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Em Florianópolis, pré-candidato à prefeitura aposta na agroecologia para baratear 2º cesta básica mais cara do país

Marquito (Psol-SC) criou o 'mandato agroecológico' e defende uma visão sistêmica para gestão dos problemas da cidade

Ouça o áudio:

Marquito já foi vereador em Florianópolis e se elegeu deputado estadual em 2020 - Carol Morgan/Divulgação
A agroecologia, para nós, é uma questão sistêmica, mais do que somente um modo de produzir alimento

O deputado estadual em Santa Catarina Marcos José de Abreu, mais conhecido como Marquito (Psol-SC), quer levar o 'mandato agroecológico' à prefeitura de Florianópolis (SC). O pré-candidato aposta numa 'visão sistêmica' para combater problemas que afligem o município.  

"A gente se reconhece e se denomina como mandato agroecológico porque a agroecologia, para nós, é uma questão sistêmica, mais do que somente um modo de produzir alimentos", explica em entrevista ao programa Bem Viver desta terça-feira (16). 

Segundo o deputado, a visão sistêmica significa pensar na "alimentação, saúde, saneamento, proteção ambiental, garantia de direitos, direitos humanos e da natureza" como questões a serem tratadas conjuntamente.  

Em Florianópolis, estão cadastrados como pré-candidatos Carlos Muller (PSTU), Dário Berger (PSDB), Marquito (Psol), Pedrão Silvestre (PP), Topázio Neto (PSD) e Vanderlei Lela (PT).

Marquito é autor de lei que tornou Florianópolis uma "Zona Livre de Agrotóxico",  proibindo a aplicação e o armazenamento destes produtos no município. É dele também a legislação municipal que reconhece a natureza como "sujeito de direitos, que deve ser preservada pelo direito inato de existir". 

Segundo o deputado, estes princípios serão levados como bandeira de campanha para sua candidatura à prefeitura. 

"Em Florianópolis vivemos o absurdo que é ter a segunda cesta básica mais cara do país. A gente pode contornar essa situação através de mecanismos da segurança alimentar com as hortas urbanas, os pomares urbanos, os sistemas agroflorestais na cidade, cozinhas solidárias e comunitárias e restaurantes populares", defende. 

"A gente pode pensar agroecologia quando fala em repensar o saneamento na perspectiva de uma cidade que crie primeiro condições e infraestrutura para drenagem", diz. "A agroecologia me dá essas condições de pensar uma cidade a partir de uma gestão mais descentralizada, local e a partir dessas soluções."

Confira a entrevista na íntegra  

O que é um mandato agroecológico?

A gente se reconhece e se denomina como mandato agroecológico porque a agroecologia, para nós, é uma questão sistêmica, mais do que somente um modo de produzir alimentos.  

Na primeira vez que fui candidato, em 2016, quando acabei sendo o segundo mais votado vereador da cidade, a gente trouxe essa pretensão de se colocar como mandato agroecológico, que discutisse as questões da cidade com essa visão mais sistêmica sobre alimentação, saúde, saneamento, proteção ambiental, garantia de direitos, direitos humanos e da natureza. 

Também no foco de desmistificar um pouco essa ideia da agroecologia como só alguma coisa ligada à área rural e de produção de alimentos. 

Além disso, a gente tem um espaço muito interessante dentro do gabinete da Assembleia Legislativa, que é o espaço Ana Primavesi, com banco de sementes, composteira, biblioteca comunitária e um espaço de trocas também.

Diante da crise ambiental cada vez mais presente na nossa realidade, o senhor acredita que a agroecologia vai ganhar força no debate político? 

A agroecologia sempre foi o instrumento para enfrentar crises. Crises climáticas, ambientais, sociais e econômicas. A gente tem a certeza de que a agroecologia é um caminho para um futuro possível. 

A gente está vivendo uma crise climática, não somente por agredir ou por destruir a natureza. Mas a gente agride e destrói a natureza por uma série de concepções de sociedade, especialmente por conta de um aprofundamento do capitalismo, de políticas liberais, desmontes dos serviços públicos, bem como o interesse exclusivo sobre o lucro acima de qualquer outro interesse mais coletivo e humano. 

Para um modelo no qual a gente consiga alimentar todas as pessoas suficientemente com alimentos que tenham qualidade nutricional, ambiental e social, a gente precisa praticar e avançar na agroecologia.  

Ela pode ser realizada na área rural, [mas tem que acontecer] na área urbana, periurbana, nas infraestruturas urbanas. Ela pode ser desenvolvida e aplicada como conceitos que a gente está discutindo hoje como cidades esponjas. 

