AGRESSÃO E OFENSAS

TV precisa inovar em debate para não prevalecer lógica nociva das redes sociais, diz especialista

Para Márcio Moretto, discussão de propostas fica prejudicada porque baixarias recompensam candidatos no universo digital

Brasil de Fato | São Paulo (SP) |

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Apresentadora Amanda Klein teve que conter os ânimos entre Marçal e Nunes para prosseguir com debate RedeTV!/Uol em São Paulo; próximo será no SBT - Foto: Reprodução / YouTube

Os últimos debates televisivos entre candidatos à prefeitura de São Paulo foram marcados por bate-boca, trocas de ofensas e até agressão física, deixando as propostas para a gestão municipal de lado. Isso foi evidenciado no evento promovido pela RedeTV! e Uol, na última terça-feira (17), e no encontro da TV Cultura, no domingo (15), quando José Luiz Datena (PSDB) deu uma cadeirada em Pablo Marçal (PRTB). 

Os fatos recentes acontecem porque a disputa eleitoral tem sido cada vez mais influenciada pelas redes sociais, explica Márcio Moretto, professor da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador do Monitor do Debate Político no Meio Digital. Ele comentou sobre esse fenômeno durante o jornal Central do Brasil.   

"A gente tem observado, nos últimos anos, que o papel das mídias sociais tem sido muito mais proeminente. Infelizmente, a disputa nas mídias sociais recompensa muito essas baixarias. Por exemplo, depois do episódio da cadeirada, para se ter uma ideia, o candidato Datena ganhou mais de 120 mil seguidores no Instagram, que é uma das redes agora que tem mais importância nos debates políticos [com o bloqueio do X no Brasil]. E o Marçal ganhou mais de 600 mil seguidores."

O especialista comenta que esse alto crescimento nas redes se deu apenas dois dias depois do debate com a agressão. "Quer dizer: tem uma dinâmica, uma lógica das mídias sociais que, de alguma forma, recompensa esse tipo de atitude. Tanto as provocações que o Marçal tem feito reiteradamente nos debates, nas mídias sociais, na sua propaganda, quanto a agressão que, enfim, [foi] lamentável."

E as cenas de provocação e agressão talvez tenham influenciado também as intenções de voto dos eleitores, pelo menos neste momento. A pesquisa Quaest divulgada nesta quarta (18) apontou que, enquanto Datena oscilou dois pontos percentuais para cima, Marçal perdeu 3% em relação ao último levantamento do mesmo instituto. 

Em São Paulo, onde existe um número alto de indecisos, os debates seguem muito relevantes para a maioria dos eleitores, conforme apontou o Datafolha na semana passada. Mas é preciso ter um programa de governo: sete em cada 10 brasileiros atribuem bastante importância às propostas dos candidatos na hora de definir o voto, conforme o estudo.

Moretto destaca que, diante dos acontecimentos, o formato dos debates precisa inovar e garantir espaço para exposição de ideias. Os seis candidatos mais bem posicionados nas pesquisas devem se encontrar novamente na sexta-feira (20), no debate promovido pelo SBT.  

"A democracia perde muito se a gente não conseguir fazer debates, de fato, com uma apresentação de propostas. Nesse ano, em São Paulo, especificamente, está muito difícil. A gente vê Tabata Amaral [PSB], Guilherme Boulos [Psol], às vezes o [Ricardo] Nunes [MDB] também, tentando fugir dessas armadilhas de um pseudo-debate que, no fundo, é só lacração. Mas o que tem atrapalhado muito é que, principalmente, o candidato Pablo Marçal tem usado o debate para fazer seus cortes para as mídias sociais."

"A gente tem candidatos que estão tentando apostar numa outra via e não cair nas provocações, apresentar as propostas. Acontece que, enquanto o jogo está sendo jogado nas mídias sociais, elas promovem, de alguma forma, um comportamento muito hostil", lamenta.

O professor da USP elogia o tipo de debate em que existe a checagem do que é dito pelos candidatos em tempo real, como tem acontecido nos Estados Unidos. 

"A gente tem que experimentar formatos de debate - e, nas últimas eleições presidenciais, tiveram algumas tentativas de inovação. E isso dos Estados Unidos, com as checagens de fato ao vivo, são medidas bem-vindas aqui para o debate que a gente deveria experimentar. Porque, se a gente não inova no debate televisivo, o que acaba acontecendo é que prevalece a lógica das mídias sociais. E essa lógica das mídias sociais tem sido bem nociva para o debate público", argumenta.

A entrevista completa, feita pela apresentadora Luana Ibelli, está disponível na edição desta quarta-feira (18) do Central do Brasil, no canal do Brasil de Fato no YouTube

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O Central do Brasil é uma produção do Brasil de Fato. O programa é exibido de segunda a sexta-feira, ao vivo, às 13h10, pela Rede TVT e por emissoras parceiras.

Edição: Martina Medina