O presidente da Assembleia Nacional da Venezuela, Jorge Rodríguez, afirmou na segunda-feira (12) que vai discutir a regulação das redes sociais no país. Segundo ele, a ideia é incluir esse debate na Lei contra o Fascismo, que está em debate no Congresso. O anúncio foi feito durante a reunião do Conselho de Segurança venezuelano.
“A Venezuela precisa regulamentar o funcionamento das redes sociais, não somos pioneiros nessa questão. Mais de 70 países, que formam 40% da ONU [Organização das Nações Unidas], já regulamentaram o funcionamento das redes sociais”, afirmou.
Para Jorge Rodríguez, esse tipo de regulamentação terá como objetivo combater a disseminação de ódio e de fake news nas redes e será importante não só para “defender as instituições”, mas também para “garantir o bem-estar dos venezuelanos”. O governo anunciou também a criação do Conselho de Cibersegurança, para pensar estratégias e administrar a temas relacionados às redes na Venezuela.
A medida faz parte de uma escalada da tensão na Venezuela envolvendo as redes sociais. Durante a eleição que reelegeu Nicolás Maduro para um terceiro mandato, o Conselho Nacional Eleitoral do país (CNE) anunciou ter sido alvo de muitos ataques hackers. Mais tarde, o presidente disse que o bilionário dono do X (ex-Twitter), Elon Musk, é um agente que tenta desestabilizar a Venezuela e que estava envolvido nesses ataques.
Maduro afirmou que por trás das manifestações violentas da extrema direita e do ataque contra o sistema eleitoral do país, está “o império dos Estados Unidos, o narcotráfico colombiano, Elon Musk e a direita extremista e fascista”. O bilionário tem apoiado as manifestações violentas na Venezuela e contestado os resultados das eleições do país. Em publicações nas redes sociais, Musk compartilhou mensagens afirmando que o candidato opositor Edmundo González Urrutia venceu o pleito e pedindo para que venezuelanos vão às ruas protestar contra o resultado do pleito.
Em resposta, Maduro suspendeu a rede social X por 10 dias da Venezuela. Ele também afirmou que estava tirando o Whatsapp do seu celular por ser uma fonte de ataques a jovens e lideranças populares. Nesta segunda-feira (12), o presidente da Venezuela disse que, além do X e do WhatsApp, o TikTok também é uma rede usada para disseminar ódio e informações falsas contra a Venezuela.
Agora, o objetivo é incluir a regulação na lei aprovada em abril, que ficou conhecida como Lei Antifascismo. A norma foi proposta pelo governo para combater pessoas e organizações que disseminam o ódio e têm a violência contra grupos como forma de ação política. A lei prevê multas administrativas e até prisão como punição aos atos violentos.
Para o especialista em tecnologia da informação da Universidade Central da Venezuela Luigino Bacci, o contexto faz necessária uma regulação das redes sociais pela forma como elas passaram a ser usadas. De acordo com ele, o fato de as empresas não terem representação comercial em muitos países do sistema capitalista faz com que essa relação fique desigual.
“As redes sociais já são reguladas pelos empresários e por seus donos. Por isso, a gente se dá conta de que surgiu um novo fenômeno de que elas são usadas para disseminar ódio e medo, como nas guarimbas de 2014, que foram usadas para ameaçar militantes chavistas. Essas empresas não têm representação nos países como a Venezuela para acudir ou fazer uma reclamação, abrir uma demanda. Mas no primeiro mundo isso acontece”, disse ao Brasil de Fato.
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Para ele, o momento para a discussão sobre a regulação das redes é correto, mas o governo poderia implementar essas medidas de maneira mais lenta.
“É preciso buscar uma maneira de que não passe a impressão de que essa lei é uma perseguição, uma ameaça aos opositores. Deve haver equilíbrio, a lei é para todos e se evitar a disseminação de ódio. É necessário esperar para baixar um pouco a temperatura, para que não pareça uma lei persecutória, já que é uma lei importante. Ainda há uma confrontação, então poderia esperar um pouco”, disse.
O presidente da Assembleia não detalhou quais seriam os detalhes dessa lei, mas Bacci afirma que é importante que as redes sejam obrigadas a ter representação comercial e jurídica na Venezuela, para que essas questões sejam tratadas diretamente com a empresa.
Outro desafio é como fazer o controle e a fiscalização nas redes. Segundo Bacci, seria preciso ter uma forma de “sancionar” quem compartilhasse conteúdos com discursos de ódio. A questão maior, para ele, são os interesses dos grandes empresários donos desses redes.
“Obviamente Elon Musk tem interesses e necessidades como a questão do lítio na Bolívia para os carros da Tesla e, obviamente, a forma que ele se move tem isso como base. Ele pediu golpe na Bolívia e se comporta como adolescente que dá respostas irreverentes, mas que não é um adolescente, é dono de um dos maiores conglomerados que nos vê como pátio dos fundos. Há que levar em conta de onde vem e esses interesses. Ele nos vê como bonecos de um jogo para que ele consiga vencer no jogo da vida dele”, afirmou.
Investigação dos ataques hackers
A Sala Eleitoral do Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela investiga os ataques hackers contra o sistema eleitoral da Venezuela. A Corte disse ter encerrado a primeira fase das investigações e ouviu 9 dos 10 candidatos. O objetivo é divulgar a decisão nos próximos dias.
Nesta segunda-feira, o governo deu detalhes da ofensiva hacker. Segundo a ministra de Ciência e Tecnologia, Gabriela Jiménez, foram 30 milhões de ataques por minuto em média durante o dia 28. A apresentação foi feita durante reunião do Conselho de Segurança organizado pelo governo.
Ainda de acordo com a ministra, 65% desses ataques foram de negação de serviço - ou DDoS. Essa é uma forma de congestionar o sistema com um volume muito grande de pedidos de acesso, forçando a sua queda. Ou seja, muitos computadores tentam, ao mesmo tempo, entrar num mesmo site, fazendo os mesmos pedidos, criando um fluxo insuportável para uma determinada página online.
Regulação no Brasil
A Venezuela não é o único país da região que discute a regulação das redes sociais. A Câmara dos Deputados do Brasil criou em abril um grupo de trabalho para debater a regulação das redes sociais. O debate surgiu depois da discussão em torno do Projeto de Lei 2630, conhecido como PL das Fake News. O texto tem como objetivo criar uma norma que detalhe quais são as especificações para crimes cometidos por divulgação de notícias falsas.
O projeto foi aprovado pelo Senado e está em discussão na Câmara. O presidente da Casa Alta, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse em abril que a regulamentação das redes sociais no país é inevitável para que não haja discricionariedade por parte das plataformas.
A discussão voltou à tona no Legislativo depois que Elon Musk pediu a renúncia ou impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, em postagem na rede X.
Em resposta, Moraes determinou a inclusão do empresário, dono da rede social X, entre os investigados no inquérito já existente das milícias digitais antidemocráticas. 'Redes sociais não são terra sem lei! As redes sociais não são terra de ninguém', escreveu o ministro em letras maiúsculas na decisão.
Edição: Rodrigo Durão Coelho