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Petróleo na Amazônia e crédito de carbono não são soluções, diz físico Paulo Artaxo, vice-presidente da SBPC

Encontro anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência começa neste domingo (7), em Belém do Pará

Ouça o áudio:

Artaxo: "Esse idealismo de que nós vamos gerar eletricidade absolutamente sem qualquer impacto ambiental não existe" - Jardel Rodrigues/SBPC

Com a pretensão de "estabelecer um novo contrato social com a natureza",  a reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) volta para Amazônia depois de 10 anos. O evento começa neste domingo (7) e se estende até o final da semana com centenas de mesas e espaços de debates sob o mote "Ciência para um futuro sustentável e inclusivo: por um novo contrato social com a natureza". 

Conhecida como "festa da ciência", o encontro reúne prestigiados cientistas brasileiros e convidados internacionais no que é considerado o maior evento do tipo na América Latina.  

Dois temas que devem tomar conta do evento são a política de crédito de carbono e as intenções da Petrobras de explorar a foz do rio Amazonas.  

Para o cientista Paulo Artaxo, vice-presidente da SBPC, as duas questões deveriam estar fora do foco do governo federal. 

"Basicamente, do ponto de vista ambiental, você aumenta as emissões no local e deixa de emitir em outro local. Isso não traz ganho líquido nenhum para o meio ambiente como um todo, porque a atmosfera é compartilhada por todos os seres do nosso planeta", afirma Artaxo sobre a política de carbono, em entrevista ao programa Bem Viver desta quinta-feira (4). 

O pesquisador é renomado nos estudos sobre a pauta ambiental. Ele foi membro da coordenação da área de Geociências da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), de 2000 a 2008, e atualmente é professor sênior no Instituto de Física da Universidade de São Paulo, além de membro do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC),

Sobre explorar a foz do rio Amazonas para busca de petróleo, Artaxo considera que "pode ser um investimento podre". 

"O petróleo está em franco processo de desuso, está sendo trocado pela geração de energia mais limpa, sem emissão de gás e de efeito estufa e, basicamente, o investimento de alguns bilhões de dólares, hoje, para tentar extrair petróleo daqui a 10 ou 12 anos – porque o tempo de estruturação dessa cadeia é muito longo – pode não ter mercado” 

Sobre o conceito de "energia limpa", o professor reconhece que tanto a eólica, solar e hidrelétrica podem se transformar, na verdade, em mecanismo de destruição de modos de vida tradicional, como aconteceu em Belo Monte, lembra. 

"A população que foi deslocada por causa da construção da barragem, por exemplo, continua sem ter eletricidade, apesar de Belo Monte gerar uma grande quantidade de energia elétrica", comenta. 

"Ou seja, o empreendimento, na verdade, prejudicou a vida de milhares de pessoas que foram deslocadas. Isso evidentemente não deve acontecer. É para isso que nós temos o licenciamento ambiental e social. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) tem que olhar pra essa questão antes de conceder licenças de operação ou licenças de instalação." 

Confira a entrevista na íntegra 

O que motivou a reunião anual da SBPC ser realizada na Amazônia este ano?

Evidentemente a Amazônia é uma das questões centrais, não só da questão ambiental e climática, mas sobre como construir uma sociedade mais sustentável, que é um dos temas desta reunião da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, em Belém. 

Hoje todos estamos procurando um caminho para construir uma nova sociedade que seja mais justa, mais inclusiva e mais sustentável. 

E nada como a região amazônica para apontar para a necessidade de um novo modelo de desenvolvimento econômico que não seja baseado na destruição dos recursos naturais, que não seja baseado na destruição das populações do nosso país e, por isso, a reunião vai se realizar em Belém. 

O evento vai contar com uma mesa específica sobre política do mercado de carbono. Como a SBPC entende esse tema? 

Não há dúvida que isto é uma questão muito controversa. Porque, obviamente, ele lida com a questão da mercantilização de um recurso natural, que é, por exemplo, a emissões de gás de efeito estufa para a atmosfera.  

E esse caso é particularmente importante, porque é possível que, dependendo de como este mercado for regulamentado, ele pode ou não favorecer as populações que deveriam ser favorecidas, que são as populações que geraram esses créditos de carbono, como a gente chama, as populações tradicionais que cuidam da floresta e realizam um trabalho de sequestro de carbono essencial para a estabilização do clima do nosso planeta. 

Sem a absorção de bilhões de toneladas de carbono que a floresta amazônica realiza cada ano estaríamos ainda piores na questão das mudanças climáticas globais, com um aumento ainda maior da temperatura do nosso planeta. 

Portanto, estruturar um mecanismo que favoreça as populações tradicionais é visto como absolutamente essencial e estratégico. 

O senhor conseguiria citar algum exemplo de como uma comunidade que estaria vendendo esses créditos poderia, no final, ser prejudicada por esse comércio?

