BdF Entrevista

Brics deve liderar reconstrução de Gaza junto com palestinos, diz presidente da Federação Palestina do Brasil

Ualid Rabah destaca papel do Brasil e do Sul Global no apoio à Palestina e condena Israel: 'pior genocídio da história'

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'Israel é o estado ilegalmente posto na ONU e deveria ser removido', defende Ualid Rabah - Cadu Bazilevski
Ser considerado 'persona non grata' em Israel é uma espécie de Oscar ou Nobel dos direitos humanos

Uma futura reconstrução da Faixa de Gaza - arrasada por Israel desde o dia 7 de outubro de 2023 - deve ser liderada pelos países do Brics e pelos próprios palestinos, sem participação de potências ocidentais. Essa é a opinião de Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe-Palestina do Brasil.

Em entrevista exclusiva ao Brasil de Fato, Rabah classificou positivamente a atuação do Brasil diante do massacre cometido pelas forças israelenses em Gaza e destaca o papel ativo que o país pode ter nos esforços para reconstruir o enclave palestino.

"A reconstrução de Gaza não pode ficar sob o monopólio ocidental. Isso não é mais possível. Nada que diga respeito à Palestina pode ser liderado pelo Ocidente, especialmente pelos Estados Unidos. Então, o nosso esforço é para que o Brasil lidere nos Brics ou faça um esforço nesse sentido", afirmou.

Desde o início do massacre recente, iniciado em outubro do ano passado após ataques do Hamas, mais de 42 mil palestinos já foram mortos por Israel em Gaza, que também destruiu diversos locais cruciais de infraestrutura e importantes para a manutenção da vida no território. 

"É uma tentativa de causar o colapso da capacidade reprodutiva de uma sociedade inteira. Esse é o genocídio de novo tipo, nunca foi visto", afirmou Rabah.

O presidente da Fepal ainda mencionou o papel ativo da diplomacia chinesa, que mediou um acordo histórico entre Hamas, Fatah e outras 12 organizações palestinas em busca de unidade. "É preciso haver uma unidade Palestina e aí entra o papel da China. A Palestina e os palestinos devem encontrar um meio de reconciliação de todas as forças políticas e sociais. E das organizações não apenas partidárias ou daquilo que nós designamos como resistência", disse.

Em termos financeiros, Rabah menciona os números citados pela União Europeia, que já disse ser necessário um investimento de US$ 90 bilhões (mais de R$ meio trilhão) para reconstruir Gaza. Para ele, deveria existir apoio da ONU e de uma comunidade de países do chamado Sul Global, mas sem a participação do Ocidente.

"É preciso reconstruir Gaza plenamente e é preciso acabar com o bloqueio a Gaza. É preciso que tudo isso aconteça em um processo de reconhecimento do Estado da Palestina, dentro de um consenso interno palestino e dentro de um consenso internacional, com base nas regras estipuladas. Deve haver, dentre essas regras, o direito de retorno dos palestinos. Sem isso, não haverá paz, nem para palestinos, nem para os que se tornaram israelenses", disse.

Confira os principais trechos da entrevista:

Brasil de Fato: Estamos a poucos dias de completar um ano do 7 de outubro, quando teve início os ataques de Israel contra a Faixa de Gaza após os ataques do Hamas. Muitos já consideram um marco para o povo palestino por ser o maior ataque bélico de Israel contra a população palestina em um curto período. Qual é a avaliação da Fepal sobre a situação humanitária em Gaza hoje?

Ualid Rabah: Primeiro de tudo trata-se de um genocídio. Qualquer outra terminologia, por mais poderosa que ela seja e por mais que ela descreva o extermínio de pessoas, é tecnicamente um genocídio, ou seja, a tentativa de eliminar um povo inteiro. E não é por acaso que Israel enfrenta uma acusação promovida pela África do Sul, uma petição já admitida pela Corte Internacional de Justiça para apurar genocídio.

Petição que o Brasil apoia, que a Turquia apoia, que o Egito apoia, o Chile apoia e uma quantidade gigantesca de países apoia, para não dizer de juristas especialistas no tema. Aliás, há uma outra agravante, esse é o primeiro genocídio televisionado da história humana. Um ano de genocídio na televisão. Imaginem só - para demonstrar a gravidade do que é um genocídio ser televisionado e o silêncio do Ocidente, ou pelo menos do Ocidente politicamente dado, quer dizer Estados Unidos, França, Inglaterra, não estou falando dos povos, estou falando das elites governantes - imaginemos nós aqui as câmaras de gás sendo televisionadas, os crimes nazistas contra as populações afetadas pela tentativa de extermínio sendo televisionados.  

