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Lêda Maria relembra a frustação de desistir da 1ª Copa do Mundo feminina: 'fui convocada, mas futebol não me sustentava'

Ex-jogadora avalia positivamente o avanço da modalidade no Brasil, que chegou a ser proibida por 41 anos

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Lêda Maria jogou por anos no Vasco, sendo pentacampeã carioca pelo time - Arquivo pessoal
A gente não tinha sustento, não tinha salário, não tinha contrato, absolutamente nada disso 

A seleção brasileira estreia na próxima quinta-feira (25) nas Olimpíadas de Paris para buscar o ouro inédito na competição. Nesta edição, as mulheres serão as representantes do país do futebol nos Jogos, afinal a equipe masculina não alcançou a classificação. 

A modalidade feminina existe há menos de 30 anos nas Olimpíadas. A estreia foi em 1996, na edição de Atlanta, nos Estados Unidos. Em uma época que, no Brasil, as mulheres ainda precisavam usar roupas e chuteiras emprestadas da equipe masculina, lembra a Lêda Maria, que esteve presente naquela seleção. 

"Isso, para a gente, era uma coisa normal, mas se você faz um comparativo com o futebol feminino de hoje, você fica assim, 'caraca, elas passaram por isso'", comenta a ex-jogadora em entrevista ao programa Bem Viver desta quinta-feira (18). 

"A gente conseguia passar por cima disso, o que importava era estar ali junto, no coletivo, jogando futebol, se divertindo e fazendo o nosso melhor, e foi acho que uma das melhores coisas que eu vivi na minha vida." 

A participação de Lêda Maria nos Jogos de 96 foi uma vitória particular para a atleta. Cinco anos antes, ela viveu um momento quase inimaginável para qualquer esportista profissional. 

Em 1991, aconteceu a primeira Copa do Mundo feminina, na China. Lêda Maria estava na lista de convocadas e chegou a comparecer na apresentação oficial para a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), mas apenas para dizer que não iria.

"Eu não ia trocar o certo pelo duvidoso, o primeiro mundial na China, tu imagina! Eu tinha 26 [anos], e eu não tinha muito envolvimento com a comissão técnica, com os treinadores", lembra. 

"O futebol não me dava sustento, a gente não tinha sustento, não tinha salário, não tinha contrato, absolutamente nada disso." 

Felizmente, Lêda Maria seguiu jogando futebol e, quatro anos depois, na Copa de 95 ela voltou a ser convocada e, desta vez, viajou com a seleção para Suécia, para garantir o quarto lugar no mundial.

Esta geração é considera pioneira por ser a primeira a atuar pelo país após o fim da lei que proibia o futebol feminino no Brasil, que perdurou por mais de 40 anos, entre 1941 e 1983. 

Por conta disso, Lêda Maria avalia positivamente a evolução do futebol feminino no Brasil. Ao mesmo tempo, a ex-jogadora entende que a modalidade continua não sendo tão bem aceita pela população. 

"Elas [jogadoras da seleção brasileira] ainda sofrem preconceito, ainda sofrem barreiras. Não somos unanimidade, não somos" 

Na entrevista, Lêda Maria comenta também o que ela espera da atuação da seleção nesta edição dos Jogos olímpicos 

Confira a entrevista na íntegra: 

Porque você só estrou na seleção em 1995 e não em 1991?

Eu sou parte da primeira geração de mulheres, as pioneiras no Brasil, pós-proibição dessa lei que proibiu a mulher, durante 40 anos, de praticar a modalidade. Faço parte dessa primeira geração oficial, digamos, profissional, que teve o direito que nos foi cassado durante tanto tempo. 

E eu comecei minha carreira em 1981 jogando futsal pelo Radar, que não é o Radar de campo. 

E aí, em 1983, fui jogar pelo América, que foi o primeiro campeonato oficial no Brasil, porque a proibição foi revogada em 79, mas o primeiro campeonato oficial aconteceu em 83, que foi esse campeonato em que eu participei aqui no Rio de Janeiro.  

Sempre, na minha vida, joguei futsal e campo paralelamente. Sábado eu jogava campo e domingo, futsal. E aí, antes da Copa de 91, a gente teve um Mundial de 88, que foi experimental. O Brasil conseguiu ficar em quarto lugar, a gente tem até imagens disso na internet. 

E em 91 eu já jogava mais efetivamente o futebol de campo. Fui convocada para disputar esse Mundial, que foi na China, mas nessa época eu trabalhava. 

Desde quando eu comecei a jogar futebol, a condição que os meus pais me deram era a seguinte: até a idade escolar, você joga, mas você precisa estudar. Depois, eu continuei alinhando o futebol paralelamente ao trabalho, porque o futebol não me dava sustento. A gente não tinha sustento, não tinha salário, não tinha contrato, absolutamente nada disso.  

