Crise

O impacto do Caso Americanas e uma reação possível: garantir a presença de trabalhadores no Conselho

A trama montada para fraudar os balanços da Americanas é digna de série de alguma plataforma de streaming

Brasil de Fato | São Paulo |
É impossível que um país como o Brasil não atue de maneira muito firme e consistente com o caso das Lojas Americanas e todos os seus envolvidos - Mauro Pimentel/AFP

A fraude nos balanços das Lojas Americanas, que causou a demissão de cerca de 5,5 mil trabalhadores, o fechamento de quase 100 lojas da marca no ano passado e deixou uma dívida de R$ 50,1 bilhões aos credores, entre eles acionistas minoritários, segundo a proposta de recuperação judicial, representa a maior crise do capitalismo brasileiro.  

A denúncia foi feita em janeiro de 2023 pelo então CEO (diretor-executivo) das Americanas, Sergio Rial, que ocupou o cargo por apenas nove dias até encontrar o que chamou de ‘inconsistências contábeis’. Depois disso, Rial passou a defender a 3G – empresa do corpo acionário da companhia, composto pelos bilionários Jorge Paulo Lemann, Beto Sicupira e Marcel Telles. A denúncia vem sendo apurado há mais de um ano e é aterrorizante para o mundo dos negócios. 

Apesar disso, o estardalhaço da imprensa comercial no caso é bem diferente do que aconteceu com o caso da Petrobras, durante a operação Lava-Jato, o que deixa claro que o envolvimento político é o fator gerador do interesse da mídia, já que o caso Americanas, com um rombo três vezes maior do que se apurou no caso da Petrobras – cerca de R$ 12 bilhões – passa quase que invisível pelo noticiário nacional.

Outra diferença está no tratamento dado pelo então juiz e hoje senador Sérgio Moro ao caso da Petrobras em relação ao que propõe agora para o caso Americanas.  

A trama montada para fraudar os balanços da Americanas é digna de série de alguma plataforma de streaming, um escândalo ao qual a opinião pública tem que reagir melhor, de forma mais enérgica, seguir de perto essa história. Para isso é importante acompanhar as apurações que o jornalista Luís Nassif vem publicando no portal GGN. 

Aparentemente, as investigações policiais e empresariais continuam muito frágeis. Apesar da importância de haver uma apuração, já se passaram quase dois anos e nenhuma medida de punição foi tomada. 

O caso é complexo, é verdade, mas como ficam os trabalhadores que perderam o sustento de suas famílias? Ou aqueles que tinham ações e perderam o seu patrimônio, com a derrocada do valor da empresa? Isso enquanto aqueles que participaram da fraude vendiam suas ações milionárias e preservavam seus ganhos. 

Até agora, não está claro o envolvimento da 3G na participação no esquema de fraude, porém essa hipótese tem que ser devidamente apurada, já que são capitalistas importantes do Brasil e expoentes do chamado mercado financeiro.
Tudo tem que ser minuciosamente acompanhado, mas, em princípio, é impossível que um país como o Brasil, que está aperfeiçoando a sua democracia, passando várias questões a limpo, não atue de maneira muito firme e consistente com o caso das Lojas Americanas e todos os seus envolvidos. 

Um desdobramento possível para esse caso poderia ser a obrigatoriedade de trabalhadores participarem do Conselho Administrativo em todas as empresas de capital aberto. 

E que o processo eleitoral desses representantes seja realizado de forma transparente pelo sindicato representativo que atua na empresa, já que a mesma empresa pode ter várias unidades. 

Para isso, é necessária a criação de uma legislação, com aprovação na CVM (Comissão de Valores Mobiliários), como projeto de lei, amplamente debatida pela sociedade civil organizada, o movimento sindical, no parlamento brasileiro.

Dentre as normas para cumprir-se essa nova exigência de participação, os trabalhadores precisam ser preparados, com o acompanhamento do sindicato, para que eles estejam prontos para contribuir na transparência da gestão empresarial e evitar fraudes como a ocorrida nas Lojas Americanas. 

A estrutura toda pode falhar, mas a chance de o trabalhador falhar nas suas obrigações de fiscalizar é infinitamente menor. 

* Rafael Marques é presidente do Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento, o TID-Brasil e presidiu o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, de 2012 a 2017, e a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, em 2013 e 2014. Ingressou na Ford, em São Bernardo do Campo, em 1986 e representou os trabalhadores e trabalhadoras na montadora do ABC Paulista por quase três décadas. É conselheiro do Instituto Lula.

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**Este é um artigo de opinião. A visão do autor não necessariamente expressa a linha editorial do jornal Brasil de Fato.

Edição: Nathallia Fonseca