O clima segue quente entre o Legislativo e o Judiciário em Brasília. Nesta terça-feira (27), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados tentou votar quatro propostas que visam limitar o poder do Supremo Tribunal Federal (STF). Um pedido de vista coletivo foi apresentado e a votação foi suspensa. Agora, os deputados precisam esperar a realização de duas sessões ordinárias no plenário da Câmara para que os temas voltem a serem apreciados pela comissão.
"Nós queremos fazer o contraponto para indagar sempre: e o povo, onde fica? E o interesse das maiorias? E a reforma agrária? E a soberania nacional? E o direito dos trabalhadores?", declarou o deputado Chico Alencar (Psol-RJ) sobre o pedido de vistas.
"Hoje foi lançada uma publicação muito boa sobre a desigualdade social que, embora tenha diminuído no ano passado em alguns aspectos, continua muito estrutural no país. E logo de cara na Constituição está dito, está escrito que um dos objetivos estratégicos da República e do Brasil, portanto, é a diminuição da desigualdade social. E nenhuma dessas medidas aqui traduz essa intenção", completou.
As medidas são consideradas uma reação do Congresso Nacional a decisões do STF que desagradam os parlamentares. A principal delas foi tomada há duas semanas pela Corte, que determinou a suspensão de todas as emendas impositivas apresentadas pelo Congresso ao orçamento. As emendas seguem suspensas até que o parlamento, em diálogo com o Executivo, estabeleça critérios para garantir a transparência e a rastreabilidade dos recursos.
No começo da sessão, o deputado federal Patrus Ananias (PT-MG), pediu a retirada de pauta. "Está claro que os sentimentos que movem esses projetos não são os melhores sentimentos, de compromisso com o nosso país, com o nosso povo, com o nosso ordenamento jurídico, com o Estado Democrático de Direito. São sentimentos que muitas vezes são movidos por interesses pessoais e de grupos", defendeu.
Chico Alencar questionou que uma matéria de tamanha importância seja votada com o Congresso esvaziado. Embora esta fosse uma semana do chamado "esforço concentrado", quando os deputados acordam estar presencialmente na Casa, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), liberou os parlamentares para participarem das sessões de forma remota.
"Nós entendemos que essa é a sessão da vingança, uma mera reação à suspensão, já objeto de acordo entre os Três Poderes, das emendas parlamentares. Não é assim que se legisla", protestou Alencar que considerou a votação açodada, já que os parlamentares só tiveram acesso ao relatório da proposta próximo ao meio-dia desta terça.
Em defesa dos projetos, a deputada Bia Kicis (PL-DF) chegou a dizer que o Judiciário não é um poder da República. Já Júlia Zanatta (PL-SC) disse que "quem manda é essa Casa", em referência à Câmara dos Deputados.
Do que se trata?
As propostas votadas hoje na CCJ são duas Propostas de Emenda à Constituição (PCE) e dois projetos de lei. A PEC 28/2024, relatada pelo deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), acrescenta um item ao Artigo 5º da Constituição Federal que impede que decisões liminares possam ser tomadas de forma monocrática, ou seja, individualmente pelos ministros, além de prever casos em que o Congresso poderia sustar decisões do STF. A proposta deve agora ser analisada por uma comissão especial, antes de ser votada em plenário nas duas casas, em dois turnos.
Já a PEC 8/2021, de relatoria do deputado Filipe Barros (PL-PR), propõe limitar as decisões monocráticas nos casos de declaração de inconstitucionalidade ou concessão de medidas cautelares. As duas PECs foram enviadas à CCJ pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), logo após a decisão do ministro Flávio Dino de suspender as emendas impositivas. A proposta já foi aprovada pelo Senado. Agora deverá tramitar em comissão especial, e depois votada em plenário, em dois turnos.
Por sua vez, o PL 4,754/2016 passa a considerar crime de responsabilidade dos ministros do STF a usurpação de competência do Executivo ou Legislativo. O deputado Alfredo Gaspar (União-AL) é o relator. E finalmente, o PL658/2022, sob relatoria do deputado Gilson Marques (Novo-SC), proíbe que o Senado Federal faça novo juízo de admissibilidade da acusação contra o presidente da República após ser admitido pela Câmara dos Deputados e define como crime de responsabilidade a manifestação pública de ministros do STF sobre processos em julgamento. Os PLs ainda precisam ser aprovados em plenário.
Edição: Nicolau Soares