Um vazamento de amônia na unidade do frigorífico Aurora, às margens da rodovia ERS-404, em Sarandi (RS), deixou 23 trabalhadores hospitalizados. O incidente ocorreu na terça-feira (23), no registro da sala de máquinas, especificamente em um dos compressores de refrigeração. Os trabalhadores foram liberados, mas o caso levantou críticas do sindicato por conta dos perigos da falta de manutenção de equipamentos.
A Cooperativa Aurora informou que um vazamento foi registrado, e que alguns trabalhadores passaram mal e foram atendidos. Segundo a cooperativa, duas pessoas precisaram ficar algumas horas no hospital e foram liberadas. A empresa informou que não tiveram maiores problemas e a unidade voltou a operar no mesmo dia.
O presidente da Federação dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação do Rio Grande do Sul (FTIA-RS) de Carazinho, com sub-sede em Sarandi, Adenilson de Souza Dias, relata que foram 23 pessoas hospitalizadas. Dessas, duas tiveram problemas por inalação do gás, mas receberam alta na mesma data, enquanto um funcionário, o operador do sistema de refrigeração, permaneceu internado por um dia por conta de queimaduras nos braços e ao longo do corpo.
Segundo o Corpo de Bombeiros, a guarnição foi acionada após funcionários registrarem o vazamento do gás. O incidente teria ocorrido após a vedação de uma tubulação falhar e a amônia ser liberada. O gás é usado na refrigeração das carnes e é considerado tóxico se inalado ou ingerido.
Entre os diversos sintomas causados pela inalação estão dificuldade de respiração, queimaduras no nariz, na faringe, laringe, dor no peito, edema pulmonar, salivação e retenção da urina. Se ingerida, a substância pode causar náusea, vômito, inchaço no lábio e na laringe. Em casos mais graves, pode levar à morte.
Problema recorrente, dizem entidades sindicais
O acidente destacou a frequente reivindicação dos sindicatos da Central Única dos Trabalhadores do Rio Grande do Sul (CUT-RS) e da FTIA-RS sobre a necessidade de monitoramento adequado dos equipamentos nos frigoríficos. Segundo Paulo Madeira, presidente da FTIA-RS, a falta de manutenção tem sido um problema recorrente.
"Muitos desses equipamentos não recebem a devida revisão e passam longos períodos operando em situação de risco, podendo, a qualquer momento, provocar acidentes fatais envolvendo dezenas de trabalhadores", alerta Madeira.
Para ele, a situação crítica dos equipamentos em frigoríficos, incluindo caldeiras, digestores e reservatórios de produtos químicos, foi novamente evidenciada pelo acidente de terça-feira. "Lamentamos porque nosso alerta para que sejam efetuados reparos nos equipamentos dos frigoríficos nem sempre são ouvidos", acrescentou Madeira.
O presidente da FTIA-RS avalia que a manutenção diária das máquinas e equipamentos, que possuem potencial para explodir e causar mortes, deveria ser uma prioridade número um das indústrias. No entanto, Madeira observa que essa prática só é adotada após significativa pressão dos sindicatos ou dos próprios trabalhadores.
"Fábrica de Acidentes"
A produção de carne é um pilar da economia brasileira. Só a cadeia de valor da carne bovina é responsável por 10% do PIB do país. No entanto, embora o setor prospere economicamente, a pecuária está relacionada com práticas problemáticas, como imensas emissões de gases de efeito estufa, desmatamento para estabelecer pastagens, expropriação de terras de povos indígenas e casos de trabalho análogo à escravidão.
Segundo dados publicados pela Relação Anual de Informações Sociais, do Ministério do Trabalho e Emprego, quase 140 mil pessoas trabalham em frigoríficos de bovinos no Brasil.
Uma pesquisa feita pela Repórter Brasil em parceria com a organização dos Países Baixos SOMO revela que, em 2019, os empregados da indústria da carne sofreram quatro vezes mais acidentes de trabalho e tiveram dez vezes mais doenças profissionais do que o trabalhador brasileiro médio.
O relatório 'Fábrica de Acidentes' mostra que especificamente no setor de carne bovina, quase 5 mil acidentes foram notificados em 2021, incluindo 13 mortes, para uma força de trabalho de 137 mil pessoas. Comparada às estatísticas internacionais disponíveis, a incidência de acidentes não fatais e fatais nos frigoríficos brasileiros também é elevada.
O processamento de carnes é uma atividade arriscada. Os trabalhadores têm que manusear ferramentas perigosas, como facas e serras, usar a força para cortar partes de animais ou, por vezes, animais inteiros, fazer movimentos curtos e rápidos repetidamente para separar os cortes que chegam nas mesas por todo o mundo. Durante longas jornadas de trabalho confinados em temperaturas extremas, os trabalhadores dos frigoríficos sofrem pressão constante para cumprir metas de produção elevadas, por salários baixos.
Segundo a CUT-RS, "o incidente de terça-feira reforça a necessidade urgente de revisar e melhorar as práticas de manutenção nas indústrias para garantir a segurança dos trabalhadores e prevenir futuros acidentes".
O Brasil de Fato RS questionou a Cooperativa Aurora a respeito das alegações dos sindicalistas sobre a falta de manutenção das máquinas, mas não teve um posicionamento até o fechamento da matéria. O espaço segue aberto caso a empresa queira dar a sua versão dos fatos.
* Com informações da Central Única dos Trabalhadores (CUT-RS) e Repórter Brasil
Fonte: BdF Rio Grande do Sul
Edição: Marcelo Ferreira