Eleita no domingo (2) por ampla vantagem – mais de 30 pontos percentuais – a progressista Claudia Sheinbaum deve manter, como presidenta mexicana, a boa relação com o próximo presidente dos Estados Unidos. Para analistas políticos do México ouvidos pelo Brasil de Fato, a dinâmica positiva estabelecida pelo atual mandatário, Andrés Manuel López Obrador (AMLO), deve prosseguir, seja Joe Biden ou Donald Trump o eleito no final deste ano.
"Claudia Sheinbaum é uma política que propôs a continuidade do governo de López Obrador, que já teve um relacionamento com os governos de Trump e Biden", disse José Ignácio de Alba, comentarista político no país.
"De fato [AMLO] foi o presidente mexicano foi o que mais viajou para os Estados Unidos, embora, é preciso dizer, ele não tenha feito muitas viagens ao exterior."
Opinião semelhante tem Zósimo Camacho, também analista político, que diz acreditar que "não haverá haver muitas mudanças na própria política externa, seja Trump, seja Biden".
"Os Estados Unidos dependem do México, mais do que se costuma dizer. Este ano o México se tornou o maior exportador de mercadorias para os Estados Unidos, ultrapassando a China. As relações econômicas entre os dois países são muito fortes, acima dos altos e baixos políticos", afirma ele.
José Ignácio minimiza ainda um dos pontos explorados por Trump, o muro construído na fronteira entre os dois países – mais de três mil quilômetros – que em tese deveria impedir a entrada nos EUA de imigrantes ilegais.
"Quando Trump propôs a construção de um muro entre os dois países, foi engraçado. Porque, na realidade, já existe um muro, que Bill Clinton começou a construir na década de 1990", afirma. Para José Ignácio, "as ameaças de Trump parecem repercutir apenas em seus eleitores ingênuos".
Para ele, o atual presidente conseguiu aliar uma bem sucedida política de contenção da migração ao vizinho rico e, ao mesmo tempo, com um "tratamento humano dos migrantes."
Sobre uma possível repercussão da eleição de Sheinbaum no pleito estadunidense de novembro, Zósimo diz que é possível que eleitores imigrantes se sintam mais "empoderados" e cobrem posições menos hostis dos candidatos.
"O que aconteceu foi um empoderamento de grande parte do eleitorado mexicano que se sentia excluído. Daqueles que têm o direito de votar, de votar em opções que favorecem a comunidade mexicana e latino-americana e que eles punam os candidatos que procuram gerar um clima adverso para a migração e para as pessoas de minorias que também são importantes latino-americanos e particularmente mexicanos."
O México com o resto do continente
Em relação ao Sul Global, pode-se esperar que o México adote posições mais alinhadas com países em desenvolvimento, uma postura que conteste os poderes hegemônicos? Zósimo diz o governo de AMLO já mostrou "uma atitude de maior independência em comparação com outros governos neoliberais anteriores no México".
"Contudo, não se separa completamente desta tutela de que os Estados Unidos governam a América do Norte. Já vimos as limitações do governo mexicano durante o mandato de Obrador, que não acompanhou ideias de outros governos progressistas na América Latina, na América do Sul, como o de gerar um tratado comercial entre essas nações do Sul."
"Acredito que o México terá laços de amizade mais fortes do que os atualmente conhecidos com a América Latina, com a América do Sul e com outros países do Sul global. Porém, como vemos, não sacrificará estas relações pela relação comercial que é considerada estratégica com os Estados Unidos", afirma ele.
José Ignácio concorda, lembrando que "o México distanciou-se da América do Sul desde a década de 1990; o neoliberalismo alinhou-nos com os interesses dos Estados Unidos".
"Entretanto, no governo de López Obrador houve um interesse renovado em se aproximar do sul. A relação com Cuba ressurgiu, com o México solicitando em diversos fóruns que as sanções económicas fossem retiradas da ilha."
"Também tem havido um bom relacionamento com a Bolívia, Alberto Arce visitou o México algumas vezes. Honduras também se tornou mais próxima. Mas é verdade que os Estados Unidos modificaram a relação do México com o resto do continente", conclui.
Edição: Thalita Pires