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'Não podemos retroceder em conquistas que vêm das bisavós', afirma Benedita da Silva sobre PL da Gravidez Infantil

Há 40 anos na vida política, deputada é evangélica, mas afirma que tema não tem a ver com legalização ou não do aborto

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Cotada para ser relatora do projeto, a parlamentar acredita que diálogo vai impedir o avanço do PL no Congresso - Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
As mulheres que votaram em nós querem respostas, sejam elas religiosas ou não

A deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) considera o PL 1904/2014 um retrocesso constitucional. O projeto de lei que equipara aborto a homicídio simples ganhou ritmo de urgência na semana passada, na Câmara dos Deputados, o que pode acelerar a votação da proposta.

Evangélica e líder da Bancada Feminina na Câmara, Benedita da Silva afirmou ao programa Bem Viver desta segunda-feira (17) que, como liderança do grupo, deverá discutir com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), a proposta. Ela é cotada por Lira para ser relatora do PL por seu tom 'moderado'. 

"O que nós queremos é que qualquer que seja a relatora, que ela possa ter total condição de fazer esse debate, de conversar com as mulheres e não é só nós, mulheres parlamentares. Mas nós não chegamos sozinhas com o nosso voto. Nós conhecemos mulheres, muitas mulheres, que votaram em nós e essas mulheres querem respostas, sejam elas religiosas ou não".

A parlamentar, que já tem 40 anos de vida política, criticou a forma que o tema vem sendo tratado, segundo ela, com "gritaria" e impedindo o diálogo. 

"Nós debatermos esse assunto olhando e vendo que a gente não tem condição de aprovar um projeto da forma que ele está, porque ele traz um retrocesso muito grande, e a gente sabe que criança não é para engravidar", argumenta, fazendo referência ao apelido que a proposta recebeu por movimentos feministas de PL da Gravidez Infantil. 

O projeto prevê penas de até 20 anos de prisão para pessoas que realizarem abortos após 22 semanas de gestação, situação que ocorre majoritariamente com crianças abusadas sexualmente. Ao longo da última semana, em especial no final de semana, grupos se manifestaram em cidades pelo país contra a proposta. 

'Respeito pelo direito da mulher decidir'

O aborto é um tema recorrente na vida de Benedita da Silva, que, em 1987, se elegeu para o primeiro mandato na Câmara dos Deputados, em Brasília. Foi justamente neste ano, em 8 de fevereiro, que ela se manifestou sobre o aborto em entrevista ao Correio Braziliense.

"A questão do aborto é muito complexa. O problema não é ser a favor ou contra, mas ter percepção e sensibilidade para superar sua gravidade, além de respeito pelo direito da mulher decidir. Quando uma doméstica aborta, ela o faz não porque quer, mas porque precisa, pois sabe que com um filho pequeno nos braços, dificilmente arrumará um emprego", afirmou a deputada na época.

Em 2023, a parlamentar iniciou seu terceiro mandato consecutivo na Câmara dos Deputados, onde também já esteve entre 1987 e 1994. Ela foi vice-governadora do Rio entre 1999 e 2002 e, depois, assumiu como governadora até 2003.

Na entrevista ao Brasil de Fato, a parlamentar também comentou que o PT ainda não tem posicionamento sobre a proposta que criminaliza o usuário de drogas. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/23, foi apresentada no Senado e agora tramita na Câmara.

Por fim, Benedita da Silva comentou ainda sobre os primeiros meses da Bancada Negra, criada em novembro passado, um feito inédito no Congresso brasileiro.

Confira a entrevista na íntegra

Como a senhora recebeu esse projeto de lei, deputada?

Olha, eu quero lhe dizer é que a minha interpretação não é uma interpretação individual somente. Eu sou coordenadora da Bancada Feminina e já tinha colocado que não há consenso na bancada quanto ao retrocesso que o projeto traz.

E que nós teríamos que fazer um grande seminário e aí convidar todos os lados para fazer uma conversa de verdade, em que fossem ouvidos, não com aquela gritaria de tribuna, que gritam, gritam, gritam e a gente fica impedido de fazer um diálogo.

