Na favela como um todo, a gente sabe que ainda tem muita casa para rebocar
Na reta final para lançar seu terceiro álbum de estúdio, Rincon Sapiência reforça que o objetivo do trabalho está vinculado em combater estereótipos comuns a respeito da representação da população preta. "Falando sobre experiências do corpo preto que saiam desse lugar que todo mundo está habituado a ouvir, que são sobre os enfrentamentos, a minha ideia é não trazer somente essa narrativa", diz.
Na coluna deste mês no programa Bem Viver, o rapper cita, inclusive, a expressão famosa "favela venceu", que segundo ele, embora surja de um lugar genuíno de comemorar vitórias de pessoas que partiram de locais marginalizados, acabam escondendo problemas estruturais que permanecem mesmo com essas conquistas.
"Acaba se tornando um termo equivocado porque essa vitória, entre aspas, acaba sendo individual de uma pessoa em si da favela e não da favela como um todo. Na favela como um todo, a gente sabe que ainda tem muita casa para rebocar, tem muita casa sem endereço, tem muita energia ligada na gambiarra, tem muito desemprego, tem muita gente vivendo de baixa renda."
Na entrevista, Rincon Sapiência fala mais sobre o primeiro single lançado do terceiro álbum, Códigos, em parceria com MC Luki.
O rapper também comenta também sobre a atuação do jogador Vinicius Junior, que teve mais uma "vitória" nesta semana com a decisão do governo espanhol de multar um torcedor que fez comentários racistas contra o craque brasileiro.
"É uma vitória e, sim, é o modelo a se chegar no Brasil, porque no Brasil já aconteceram as mesmas coisas de casos de racismo, de ter imagens das pessoas sendo racistas e essas pessoas podem circular normalmente para todo lugar, essas pessoas muito provavelmente continuam frequentando os jogos e, na verdade precisa ter o constrangimento, precisa doer no bolso."
Confira a entrevista na íntegra
Como foi a construção dessa parceria com MC Luki para a nova canção
Eu fiz essa música num momento em que eu identifiquei que eu precisava, além de fazer a música na espontaneidade, eu queria contar uma história. Aí no caso dessa música, ela tem muita ver com uma pesquisa, um resgate no caso do estilo de música, de textura, do som, que escutava muito no início da primeira década dos anos 2000.
Era uma fase que eu trabalhava CLT, que meu filho era muito novo e as coisas pareciam muito distantes, as realizações com a música.
Ai eu falei 'poxa, mas eu escutava tanto esse tipo de música, com esse tipo de texto, com esse tipo de montagem de rima. Faz tempo que eu não faço isso e eu faço tão bem. Eu gosto tanto de fazer isso.'
Então acabei construindo uma música com essa narrativa. E logo, como eu sou um cara que gosta de funk também, que estou conectado com as coisas que estão acontecendo, o MC Luki é dos meus artistas favoritos dessa nova geração. e como ele é versátil, como ele compõe bem.
Qual o sentido que vocês pensaram na hora de escolher o nome da música, códigos, e marca do refrão?
Quanto mais a gente vai levando a vida, enquanto cidadão, e no meu caso enquanto artista também, mais a gente acaba carregando muitas responsabilidades.
Eu refleti muito sobre a construção que eu fiz de personalidade dentro da minha quebrada, que eu sinto o respeito que eles têm pelas coisas que eu faço, pelo fato de eu apoiar os artistas que são do bairro, e não só para os jovens, como as senhoras que me viram crescer.
E entendi que tudo isso foi possível por conta do entendimento dos códigos, de saber os códigos de conduta.
Todo mundo é ser humano e tá suscetível ao erro, a cometer algum equívoco, a dar uma cabeçada. Todo mundo que vive intensamente corre esse risco, mas o fato de a gente conseguir atravessar gerações, fazer músicas, ter vários tipos de narrativa, compartilhar coisas nas redes sociais, como culinária, como música, como todo tipo de pesquisa, e ser muito bem recebido para tudo isso, é por conta do entendimento dos códigos de diálogo, de narrativa, e de dia a dia, do tête-à-tête com as pessoas.
