Recursos

Teto de Gastos e Novo Arcabouço Fiscal travaram avanço da educação no país, diz estudo do Inesc

Estados gastaram menos do que o necessário por estudante para garantir uma educação básica de qualidade

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |
Em 2021, apenas sete estados investiram mais do que a média nacional de aproximadamente R$ 5 mil por aluno - Foto: Agência Brasil

O Teto dos Gastos, instituído em 2016, e o seu substituto, o Novo Arcabouço Fiscal de 2023, fizeram que com as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) no decênio 2014-2024 não fossem alcançadas, conforme aponta um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Além dos objetivos não cumpridos na educação básica, alguns indicadores retrocederam no país.  

A assessora política do Inesc, Cleo Manhas, afirma que de alguma maneira “regras fiscais rígidas sempre impedem o crescimento das despesas correntes líquidas, como saúde e educação. Durante a vigência do Teto de gastos, nós vimos a educação perder recursos ano a ano, e isso afetou não só o orçamento federal quanto os orçamentos dos estados e municípios”. 

Manhas defende que a educação brasileira é pressionada por políticas de austeridade que, em suas palavras, “não se justificam no cenário macroeconômico de hoje, que é relativamente estável”. 

“Nós precisamos de menos austeridade e mais políticas sociais. Gasto com a educação não é gasto, é investimento. É comprovado que o gasto com a educação gera ganhos com relação ao Produto Interno Bruto e movimenta a economia do país. Só o investimento público em políticas sociais reduz as desigualdades”, afirma.  

A assessora defende que somente uma decisão política sobre a educação pode garantir um investimento adequado. “Se fala sempre em reduzir os investimentos da educação e saúde. Mas ninguém diz que os juros altos do Banco Central pressionam a dívida pública e que quase um terço do orçamento vai para o pagamento da dívida. Por que isso não é discutido? E a gente só discute redução dos recursos para educação?”, questiona a assessora. 

Em 2022, os gastos do governo federal com o pagamento de juros e amortizações da dívida pública chegaram a R$ 1,879 trilhão, o que representou 46,3% do Orçamento Federal Executado (pago), de acordo com a Auditoria Cidadã da Dívida (ACD). No ano passado, foram R$ 2.010 trilhões de R$ 5.201 trilhões.  

Para este ano, foram reservados R$ 1.746 trilhão de R$ 5,5 trilhões aprovados. Para o Ministério da Educação, são destinados cerca de R$ 180 bilhões. “É fato que o orçamento de hoje para educação não é suficiente. Nós precisamos de mais recursos para o cotidiano da educação e para investimento em infraestrutura, que está muito defasada na maior parte dos lugares desse Brasil”, afirma Canhas. 

Dados do relatório 

A entidade comparou os recursos destinados à educação básica pública entre 2019 e 2023 em todos os 26 estados e no Distrito Federal. 

Para isso, utilizou o indicador Custo Aluno Qualidade (CAQ), criado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, que calcula o quanto deve ser gasto com cada estudante mensalmente para garantir uma educação de qualidade. Os gastos reunidos pelo CAC, no entanto, incluem apenas insumos necessários para o cotidiano das escolas, sem levar em conta os investimentos em infraestrutura. 

“O que nós percebemos, quando comparamos o que se gasta e o valor calculado pelo CAC, é que estamos distantes do ideal. Nós não temos nem o mínimo para o cotidiano, quem dirá para o investimento em infraestrutura”, afirma Canhas. 

Do começo do período analisado até 2021, apenas sete estados investiram mais do que a média nacional de aproximadamente R$ 5 mil por aluno. Em 2022, foram 14 estados que investiram acima da média, devido à grande quantidade de emendas parlamentares em pleno ano de eleições para os estados e governo federal, conforme defende o próprio Inesc.  

No ano seguinte, foi registrado um novo aumento entre os estados. Desta vez, porque o Teto de Gastos tinha perdido a vigência, mas o Novo Arcabouço Fiscal ainda não estava em vigor. 

Os estados do Rio Grande do Sul, Maranhão e Alagoas lideram o ranking da maior diferença entre a realidade e a expectativa, de acordo com dados do ano passado. Os gaúchos investiram apenas R$ 3.281 por aluno, quando o ideal para aquele estado era de R$ 10.953. Os maranhenses, na mesma linha, repassaram somente R$ 2.192 por matrícula, contra os R$ 9.861 que seriam necessários. Por fim, Alagoas investiu 2.596 por aluno diante dos R$ 9.969 calculados pelo CAC. 

O estudo do Inesc apontou ainda que os estados do Norte e Nordeste, que tiveram os menores investimentos, apresentaram as maiores distorções entre a idade dos alunos e a série em que estavam.  

Também se constatou que estudantes negros e indígenas estão entre as maiores vítimas da falta de orçamento em educação. Os estados com a maior proporção de alunos indígenas, Amazonas e Mato Grosso do Sul, gastaram abaixo da média nacional com educação. Na mesma linha, Rio de Janeiro e Bahia, com mais estudantes negros, gastaram menos do que a média e apresentaram as maiores taxas de distorção entre idade e série. 

“A situação se agrava ainda mais se pensarmos que os recursos dispendidos para a educação pública no Brasil também devem buscar corrigir a dívida educacional com as gerações passadas, bem como resgatar estudantes em idade escolar que evadiram da educação básica”, lamenta Cleo.  

“Esse estudo mostra que o argumento de que a escassez de recursos melhora a sua alocação é frágil. Na verdade, regras rígidas prejudicam o financiamento de áreas importantes para o país, que não possuem lobby financeiros a seu favor, como é o caso da educação”, conclui. 

Edição: Nathallia Fonseca