LUTO

Morre Tuíre Kayapó, ícone da resistência indígena contra a construção de Belo Monte

Tuíre se notabilizou em 1989, quando passou um facão rente ao rosto do presidente da Eletronorte

São Paulo (SP) |
Tuiré Kayapó durante o Acampamento Terra livre de 2017, em Brasília - Mídia NINJA/Mobilização Nacional Indígena

Morreu na manhã deste sábado (10), a guerreira Tuíre Kayapó, que há mais de trinta anos lutava contra a construção da usina de Belo Monte e pelos direitos das populações indígenas. A notícia foi confirmada pela sobrinha de Tuíre, Oé Kayapó. 

Tuíre tinha 57 anos e tratava um câncer no colo do útero - inclusive, meses atrás, foi criada uma vaquinha online para ajudar a custear o tratamento.

A indígena se notabilizou em 1989, durante uma audiência em Altamira (PA) sobre a construção da hidrelétrica de Belo Monte. O então presidente da Eletronorte, José Antônio Muniz, fazia sua fala quando Tuíre se aproximou e colocou um facão no rosto do homem. A imagem, captada por repórteres fotográficos que acompanhavam a audiência, virou um símbolo da resistência indígena contra o avanço de projetos econômicos que colocam em risco a preservação das florestas e do modo de vida tradicional dos povos originários.


A cena em que Tuíre Kayapó encostou um facão no rosto do presidente da Eletronorte se tornou um símbolo da resistência indígena / Reprodução

Recentemente, Tuíre esteve envolvida na luta contra o Marco Temporal, tese defendida pelos ruralistas que estipula que só podem ser demarcados territórios indígenas que estavam ocupados na data da promulgação da Constituição, em outubro de 1988. Em entrevista ao Brasil de Fato no ano passado, Tuíre afirmou que "Nossa vida é a floresta, a Amazônia. Estamos sempre vivendo na floresta, no rio. Nós nos acostumamos a morar dentro da Amazônia, porque a Amazônia está lá nos guiando. Lá nós nos alimentamos bem e não tem doença, nenhuma doença. Por isso o pessoal não pode destruir nossa Amazônia, nossa floresta. Eu não quero. Porque senador vive na cidade, deputado vive na cidade. Eles não moram dentro da floresta. Nós não, nós vivemos na floresta, na Amazônia. Por isso que eu não quero o Marco Temporal, eu não quero".

Homenagens

Em postagem das redes sociais, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, recordou a imagem que tornou Tuíre internacionalmente conhecida e completou: "Mas essa foto representa apenas um entre tantos momentos de sua irretocável trajetória. A guerreira Kayapó era incansável na luta pelos direitos do povo Kayapó, dos povos indígenas de todo o Brasil e na proteção do meio ambiente". A ministra postou vídeo em que Tuíre aparece cantando em sua posse na pasta. "Para além da fortaleza que foi Tuíra, porque a vida exigiu que fosse, é assim também que nos lembraremos dela: ecoando seu canto e seu sorriso", completou.

Joenia Wapichana, presidenta da Funai, também se manifestou nas redes: "Neste momento de dor, estendo minha solidariedade à família, amigos e ao povo Kayapó. Que a memória de Tuíre siga viva como exemplo de luta, resiliência e perseverança na defesa dos direitos indígenas". 

  

Edição: Raquel Setz