O presidente do Comitê de Bacia do Rio Caí, Rafael Altenhofen, do estado do Rio Grande do Sul, critica a retomada de projetos de contenção de enchentes feitos a partir de estudos da Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional (Metroplan) como solução para as cheias na região gaúcha.
A proposta foi apresentada pelo senador Luís Carlos Heinze (PP) em audiência pública promovida na Câmara Municipal de Montenegro, na quinta-feira (20). Para Altenhofen, o projeto, desenvolvido durante os anos de 2012 e 2013, está incompleto e não oferece garantias de segurança à população.
O senador Luís Carlos Heinze esteve em Montenegro durante uma visita ao RS realizada por um grupo de senadores na região atingida pelas enchentes. Depois de passar por Roca Sales, Muçum, Encantado e Estrela, o senador foi a Montenegro, onde estava agendada a audiência pública na Câmara de Vereadores.
Na reunião, ele apresentou projetos de contenção de enchentes feitos a partir de estudos da Metroplan ainda durante o governo da presidente Dilma Rousseff (PT). Segundo o parlamentar, as propostas, que já tiveram recursos do governo federal, estavam paralisados há sete anos.
A crítica feita pelo presidente do Comitê de Bacia do Rio Caí começa pela falta de convite para os representantes do órgão. Ele destaca ainda a insuficiência do projeto na solução do problema.
"Apresentam como novidade estudos da Metroplan que já foram discutidos em reuniões públicas em 2014, incluindo nesta mesma Câmara de Vereadores, aos quais não foi dada continuidade em termo de projetos estruturais, pois foram considerados incompletos e sem garantias de oferecerem segurança à população pelo Comitê Caí, pelo Ministério das Cidades, MPE [Ministério Público Estadual] e MPF [Ministério Público Federal] – sendo ponto pacífico, também com a Metroplan, que devem ser complementados", aponta Altenhofen.
Insegurança
Entre os demais fatores geradores de insegurança, segundo ele, estão a falta de contemplação da bacia hidrográfica como um todo, o não envolvimento do comitê de bacia no processo e a ausência da incorporação de projeções de mudanças climáticas futuras nos cálculos dos Tempos de Recorrência (TRs).
Altenhofen destaca, por exemplo, que os estudos identificaram como TRs de 100 anos em São Sebastião do Caí a cota de pouco mais de 13 metros para a altura dos diques, enquanto a inundação do dia 2 de maio de 2024 atingiu 17,6 metros, quatro metros acima da altura dos diques que seriam projetados naquele TR. "A título de informação, os alagamentos em Novo Hamburgo e São Leopoldo foram gerados por uma cota que ultrapassou em pouco mais de 20 centímetros os diques", exemplifica.
Ele pontua ainda erros que considera "grosseiros" na apresentação da proposta. "Até mesmo os dados de cotas atingidas foram apresentados de maneira incorreta na apresentação feita nessa reunião disponível no vídeo", critica. "Atribuiu-se 11,7 metros, e não 10,3 m, em Montenegro, o que foi um erro grosseiro pelos tomadores de medida, de confusão da régua, então submersa da calha do rio, com aquela instalada no prédio ao lado da Câmara de Vereadores. Em São Sebastião do Caí, se atribuiu 3 metros a menos de cota atingida", critica.
O presidente do comitê disse ainda que não houve menção às resoluções do órgão que tratam desses estudos e que trazem condicionantes aos mesmos. "Nem a necessidade de complementação desses, ou mesmo a manifestação do Comitê Caí, nessa manhã, junto ao ministro de Estado da Secretaria Extraordinária da Presidência da República para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta”, relata.
A principal preocupação de Altenhofen, no entanto, é com a condução do evento. "Como se fosse um processo de tomada de decisão de uma instância que não é a legalmente responsável por essa definição em termos de bacia hidrográfica. Com o risco, nessa prática, de instaurarem-se conflitos na bacia", alerta.
Altenhofen disse ainda estranhar a vinda de uma empresa privada trazida pelo senador, que se referiu a ela como se fosse a responsável por atualizar os estudos em um cenário onde se desconhece qualquer licitação de complementação em curso na Bacia Caí. "Mesmo porque esses foram os únicos entre as bacias da região metropolitana cujos recursos não foram demandados pelo governo do estado do Rio Grande do Sul no novo PAC [Programa de Aceleração do Crescimento]."
Os estudos da Metroplan, assim como atas das reuniões daquelas e listas de presenças, podem ser acessados no repositório do Comitê Caí.
Posicionamento
Procurado pelo Brasil de Fato RS, o senador Heinze enviou nota à reportagem em que considera que "há equívocos no relato do senhor Rafael Altenhofen". O parlamentar destaca que promoveu o encontro "para apresentação de uma iniciativa governamental, que está paralisada desde 2012, com o objetivo de mobilizar e alertar os municípios sobre a necessidade de implementar projetos de prevenção de enchentes".
A nota diz ainda que o senador deixou claro, durante o evento, a necessidade de atualização do estudo da Metroplan. "Durante os anos de 2012 e 2013, ainda sob o governo da então presidente Dilma Rousseff, foram assinados os termos de compromisso para a realização de projetos de contenção de cheias. Contudo, a implementação dessas medidas não avançou com a rapidez necessária."
Heinze pontua que, diante da gravidade da tragédia no estado, cumpre o papel de liderança política, condizente com o cargo que ocupa. "Inclusive, desde o início do diálogo, Heinze destacou o caminho percorrido. De modo algum, apresentou como novidade ou ato personalizado. Reforçou, na abertura do fórum, ser esse um trabalho suprapartidário que não comporta atos de vaidade pessoal", diz o texto.
Sobre a presença do engenheiro convidado, ele disse que objetivo foi facilitar a compreensão técnica e ampliar o debate. "O parlamentar convidou o engenheiro responsável para detalhar as soluções técnicas, que estavam sendo trabalhadas em governos anteriores. A missão é informar, sensibilizar e incentivar a aplicação de medidas preventivas."
Em relação ao convite ao comitê do Rio Caí, o senador pontuou se tratar de "uma fase inicial da mobilização". "[É o] primeiro diálogo sobre o assunto, muito mais pode ser realizado, inclusive, com a condução do Poder Executivo. Destacamos, ainda, que a reunião foi aberta ao público, conduzida na casa do povo e contou com transmissão ao vivo."
Para Heinze, "houve má interpretação do senhor Rafael em relação aos dados apresentados sobre as cotas de inundação". A nota destaca que o próprio senador deixa evidente a necessidade de atualização dos números. "O parlamentar, inclusive, reforça a mensagem logo após a apresentação do técnico."
"Esclarecemos que as propostas de desassoreamento da calha do rio Caí não são arbitrárias. Pelo contrário, elas encontram amparo nas recentes normas publicadas pela Fepam [Fundação Estadual de Proteção Ambiental]", diz a nota. O senador ressalta ainda que "continuará a trabalhar de forma transparente e inclusiva, sempre em conformidade com a legalidade e em busca de soluções eficazes que possam ajudar a preservar vidas".
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Marcelo Ferreira