O procurador-geral da Venezuela, Tarek William Saab, disse nesta sexta-feira (23) que vai indiciar o ex-candidato da Plataforma Unitária, Edmundo González Urrutia, pela publicação de supostas atas eleitorais recolhidas no dia das eleições presidenciais pela oposição. Ele afirmou que o ex-embaixador será denunciado por “usurpar funções” que são do Conselho Nacional Eleitoral do país (CNE).
O grupo divulgou cerca de 25 mil atas eleitorais em dois sites. Em um deles, o usuário digitava o seu documento de identidade e aparecia supostamente a ata eleitoral da mesa que aquele usuário votou. No outro, havia um compilado com os dados de todas as atas que a oposição afirmava ter. A extrema direita, no entanto, não levou essas atas à Justiça quando foi aberto o processo de investigação das eleições.
De acordo com Saab, a investigação em torno da divulgação das atas será conduzida por um setor do Ministério Público responsável por crimes digitais. O objetivo é rastrear os servidores, usuários e páginas usadas para provocar o que o procurador chamou de “ansiedade na população e desestabilização”.
Ainda em sua declaração, Saab disse que a extrema direita já havia anunciado antes das eleições que protestaria por uma fraude eleitoral. O procurador já havia denunciado Edmundo González e a ultraliberal María Corina Machado pela organização dos atos violentos que ocorreram no dia seguinte às eleições.
Desde a publicação das atas pela oposição, o governo alega que as atas divulgadas pela oposição apresentam muitas inconsistências. Resultados iguais em diferentes mesas de votação, assinaturas de fiscais muito parecidas e atas ilegíveis foram alguns dos argumentos apresentados pelo governo.
Com base nessas denúncias, o presidente Nicolás Maduro foi ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) para pedir a investigação de todo o processo eleitoral e dos “ataques hackers” que o CNE alega ter sofrido no dia das eleições. Além de não levar essas atas para a Justiça, os cinco representantes da Plataforma Unitária convocados pelo TSJ foram os únicos dos 38 que não prestaram esclarecimento. Só Edmundo González Urrutia entre os candidatos também não prestou esclarecimento.
Em seu lugar, o ex-embaixador enviou o governador de Zulia, Manuel Rosales. Depois de prestar esclarecimento, ele falou com a imprensa, disse que a oposição “não precisa entregar nada” e afirmou não saber quem publicou as atas nos sites. Nesta quinta-feira, a Justiça venezuelana validou a reeleição de Nicolás Maduro para um terceiro mandato. Segundo os peritos que participaram da investigação, as atas apresentadas pelo CNE estão de acordo com os dados coletados pelo sistema eletrônico do órgão eleitoral.
O TSJ pediu também a publicação dos resultados na Gazeta Eleitoral do país. O CNE tem 30 dias para a publicação dos resultados a partir da proclamação dos candidatos, realizadas em 29 de julho. A Corte também cita na decisão casos de outros países em que as eleições foram judicializadas, como do Brasil em 2022 e dos Estados Unidos em 2020.
A presidente da Corte criticou a ausência do candidato da oposição, Edmundo González Urrutia para prestar declarações na Justiça e a omissão dos partidos que compõem a Plataforma Unitária na entrega dos materiais eleitorais. Segundo o Tribunal, Edmundo González desacatou mandato da Justiça e que isso pode "acarretar em sanções".
O único dos candidatos da oposição que disse que tomará medidas legais contra o resultado do pleito foi Enrique Marquez, do Partido Centrados. Ele disse que pedirá um recurso de revisão na Sala Constitucional do TSJ contra a decisão da Sala Eleitoral. Ele apresentou também uma “contestação” contra a presidente do TSJ, Carsylla Rodríguez, por ligações políticas com o Partido Socialista da Venezuela (PSUV), do presidente Maduro, que comprometem a sua imparcialidade.
A oposição de extrema direita afirma ter mais de 80% das atas e que isso garantiria a vitória de Edmundo González Urrutia. Antes mesmo da divulgação dos resultados, María Corina Machado já havia dito que "González Urrutia teve 70% dos votos e Nicolás Maduro 30%”. O presidente Nicolás Maduro foi declarado reeleito para um terceiro mandato, com 6,4 milhões de votos (51,97%) contra 5,3 milhões (43,18%) do opositor González com 96,87% das urnas apuradas.
EUA e o ataque hacker
O embaixador da Venezuela na ONU, Samuel Moncada, apresentou nesta sexta-feira (23) o que seriam as provas levantadas pelo governo venezuelano do ataque hacker sofrido nas eleições presidenciais. Ele afirmou que a operação partiu dos Estados Unidos, que estariam tentando atacar a Venezuela desde 2002, usando como exemplo o golpe contra o ex-presidente Hugo Chávez. Segundo ele, o empresário Pedro Carmona Estanga foi apoiado pelos EUA ao tentar derrubar Chávez.
Ele usou como exemplo também a postura dos Estados Unidos em outras eleições venezuelanas. Uma delas foi o pleito regional de 2004. O oficialismo venceu em 20 estados e 270 prefeituras enquanto a oposição venceu em 2 estados e 62 prefeituras. Um documento vazado pelo WikiLeaks, site fundado por Julian Assange, apresentou supostos estudos do governo estadunidense que indicavam uma vantagem da oposição nessa disputa.
Moncada afirmou que os EUA só reconhecem eleições que “convém”. Ele citou também o pleito Legislativo de 2015, um dos únicos reconhecidos pelo país.
"Os Estados Unidos só reconhecem a Assembleia Nacional de 2015 porque lhes convém, já que a oposição ganhou. Foi a única eleição que eles reconheceram da Venezuela. E dizem até hoje que essa é a composição oficial da Assembleia. Eles não reconhecem a Assembleia de 2020", disse.
Para embasar a ideia de um ataque hacker dos EUA, o embaixador usou a plataforma estadunidense AltaVista PVT, que publicou um suposto levantamento na própria noite das eleições afirmando que Edmundo González Urrutia havia ganhado as eleições. A organização disse ter recolhido uma quantidade de atas que comprovariam isso. O grupo, no entanto, afirma que as atas analisadas são diferentes dos documentos recolhidos pela oposição.
Ele afirmou que vai levar essas denúncias para a ONU para pedir medidas contra os Estados Unidos.
O governo da Venezuela afirma desde as eleições que o ataque hacker partiu dos Estados Unidos. Maduro denunciou a participação do bilionário Elon Musk, dono do X, nos ataques ao sistema eleitoral venezuelano.
Musk tem apoiado as manifestações violentas na Venezuela e contestado os resultados das eleições do país. Em publicações nas redes sociais, compartilhou mensagens afirmando que o candidato opositor Edmundo González Urrutia venceu o pleito e pedindo para que venezuelanos saiam às ruas protestar.
Em resposta, o governo da Venezuela suspendeu o X no país. Ao anunciar a medida, Maduro disse que seu proprietário incita o ódio e o fascismo.
Edição: Rodrigo Durão Coelho