Essa é uma realidade concreta. E o que é isso em números hoje? Não é pouca coisa. Nós temos a maior matança de crianças da história, dos genocídios e das guerras de todos os tempos. Agora, por exemplo, 45% dos do extermínio é de crianças. Números do dia 17 de setembro, quando nós tínhamos quase 52 mil exterminados, considerando 10 mil desaparecidos sob escombros, 2,5% da demografia de Gaza, o que daria 5 milhões no Brasil e 20 milhões mais ou menos na Europa da Segunda Guerra Mundial para a sua população de hoje, 45% eram crianças, quer dizer, perto de 22 mil, considerando 4 a 5 mil desaparecidos. Isso dá 9,8 mil crianças exterminadas por milhão de habitantes em menos de 1 ano. Na Segunda Guerra Mundial inteira - que foi a maior matança em uma guerra e que durou 6 anos - as crianças representaram 2.813 por milhão. Israel extermina, com apoio dos Estados Unidos, 3,5 vezes mais crianças palestinas em Gaza em um ano. As mulheres são perto de 12 mil, considerando as desaparecidas, e entre mil e 1,5mil delas foram exterminadas grávidas. 300% é o aumento dos abortos involuntários. O que que isso tudo quer dizer? Isso tudo quer dizer a tentativa de causar o colapso da capacidade reprodutiva de uma sociedade inteira. Esse é o genocídio de novo tipo. Isso nunca foi visto.  

Como esse genocídio que ocorre na Faixa de Gaza tem afetado a população palestina no Brasil? Há dados concretos desse impacto como aumento de refugiados, um aumento na migração, uma piora na saúde física e mental dessa população?  

Primeiro, nós recebemos uma população, uma quantidade de repatriados brasileiros palestinos que estavam lá e que foram resgatados pelo governo brasileiro daquele campo de extermínio. Isso a gente agradece muito. Nós da Fepal abrimos uma conta humanitária e arrecadamos recursos com os quais, graças aos céus, nós estamos conseguindo auxiliar essas famílias com uma ajuda mensal muito importante, que tem garantido o aluguel e outras despesas.

Esse é o primeiro dado objetivo. O segundo dado que não é ainda medido é a quantidade de palestinos impactados psicologicamente. Esse é o maior impacto psicológico que nós sentimos na nossa história. As pessoas não estão dormindo, as pessoas não estão conseguindo trabalhar adequadamente e algumas pessoas começam a tentar evitar essa notícia, de tão dramática que ela é. Algumas pessoas não conseguem sair das telas da televisão, das emissoras árabes que estão transmitindo esse genocídio ao vivo.  

É preciso também considerar que nós temos aqui talvez no máximo 0,5% da nossa demografia no Brasil oriunda de Gaza ou com alguma ligação com Gaza, portanto, quase 100% da nossa é diáspora aqui no Brasil é da chamada Cisjordânia ou descendentes de exterminados na limpeza étnica de 1940 e 1947 a 1951. Nós temos outro tipo de genocídio ocorrendo na Cisjordânia pela violência dos colonos, que são extremistas, análogos ao que houve de pior na Europa durante os "pogroms” e durante aquilo que se tornou o nazismo, o fascismo europeu de um modo geral, e que tem destruído olivais milenares, tem atacado cidades, que tem matado pessoas na Cisjordânia desde o 7 de outubro.  

Existe uma visão entre alguns analistas e pesquisadores de que o ataque do Hamas do dia 7 de outubro de 2023 teria sido um plano, na verdade, para evitar que a Arábia Saudita entrasse nos chamados Acordos de Abraão e normalizasse suas relações com Israel. Você concorda com essa leitura?

Eu, francamente, não conheço o pensamento, a cabeça de quem planejou e quais eram os seus objetivos, mas eu acho que essa tentativa de explicar geopoliticamente a necessidade de reação da Palestina frente à ocupação é minimizar a luta de libertação nacional. O que está em jogo é a luta de libertação nacional. Ou seja, a necessidade de auto-defesa do povo palestino e, neste caso, inclusive, relativizar essa ideia de ataque a território israelense.

O território hoje considerado israelense é ilegalmente conquistado pela força e nós temos o direito de libertá-lo ou, na pior das hipóteses, ver cumprida a resolução da ONU 194 de 11 de dezembro de 1948, que reconheceu a limpeza étnica realizada pelo sionismo para fazer nascer Israel, bem como determinou o retorno dos refugiados. Setenta por cento da população de Gaza é refugiada desse processo de limpeza ética de 1947 a 1951.

Isso quer dizer que essa população tem o direito de retornar. E esse direito de retornar é reconhecido internacionalmente por resolução, pelo direito Internacional, e ele é refutado por Israel. Como? Em primeiro lugar, bloqueando Gaza. Se eu tenho direito a retornar e grande parte dos que estão em Gaza foram expulsos exatamente daquela região que se tornou “kibutz” e assentamentos de estrangeiros, então nós estamos falando de tentativa de retorno às suas casas, roubadas. O que aconteceu de 1947 a 1951? Além de uma limpeza ética, uma limpeza demográfica?

