes legitimamente eleitos pelo voto popular.
Assim, os derrotados nas urnas procuram impor seus interesses sobre a soberania popular: criminalizando e destruindo a política, condenando por meio da mídia hegemônica antes mesmo de submeter o caso a juízo imparcial, violando o princípio do devido processo legal e as garantias constitucionais do acusado. O método é idêntico em todos os lugares: uma parte da imprensa politicamente envolvida cria o fato e o divulga amplamente (uma mentira que dita mil vezes acaba virando “verdade”); com base exclusivamente nessas notícias forjadas, abre-se uma investigação que visa sustentar a tese jornalística já disseminada, e não buscara verdade. Com isso, se criam as condições para a morte jurídica e política do adversário (visto que atualmente não se mostra adequada sua destruição física).
Vemos com preocupação a perseguição midiática, judicial e política de Daniel Jadue, sobretudo pelo que ele representa: um projeto de democratização e protagonismo popular que melhorou substancialmente a vida de milhares de famílias chilenas, gerando uma referência nacional e internacional no que respeita aos governos locais.
Com espanto, vimos como ele foi ameaçado para não sair do país, sem que houvesse decisão judicial ou sequer um processo, mas apenas as notícias da imprensa hegemônica. Como apontou a Comissão Chilena de Direitos Humanos, esse procedimento é questionável do ponto de vista jurídico. Mais uma vez, aqueles que deveriam zelosamente perseguir a objetividade da investigação, revelam que o motor de suas ações é a proscrição de líderes, fechando a porta na cara de nossas democracias já enfermas.
Tirar do caminho lideranças políticas populares e profundamente incômodas ao status quo é a garantia que aqueles que estão no topo precisam para propiciar a eleição de candidaturas sujeitas aos interesses do mercado, que ignoram a população, especialmente os mais pobres.
Face ao exposto, tornamos público o nosso apelo a toda a comunidade internacional, aos movimentos sociais, às militâncias populares e a todos os democratas do mundo, para que acusem o recebimento deste alerta democrático e impeçam o caminho da proscrição, não apenas das lideranças políticas, mas do Estado de Direito.
Assinam em 28 de maio:
- Rede Lawfare Nunca Mais
- Associaçao Brasileira de Juristas pela Democracia - ABJD
- Coletivo por Um Ministério Público Transformador - TRANSFORMA MP
- Serviço Paz e Justiça SERPAJ Brasil - Órgão Consultivo das Nações Unidas
- Associação Latino-americana de Juízes do Trabalho - ALJT
- ?Associação Nacional dos Ex-Diretores, Ex-Conselheiros e Ex-Empregados das Entidades Fechadas de Previdência Complementar - ANAPEX
*Com AFP
Edição: Leandro Melito