Então esse é o propósito da Secretaria da Mulher. Nós debatemos esse assunto olhando e vendo que a gente não tem condição de aprovar um projeto da forma que ele está, porque ele traz um retrocesso muito grande, e a gente sabe que criança não é para engravidar. 

A gente sabe também que tem a gravidez de risco, por mais que eles tentem dizer que não, que vai ficar preservado [o direito de aborto nestes casos], mas, no outro momento, eles colocam que não poderá fazer o aborto.

É como podemos garantir as conquistas que já temos, as constitucionais. Essa é a minha posição, para que também o relatório caia na mão de alguém que tenha a capacidade de ser, nesse momento, imparcial e colocar as coisas no lugar. 

Uma outra coisa que eu falo é estar voltado realmente não só para um perfil de relatora, mas que a Secretaria da Mulher vai fazer essa discussão com o presidente da Casa para que a gente estabeleça tempo e prazo para discutir.

E vamos ver da possibilidade de continuidade ou não, de um projeto dessa natureza. 

Na sua opinião o PL afeta principalmente mulheres negras? 

A gente diz das mulheres negras... Por que as mulheres negras? Nós já vivemos uma série de violências, né? A violência obstétrica que sofre a mulher, a última a ser atendida. Muitas das vezes ela tem um processo hemorrágico após o nascimento da criança e aí ela fica por lá. Quando consegue cuidar, ela já vai ao óbito. 

Além dessa violência obstétrica, nós temos também que a maioria das crianças são abusadas em casa, são abusadas pelo pai, por tio. Então, a gente precisa garantir que essa menina não seja mãe, é só isso. Ela é uma menina, não mãe. 

Olha essa notícia de que um pai violentando a filha no hospital, no hospital! E já tinham parece violentado outra. 

Então, é uma realidade brasileira que nós precisamos trabalhar. Não é uma questão minha de consciência. Eu não sou favorável ao aborto, mas isso não significa dizer que as conquistas que nós temos, até então, que são conquistas, que as mulheres, as mães, as avós, as bisavós, no meu caso, lutaram muito para que a Constituição pudesse garantir. Essa é a minha posição. 

O presidente da Casa, Arthur Lira, disse que pretende colocar para relatar essa proposta uma mulher de centro. Você confia nessa posição, nesse pronunciamento do deputado?

O presidente sabe que o projeto precisa sofrer mudanças, ele foge totalmente do objetivo que se coloca no discurso, não é esse o objetivo. Então, se não é esse o objetivo, nós já estamos diante de um projeto inconstitucional.

Mas não queremos entrar nessa seara. O que nós queremos é que, qualquer que seja a relatora, que ela possa ter total condição de fazer esse debate, de conversar com as mulheres e não é só nós, mulheres parlamentares, de nós pra nós, apesar do voto sair de nós.

Mas nós não chegamos sozinhas com o nosso voto. Nós conhecemos mulheres, muitas mulheres, que votaram em nós e essas mulheres querem respostas, sejam elas religiosas ou não. 

Então, é preciso que a gente trate isso com serenidade, com equilíbrio e com ouvidos, porque é preciso ouvir.

No primeiro momento, nós dissemos, nós, da Secretaria, que não é possível colocar esse projeto. Esse tema não é um tema que você dá urgência e pronto, acabou, e vai discutir depois da urgência.

Quando você dá uma urgência, a urgência vem acompanhada do mérito. Mas não é o caso. Esse tema é um tema que não passa, é difícil. Seja de um lado ou de outro. até as pessoas que não são favoráveis ao aborto reconhecem que não pode ter o retrocesso, mesmo essas pessoas estão realmente discutindo.

Tem a questão da gravidez, mas ninguém pensa também como você faz essa combinação.

Então, se é verdade que não vão mexer nada, absolutamente nada, não vai ter nenhum retrocesso, vai ser mais difícil ainda, porque o que querem discutir é o projeto que vai impedir, que um determinado instrumento seja usado na questão do aborto, vamos dizer, do aborto de uma criança. 