Eu não diria que ela pode ser prejudicada, mas ela pode não ser beneficiada. Eu acho que esse é o ponto principal, né? Nós temos que trabalhar para que os benefícios da floresta se revertam para quem está mantendo a floresta em pé. 

E não em benefícios de alguma particular companhia ou algum tipo particular de indústria. Esse benefício tem que voltar para a região amazônica como um todo. 

E isso é um ponto-chave que será discutido na reunião da SBPC: como o mercado de carbono pode ser regulamentado. 

O que estamos vendo é que o mercado de carbono realmente não decolou, não só no Brasil, mas também em outros países, porque basicamente o seu princípio não está efetivamente ajudando na questão das mudanças climáticas globais. 

O princípio do mercado de carbono é deixar de emitir em um lugar para que ele seja emitido em outro. Por exemplo, uma indústria na Alemanha quer aumentar suas emissões de gás de efeito estufa. Ela compra certificados de emissões para aumentar suas emissões na Alemanha, que será compensando por uma ação de sequestro de carbono na Amazônia que ela estaria financiando. 

Basicamente, do ponto de vista ambiental, você aumenta as emissões no local e deixa de emitir essas emissões em outro. Isso não traz ganho líquido nenhum para o meio ambiente como um todo, porque a atmosfera é compartilhada por todos os seres do nosso planeta. 

As emissões circulam livremente pela atmosfera, agravando as mudanças climáticas, o que nós temos que fazer não é só compensar a emissão, mas reduzir drasticamente as emissões, inclusive proibindo a exploração e o uso de petróleo, porque 75% das emissões de gás de efeito estufa estão associados com a exploração e a queima do petróleo. 

Basicamente, [a queima] tem que ser proibida em nosso planeta para que a gente possa ter um mínimo de sustentabilidade climática. 

Alternativas para isso existem. Hoje temos a geração de eletricidade pela energia solar ou por energia eólica que tem preços competitivos e o Brasil tem enormes estratégicas. 

Temos o maior potencial de geração de energia verde em todo o nosso planeta e nós temos que aproveitar essas nossas vantagens estratégicas. 

Aproveitando que o senhor citou a questão do petróleo: qual a opinião da SBPC sobre explorar a foz do rio Amazonas para produzir petróleo?

Basicamente o que nós observamos, o que a comunidade científica brasileira observa, é de que investimentos na extração do petróleo, podem ser investimentos, digamos assim, podres, já daqui a alguns anos. 

O petróleo está em franco processo de desuso, está sendo trocado por uma geração de energia mais limpa, sem emissão de gás de efeito estufa e, basicamente, o investimento de alguns bilhões de dólares, hoje, para tentar extrair petróleo daqui a 10 ou 12 anos – porque o tempo de estruturação dessa cadeia é muito longo –, pode não ter mercado 

É um negócio de altíssimo risco econômico e energético, e com a possibilidade de vazamento de petróleo e acidentes, então também temos altíssimos riscos ambientais.  

A comunidade científica brasileira, em sua grande maioria, coloca claramente que isso não é uma estratégia adequada para a sociedade brasileira hoje por causa dos seus riscos econômicos e ambientais. 

O senhor citou a eólica, solar e hidrelétrica como exemplos de fontes de energia renováveis, verdes. No entanto, aqui no Brasil de Fato acompanhamos denúncias de comunidades que foram impactadas por esses setores, por exemplo em Belo Monte, mas também no nordeste em casos de parques eólicos. É possível explorar esses recursos sem causar prejuízos para as comunidades?

Veja, não há nenhuma atividade humana que não tenha algum impacto sobre o meio ambiente. Isso não existe. Esse idealismo de que nós vamos gerar eletricidade absolutamente sem qualquer impacto ambiental não existe. 

Esse é o primeiro ponto. O ponto fundamental é você beneficiar as comunidades impactadas, trazendo o retorno para aquela população. 

O que a gente vê, por exemplo, em Belo Monte, onde você vê que a população que foi deslocada por causa da construção da barragem continua sem ter eletricidade, apesar da usina gerar uma grande quantidade de energia elétrica. 

Ou seja, o empreendimento, na verdade, prejudicou a vida de milhares de pessoas que foram deslocadas. Isso evidentemente não deve acontecer. É para isso que nós temos licenciamento ambiental e social. 

O Ibama tem que olhar para essa questão antes de conceder licenças de operação ou licenças de instalação e, certamente, isso também se aplica a parques eólicos no nordeste brasileiro e em qualquer região. 

Também [se aplica a] parques associados com a geração de energia solar. Isso faz parte do licenciamento ambiental e esperamos que seja feita tecnicamente de uma maneira adequada a beneficiar as populações locais. 


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Edição: Martina Medina