Quando chegou a convocação para mim em 1991 – e eu me arrependo até hoje de ter jogado fora o telegrama, eu não sabia que isso ia virar um documento importante na minha vida. Eu me apresentei, cheguei a me apresentar aqui no Rio de Janeiro, e eu falei que eu não ia ficar por conta disso, porque eu trabalhava.  

Eu não ia trocar o certo pelo duvidoso, o primeiro mundial na China, tu imagina! Eu tinha 26 [anos], e eu não tinha muito envolvimento com a comissão técnica, com os treinadores.

Mas aí eu fui efetivamente na de 95. Me convocaram de novo apesar de não ter ido na anterior. 

E, nessa Copa de 95, a gente conseguiu trazer visibilidade para ela. Não era muito grande. Eu tenho como afirmar que fomos a primeira geração, quebrando barreiras, batendo na porta, a gente tem o direito, a gente precisa, a gente tem o direito de estar aqui, a gente tem um mundial que a gente vai disputar. 

Apesar de ter sido um período difícil, tu entende que esse momento foi importante para as conquistas que temos hoje no futebol feminino? 

Com certeza. Querendo ou não, eu fiz uma escolha, mas se eu tivesse optado por disputar o Mundial, talvez eu tivesse permanecido mais tempo na seleção. 

A gente não tinha muito a dimensão do que a gente estava escrevendo, você me entende? Eu falo na terceira pessoa, porque era uma geração que só jogava bola, só queria se divertir.  

Era um prazer para a gente estar ali dentro do campo, mesmo com todas as dificuldades, com todos os impedimentos. A gente utilizar uniforme, que não era próprio do futebol de mulheres, era emprestado dos homens. Às vezes nem chuteira a gente tinha. Os clubes que emprestavam pra gente. 

Isso, para a gente, era uma coisa normal, um cenário normal, mas se você faz um comparativo com o futebol feminino de hoje, você fica assim, "caraca, elas passaram por isso". 

A gente conseguia passar por cima disso, o que importava era estar ali junto, no coletivo, jogando futebol, se divertindo e fazendo o nosso melhor, e foi acho que uma das melhores coisas que eu vivi na minha vida.  

Esse início difícil, mas, em contrapartida, a gente tinha essa amor pelo esporte, a gente metia a cara e era feliz pra caramba, entendeu?  

E para esses Jogos, o que podemos esperar da seleção?

Quando a gente conseguiu a medalha de bronze nas Olimpíadas em 96, foi a primeira edição de futebol de mulheres numa Olimpíada. A gente quase ganhou, faltou muito pouco. Foi o ponta pé para que a gente chegasse a ganhar as duas medalhas de prata, em 2004 e 2008, e, depois, ser vice no Mundial em 2007.  

A gente tem um treinador que está numa fogueira gigante. O Arthur [Elias] está numa fogueira gigante e eu penso que ele é o cara, realmente é o cara ideal, foi a melhor escolha que a CBF fez.  

Pena que foi muito em cima. Eu não sei se a escolha da Pia [Sundhage, ex-treinadora da seleção] na época tenha sido uma boa escolha, porque, infelizmente, o futebol é muito imediatista no Brasil. Se você consegue o resultado, você tem vida longa. Se você não consegue o resultado, acabou.  

Ela [Pia] tinha um projeto para as Olimpíadas, mas ela saiu no ano passado. Beleza, ela foi péssima, a participação dela na seleção brasileira foi péssima, em termos de resultados.  

Agora, vem Arthur e traz com ele a base do Corinthians. E, vou te falar, eu acho que ele não está errado, porque ele precisa de jogadores de confiança 

Ele está unindo o que ele tem de vitorioso na Comissão Técnica e ele está trazendo as jogadoras que venceram tudo, que é o melhor time do Brasil. 

Só que nisso a gente fica e a Cristiane [Rozeira]? Eu fico muito triste porque ela é unanimidade, foi o que aconteceu também nas olimpíadas, ela ficou de fora. 

Ela e a Ary Borges, que para mim, é uma baita de uma jogadora. Ary Borges e Cristiane, para mim, mereciam estar nessa lista. 

Então, se o Brasil vai conseguir uma medalha agora... Eu acho difícil, falando por tudo que eu já vivi, por tudo que eu vi.

A gente não sabe como é que a gente vai bater de frente com uma Espanha, com os Estados Unidos... Essas seleções têm muito, muito apoio das federações. 

Elas [jogadoras da seleção brasileira] ainda sofrem preconceito, ainda sofrem barreiras. Não somos unanimidade, não somos. 

Mesmo o Corinthians, que é o melhor time... Para esse time se sustentar ali, ele tem que bater muito no peito e lutar muito, muito, muito. Não é pouco, não. Mas muitas coisas estão sendo conquistadas.


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Edição: Martina Medina