Eu não tenho nem condição de fazer essa discussão, mas nós temos médicos, médicas, temos pessoas realmente estudiosas disso, que vão fazer o debate sobre o método, método de indução. 

Eu não sou a pessoa do ponto de vista técnico para dizer como vai ser o processo de indução.

Deputada, a senhora acredita que é o momento do governo federal intervir, seja por meio do próprio presidente Lula, da ministra das Mulheres, Cida Gonçalves?

Não, não, não, o governo não tem nada com a lei, a lei é nossa. Uma lei dessa, com um tema desse, envolver o governo, não. O governo não tem nada a ver, esse momento é um momento do Congresso Nacional, Câmara e Senado… É o espaço de fazer essa discussão.

O governo não vai interferir nessa discussão que está sendo feita no Congresso Nacional.

Deputada, a senhora ensaia uma conversa pessoal com o presidente da Câmara?

Vamos conversar, a Secretaria da Mulher vai conversar. A minha conversa que eu faço não é uma conversa particular, pessoal. Eu sou coordenadora da bancada, eu sou a aquela que é responsável pela Secretaria da Mulher, então, eu tenho que fazer uma forma coletiva.

A secretaria tem procuradora, a secretaria tem o observatório, né? Então vamos conversar com o presidente Lira para estabelecer, eu não digo nem prazo, mas para que a gente possa estabelecer o que nós já temos colocado, os simpósios para poder fazer essa discussão.

E aí a gente chama todo mundo, entende? Eu faço um projeto aqui, meu projeto é lindo, maravilhoso, sem pirotecnia, porque isso não é legal, não é bom. Então, vamos fazer com calma.

Eu acredito que o presidente Lira vai estar com a Secretaria da Mulher para que a gente faça essa discussão com muita responsabilidade e serenidade.

Deputada, agora só para fechar, eu queria falar sobre o outro assunto, sobre a PEC, a proposta de demanda da Constituição 45/23, essa vem do Senado Federal, mas chegou agora e ela criminaliza o porte e a posse de qualquer quantidade de droga. Que maneira vocês estão encarando isso?

Ainda não temos uma orientação, mas, essa semana, a bancada do PT vai se reunir para tratar dessas pautas. 

A gente sabe que são pautas consideradas polêmicas e que tem muita discussão ainda, muitos, muitos acordos a serem feitos e posicionamentos a favor e contra, então, nesse sentido o PT vai estar reunindo a bancada e nós vamos discutir o nosso posicionamento. 

Já são oito meses desde a criação da Bancada Negra no Congresso. Como você avalia este início?

Foi um grande desafio ter criado a Bancada Negra. Mas nós não criamos só com o título Bancada Negra.

Nós precisamos, nesse momento, fazer parte dos debates que nós consideramos que dizem respeito também à nossa população negra brasileira.

Nós temos uma discussão a ser feita com as ameaças de tirarem as políticas de cotas. Nós estamos trabalhando políticas de cotas para os servidores, que é uma vontade do governo, mas não é uma vontade majoritária do Congresso.

Então, nesse momento, a bancada negra tem esse grande desafio. Foi apresentado um projeto do qual ainda se está discutindo e, nesse momento, nós não queremos fazer essa discussão, que é a questão da porcentagem dos recursos do fundo eleitoral para as candidaturas negras.

Agora é o momento de nós estarmos fazendo essas discussões, que para nós são importantes, relevantes e sem corporativismo, porque a maioria da população é a minoria dentro do Congresso Nacional. Então é evidente que qualquer proposta que nós apresentamos, que seja realmente uma proposta de ação, uma afirmativa, ela encontra resistência. Não é uma coisa fácil.

Damião, que está liderando até novembro, ele é o líder da bancada, mas ele sabe das dificuldades para poder ter ali o projeto da Casa sendo aprovado e nós temos que articular muito ainda com o governo, porque o governo tem iniciativas que nos interessam e que a gente vai pedir socorro para nos amparar nas discussões que vamos fazer adiante.


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Edição: Martina Medina