E sobre o seu novo álbum, alguma novidade sobre o lançamento?
Não, por enquanto a data não temos. A gente tem um repertório bem montado e o repertório já traz a narrativa dessa ideia sobre o corpo preto, sobre as várias nuances do corpo preto.
O corpo preto apaixonado, do corpo preto usando redes sociais, o corpo preto passando por enfrentamentos, o corpo preto celebrando o que conquistou e orgulhoso do que conquistou.
Então, toda essa narrativa em torno desse título, o corpo preto.
Você citou "um corpo preto que conquistou". De que forma tudo isso se relaciona ou se contrapõe à expressão "a favela venceu"?
O corpo preto acaba sendo uma narrativa da qual a gente precisa mostrar outras realidades. Porque os enfrentamentos... a gente sabe que existem os enfrentamentos pelo contexto histórico, pelo sequestro que aconteceu no passado.
Somos um povo sequestrado, que quando começam uma, entre aspas, abolição, a gente já tá muitas casas atrás, então são várias coisas sobre violência, sobre enfrentamento.
Agora, na nossa experiência muitas vezes a gente subverte algo que a gente foi condicionado a ser. Muitas vezes a gente acaba conseguindo virar o jogo numa tendência individual, numa perspectiva individual. E aí isso precisa ser celebrado.
Agora falando da termologia em se a favela venceu... eu consigo entender da onde surge isso, que é sobre essa virada de jogo, principalmente econômica do favelado que cresce e é criado nas piores condições e aí por conseguir fazer um bom trabalho na música ou nos esportes, ou algo do tipo, consegue virar o jogo. Mas quando a gente coloca a favela... é muita coisa e muita gente.
Acaba se tornando um termo equivocado porque essa vitória, entre aspas, acaba sendo individual de uma pessoa em si da favela, e não da favela como um todo. Na favela como um todo a gente sabe que ainda tem muita casa para rebocar, tem muita casa sem endereço, tem muita energia ligada na gambiarra, tem muito desemprego, tem muita gente vivendo de baixa renda
Mas falando sobre experiências do corpo preto que saiam desse lugar que todo mundo está habituado a ouvir, que são sobre os enfrentamentos, a minha ideia é não trazer somente essa narrativa. E dentro disso aparece o corpo preto amando, o corpo preto num relacionamento, o corpo preto tomando invertida no relacionamento, o corpo preto de todas as novas possíveis assim.
Nesta semana, o governo da Espanha aplicou uma multa contra um torcedor que publicou ofensas racistas contra Vinicius Junior. O valor passa de R$ 300 mil reais. Como você avalia essa atitude do governo espanhol? Deve ser uma referência para o Brasil?
O que eu vejo é assim: em muitos dos casos, no trânsito, por exemplo, existem punições. Você parou no lugar errado, seu carro é guinchado.
E aí em relação ao racismo, há uma recorrência enorme de casos de racismo e registros das pessoas proferindo as palavras com registro das imagens, o que nunca faltou foram registros sobre isso.
E aí a importância do Vinícius Junior é o que? É um jogador que está jogando muito bem, e esse é um jogador disposto a reclamar.
Até porque eu acho que o fato de ele ser um jogador que joga num clube do tamanho do Real Madrid e é um jogador de destaque acaba fazendo as notícias pipocarem mais.
Tanto é que na própria Espanha ele é muito criticado pelo fato de reivindicar as punições, muitas vezes com um torcedor que está xingando ele, aí ele fica sendo acusado de ser um cara que é provocador... esse tipo de coisa.
Mas se a Espanha quer ser um país modelo, porque eles trabalham para isso, para ter o maior clube, que no caso é o Real Madrid, para ter o futebol modelo, eles precisam tomar uma providência mediante ao que está acontecendo.
É uma vitória e, sim, é o modelo a se chegar no Brasil. Porque no Brasil já aconteceram as mesmas coisas de casos de racismo, de ter imagens das pessoas sendo racistas e essas pessoas podem circular normalmente para todo lugar. Essas pessoas muito provavelmente continuam frequentando os jogos e, na verdade precisa ter o constrangimento, precisa doer no bolso.
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Edição: Nathallia Fonseca