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ONU: cheias no Rio Grande do Sul geraram mais lixo do que a guerra em Gaza

Estimam-se 47 milhões de toneladas de resíduos gerados pelas enchentes; coletores e garis trabalham sem parar

Brasil de Fato | Porto Alegre (RS) |
Cerca de mil pessoas, entre garis e voluntários, trabalham na limpeza das ruas de Porto Alegre - Jorge Leão

Não são muitos. Perto de mil, ou um pouco mais, entre garis e voluntários estão ajudando a limpar as ruas da capital gaúcha. Para muitos, eles são os verdadeiros heróis desta tragédia que afeta Porto Alegre, região metropolitana e dezenas de outras cidades. São os coletores de lixo e os garis. Suportando tudo, a própria pobreza salarial e as péssimas condições em que vivem. Estão espalhados em vários bairros, recolhendo lixo orgânico, descartes de todos os tipos, material pesado, leve, enfrentando perigos, como vidros quebrados, pregos e outros materiais. Colocam a mão em esgotos, bueiros, lidam com todos os dejetos dos seres humanos e animais.

As pessoas afetadas seriamente pela enchente foram orientadas pela prefeitura a descartar na rua móveis e utensílios domésticos estragados. Além de ser uma ideia infeliz – poderia ter outra melhor, sem dúvida –, causou um trabalho a mais para coletores e garis. Mas qual a diferença entre eles? O coletor cuida da coleta do lixo doméstico. O gari cuida da limpeza e retirada de lixo das vias públicas. E o lixeiro busca no lixo objetos e materiais que possa reciclar ou reutilizar para ganhar a vida, ao revendê-los para centrais de reciclagem.

Todos são verdadeiros heróis na luta pela sobrevivência. Alguém sabe do drama deles? Onde moram, se estão alagados, se perderam tudo com a força das águas? Pouca gente tentou saber. A mídia corporativa deu um destaque mínimo. Deveriam merecer, na minha opinião, tanto destaque quanto os voluntários dos abrigos. Nada disso está acontecendo. Muito ao contrário. 


As cheias no Sul geraram aproximadamente 47 milhões de toneladas de lixo, segundo estimativa da ONU / Jorge Leão

Nem sei se ganham as marmitas que são distribuídas aos flagelados. Mereciam. Garrafas de água potável. Também não sei. Vemos, por aí, estes trabalhadores com seus tradicionais uniformes laranjas – para garantir visibilidade no confronto com os automóveis – sempre sujos, sem conforto para o trabalho e com pouca roupa e capas resistentes para enfrentar frio e chuvas como a desta segunda-feira (3).

Lixo acumulado é um negócio delicado para o ambiente e para as pessoas. Produz um número gigantesco de insetos, ratos, baratas, urinas e fezes de bichos, tudo isso acumulado com o esgoto que está vazando para as ruas, causando doenças para as pessoas e agredindo a natureza. Pois é, no meio de tanta sujeira, lá estão eles, colocando a sua energia para deixar a limpeza da cidade em ordem. Claro que eles reclamam da vida, mas, como disse Alexsandro Dias Capela Júnior, 21 anos, ao programa Fantástico: “É o que temos para o momento e não adianta querer folgar agora, estamos trabalhando de segunda a segunda”.

A Rede de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas (ONU) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambientes (Pnuma) calculam que as enchentes no Rio Grande do Sul vão gerar 47 milhões de toneladas de lixo. O estudo aponta que a quantidade é superior ao que já foi recolhido na guerra na Faixa de Gaza – conflito começou em 7 de outubro do ano passado. São prédios e mais prédios destruídos por bombardeios, além de todo o resto. É um absurdo. Para variar, o grande problema é saber exatamente para onde vai todo este material. O de Porto Alegre vai para Gravataí. O restante dos municípios ainda procura alternativas.


Ruas do centro da capital gaúcha ainda acumulam lixo após um mês do forte temporal que atingiu a cidade / Jorge Leão

Como é o trabalho na capital

A força-tarefa da prefeitura de Porto Alegre, por exemplo, para limpar a cidade após a enchente chegou a 18 locais nesta segunda-feira (3). As equipes do Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) atuam nos trechos onde a água baixou. Desde 6 de maio, quando a limpeza começou a ser feita nos pontos de resgate, até a noite de domingo (2), foram retiradas 27.718 toneladas de resíduos das ruas, como restos de móveis estragados, raspagem de lodo acumulado e varrição.

Em áreas inundadas, o DMLU precisa aguardar que a água recue para dar início ao serviço. Cerca de 800 garis das seções Centro, Extremo-Sul, Norte, Sul e Leste estão atuando nos serviços de limpeza dos bairros mais afetados pela cheia do Guaíba. Os trabalhadores são auxiliados por mais de 300 equipamentos entre caminhões e retroescavadeiras. Os serviços são coordenados pela Secretaria Municipal de Serviços Urbanos (Smsurb).

Moradores e empresas podem fazer o descarte de resíduos pós-enchente em algum dos pontos bota-espera. São áreas próximas das regiões inundadas, onde o DMLU descarrega os materiais recolhidos. Depois, os resíduos serão direcionados para o aterro de inertes em Gravataí. 

Confira pontos de bota-espera abaixo: 

- Terreno ao lado da Receita Federal - avenida Loureiro da Silva, 678 - Centro Histórico - 8h às 22h;
- Terreno ao lado do Dmae – avenida Loureiro da Silva, 104 - Centro Histórico - 8h às 18h;
- Terreno na Serraria - avenida da Serraria, 2517 - 8h às 18h;
- Terreno no Humaitá – rua Voluntários da Pátria, 314 - 8h às 18h;
- Terreno no São Geraldo – avenida Cairú esquina com rua Voluntários da Pátria - 8h às 18h.

* Eugênio Bortolon é jornalista.

** Este é um artigo de opinião e não necessariamente expressa a linha editorial do Brasil de Fato.

Fonte: BdF Rio Grande do Sul

Edição: Katia Marko