A agricultura ecológica já é uma agricultura esponja, porque ela tem como premissa, por exemplo, a proteção do solo, a biodiversidade, a garantia de um alimento saudável, seguro e nutricionalmente e equilibrado, que garanta isso com as condições dadas para as pessoas terem esse acesso e não ser um alimento de um nicho de mercado para apenas poucos ricos que consigam comprar. 

Agora, a agroecologia não é algo recente. É importante destacar que, no seu âmago, ela é toda aquela agricultura que foi praticada milenarmente pelos povos e comunidades tradicionais, por exemplo. 

A agroecologia será uma bandeira de campanha sua para a prefeitura?

Sim, a agroecologia, na nossa concepção sistêmica, será um instrumento de campanha. 

A gente vai manter essa coerência de atuação. Inclusive extrapolando, mostrando que, por exemplo, a gente consegue conciliar alguns dilemas que Florianópolis vive, como o dilema entre a proteção ambiental e o modelo de desenvolvimento, através da agroecologia. 

Isso pode ser feito, por exemplo, promovendo o turismo de base comunitária, valorizando os povos e comunidades tradicionais com seu conhecimento do patrimônio histórico da cidade, algo muito apropriado para as realidades turísticas da cidade. 

Em Florianópolis vivemos o absurdo que é ter a segunda cesta básica mais cara do país. A gente pode contornar essa situação através de mecanismos da segurança alimentar com as hortas urbanas, os pomares urbanos, os sistemas agroflorestais, as cozinhas solidárias e comunitárias, restaurantes populares, bancos de alimentos e equipamentos que consigam criar uma rede que garanta suficientemente o direito humano à alimentação adequada. 

A gente pode pensar agroecologia quando fala em repensar o saneamento na perspectiva de uma cidade que crie primeiro condições e infraestrutura para drenagem. 

A agroecologia me dá essas condições de pensar uma cidade a partir de uma gestão mais descentralizada, mais local e com essas soluções, muitas delas baseadas na natureza e também inspiradas nas técnicas agroecológicas, 

Você é autor de uma lei em Florianópolis que garante a natureza como sujeito de direitos. O que é isso?

A garantia da natureza como um sujeito de direitos apenas pelo fato dela existir é uma concepção muito inspirada nos povos e comunidades tradicionais, nas populações ancestrais, que tinham uma concepção indissociável do ser humano com a natureza, uma concepção de uma unidade. 

Essa visão mais ocidental, cartesiana, capitalista, de ver a natureza como um recurso a ser explorado, hoje, demonstra o caminho errado que nós entramos do ponto de vista do desenvolvimento da nossa civilização. 

Essa natureza, como um rio, um córrego, um lago, uma montanha, um ecossistema, é uma mudança de paradigma, porque a gente já tem mecanismos nas leis ambientais, nas medidas compensatórias, de mediação entre explorar e proteger. 

Mas essa lei avança no sentido de que toda e qualquer agressão ou violação é, sim, passível de ser atribuída à garantia desse ser vivo permanecer vivo. 

Isso é filosófico, obviamente, mas também é de concepção de sociedade. Se a gente avança, se consegue construir uma sociedade com esse entendimento, eu tenho certeza absoluta que nós, em menos de 150 anos, podemos dar uma volta por cima de todos esses últimos séculos em que estamos levando a humanidade a um colapso. 

Como você, representante do movimento agroecológico, recebeu o adiamento da apresentação do Planapo, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, por parte do governo federal?

O Planapo, realmente, é muito desejado e esperado há muito tempo. Todo o represamento dessa política de agroecologia que houve no governo do [Michel] Temer e governo do [Jair] Bolsonaro levaram o movimento agroecológico a buscar outras medidas, especialmente descer para o nível municipal. 

Porém, o plano nacional é fundamental porque dita metas, ações e responsabilidades dentro do organograma do governo federal em conjunto com os estados e municípios. Ele prevê a questão das ações intersetoriais do orçamento.

O adiamento, obviamente, traz uma reflexão do movimento. Esse tema teve em debate, assim como também está em debate o Pronara, que é o Programa Nacional de Redução de Uso de Agrotóxicos. 

A gente entende que, para avançar na agroecologia, é preciso pensar em políticas que acompanhem ações de transição agroecológica. 

O movimento agroecológico espera que seja lançado o Pronara conjuntamente com o Planapo. E que a gente avance estruturalmente na questão dos recursos financeiros para a agroecologia, para transição agroecológica.


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Edição: Martina Medina