FÉ E POLÍTICA

'Nem tão de esquerda, nem tão de direita': diretor de filme fala de desafios dos evangélicos progressistas em meio à polarização; assista

Diretor de ‘Fé em Disputa’ falou sobre o crescimento das igrejas evangélicas e seus impactos na política e na cultura

Brasil de Fato | Recife |
'Fé em disputa' analisa a biografia de pastores e fiéis, destacando a experiência de evangélicos progressistas - Divulgação

Lançado recentemente, o documentário “Fé em Disputa – a ascensão dos evangélicos no Brasil” apresenta uma análise do crescimento das igrejas evangélicas no Brasil, com foco nas periferias urbanas, mostrando como a expansão da fé protestante tem impactado o cenário político e social do país.

Produzido pelo Brasil de Fato, o filme foi gravado ao longo de um ano, passando por igrejas do Recife e Olinda (em Pernambuco) e Maceió (Alagoas) e se aprofundando nas complexas interações entre religião e política, revelando a diversidade interna dessas instituições e desafiando a visão simplista de que todos os evangélicos seguem uma agenda fundamentalista.

O documentário e a figura do “evangélico progressista” foram temas do Trilhas do Nordeste, programa do Brasil de Fato Pernambuco em parceria com a Rede TVT. Entrevistamos o pernambucano Afonso Bezerra, diretor e roteirista do “Fé em Disputa”.

Bezerra explica que o rápido crescimento das igrejas evangélicas nas periferias se deve, em grande parte, ao espírito comunitário que elas promovem. “Elas criam um ambiente de pertencimento e protagonismo para os fieis, permitindo que se sintam parte ativa da comunidade religiosa”, comenta. Assista:

O sentimento de inclusão é facilitado por uma estrutura menos rígida que a da Igreja Católica, permitindo uma maior participação dos membros daquela comunidade nas atividades da igreja. A relação com a comunidade religiosa continua fora dos muros da igreja, através das redes de rádio, televisão e redes sociais, alimentando uma estética e uma cultura evangélica no Brasil.

Além disso, Afonso Bezerra aponta para uma agenda política pensada pelo fundamentalismo religioso, que tem buscado construir hegemonia nessa arena ao longo das últimas três décadas. “Os fundamentalistas religiosos têm usado seu poder para influenciar a legislação e as consciências políticas, desempenhando um papel significativo na formação de um projeto de poder”, diz o diretor.

Somado ao uso ostensivo de sua estrutura de comunicação para seus fins políticos, os grupos fundamentalistas religiosos têm fortalecido uma base social conservadora e eleito cada vez mais políticos conservadores. Para Bezerra, a combinação do discurso religioso com as teorias neoliberais cria uma narrativa poderosa que alimenta o individualismo e a desmobilização social, especialmente entre as classes mais vulneráveis. “Essas igrejas ocupam o espaço deixado pelo Estado, oferecem serviços sociais e promovem um discurso de individualismo e empreendedorismo”, analisa.

Em ano eleitoral, as igrejas evangélicas emergem como um grupo decisivo nas estratégias políticas - e em Pernambuco não é diferente. Segundo Afonso, “os parlamentares conservadores em Pernambuco são extremamente atuantes e conseguem ter um diálogo forte com sua base através do discurso religioso, acionando o pânico moral e criando a sensação de que a sociedade está desmoronando”.

Evangélicos progressistas

O documentário também lança luz sobre um grupo que, embora menos visível, tem papel importante no cenário religioso e político: os evangélicos progressistas. Esses fieis, que buscam reinterpretar a Bíblia sob uma ótica mais inclusiva e socialmente engajada, enfrentam desafios tanto dentro das igrejas quanto no meio político.

Afonso Bezerra relata que muitos desses fieis sentem-se marginalizados, vivendo em um “não pertencimento”. "Eles se veem como nem tão de esquerda para serem aceitos plenamente nas organizações políticas, nem tão evangélicos para serem completamente acolhidos pelas igrejas", explica. Essa dualidade, segundo ele, reflete a dificuldade que esse grupo enfrenta ao tentar conciliar sua fé com um compromisso com pautas sociais e progressistas.

Dentro das igrejas, esses fiéis que propõem releituras bíblicas, como a teologia negra ou feminista, muitas vezes são vistos como revolucionários demais. “Eles são interpretados como desfazendo a palavra da Bíblia”, observa Afonso, apontando que esse é um grande debate entre os progressistas, que defendem que a leitura bíblica deve ser contextualizada e ressignificada de acordo com o tempo e o local.

Para assistir ao documentário completo, acesse o link.

Fonte: BdF Pernambuco

Edição: Vinícius Sobreira