A ocupação geográfica, não apenas a ocupação geográfica de Terra, um PIB inteiro dos palestinos roubado, bancos palestinos roubados, dinheiro das suas contas roubados. Tesouros roubados. Terras agricultáveis roubadas, olivais inteiros roubados, laranjais inteiros roubados, indústrias inteiras roubadas, universidades, escolas, estradas, ferrovias, portos.

É o primeiro roubo de um PIB inteiro que se tem conhecimento na história das guerras, das conquistas. Essas pessoas têm direito de recuperar isso e de voltar, à luz do direito Internacional. Então a luta de libertação nacional é que está em questão. É a ocupação colonial por estrangeiros sediados, em tese, por sua capital, Tel Aviv, que cercam Gaza, que cercam a Cisjordânia, que ocupam territórios da Cisjordânia, provocando hoje perto de 110 “bantustões”, quer dizer, aquela forma territorial adotada pelo apartheid na África do Sul para isolar as populações palestinas na Cisjordânia, que cerca e separa da Cisjordânia, por meio de colonatos, a cidade de Jerusalém.  

Contra isso tudo, o povo palestino tem direito a reagir. Existe uma resolução que pouca gente dá bola, a de número 273/3, de 11 de maio de 1949. Que resulta de um pedido da Grã-Bretanha na época para admitir Israel como estado membro da ONU. Bom, isso já desmente que Israel foi criado pela ONU. Como é que a ONU cria um ente e não o reconhece? Ela não passaria, aí resolveram inserir dentro dessa resolução 3 cláusulas condicionantes.

Uma é até bizarra, que é de aceitar a Carta das Nações Unidas. A outra, aceitar e acatar e implementar a resolução 181, que é a da recomendação da partilha de 29 de novembro de 1947, que dava aos palestinos, ainda que injustamente, pelo menos 42,9% do seu próprio território para o seu futuro estado independente e não determinou trocas demográficas, por exemplo, aqueles 56,5% destinados a um futuro estado que poderia vir a ser chamado Israel, fosse o que fosse, quase 50% da população era não judaica. 

E acatar e implementar a resolução 194, quer dizer, o retorno dos refugiados, a restauração da demografia da Palestina histórica. Nós estamos falando, portanto, da Palestina toda, do Rio ao mar. E esta resolução foi acatada por Israel para poder ser Estado. Estas duas resoluções não foram respeitadas até agora, pelo contrário, em 1967 Israel ocupa o restante da Palestina, Gaza, Cisjordânia, com Jerusalém Oriental. 

Claro, vêm sendo violadas constantemente. 

Isso. Israel, a toda prova, é o estado ilegalmente posto na ONU e deveria ser removido da ONU enquanto não cumpra as duas resoluções condicionantes que o fazem estado membro. É diante disso que os palestinos estão reagindo.

O direito de reação dos povos pela libertação é um preceito que vem sendo defendido pela China desde o início da guerra. E foi na China que movimentos palestinos assinaram um acordo de unidade. Entidades brasileiras, inclusive a Fepal, vêm pedindo para que os países do chamado Brics se envolvam em esforços de cessar-fogo. Qual é a proposta concreta e qual o papel dos países do Brics? 

Nós pedimos, em uma audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, acho que isso até foi noticiado, que o Brasil deveria promover um esforço de liderar um processo no Brics para o cessar-fogo e a reconstrução de Gaza, porque a reconstrução de Gaza não pode ficar sob o monopólio ocidental. Isso não é mais possível.

Nada que diga respeito à Palestina pode ser liderado pelo Ocidente, especialmente pelos Estados Unidos. Então, o nosso esforço é para que o Brasil lidere no Brics ou faça um esforço nesse sentido. Lembrando que o Brics está sendo ampliado, agora conta com Egito, Irã e Arábia Saudita. E tem também uma pipoqueira em forma de estado chamada Emirados Árabes Unidos, uma pipoqueira com petróleo, então não conta.

Agora a Turquia pede ingresso. Há um processo para a Indonésia, mas, claro, nós estamos falando de China, Rússia, Índia, África do Sul e Brasil. Não por acaso, a petição para apurar o genocídio é de um país do Brics, a África do Sul, e que sofreu o apartheid. Todo apartheid é um processo de genocídio. Por isso que a convenção para eliminação do apartheid, do racismo, todas as formas de discriminação, adota uma parcela do texto contra o genocídio.

As formas de se praticar o genocídio também estão na resolução do apartheid. E quem apoia essa petição? O Brasil apoia, a China apoia, a Rússia apoia. Aliás, há 15 dias, após o início desse extermínio, dessa solução final de Israel contra o povo palestino, o presidente Vladimir Putin disse que o cerco a Gaza era igual ao cerco nazista a Leningrado. Ele disse isso.

E o que a China diz é um pouco mais, digamos assim, ela diz que o povo palestino tem direito à autodeterminação, mas mais do que isso, ela diz que o povo palestino tem direito à autodefesa e a China nega o direito à autodefesa a Israel. Por quê? Porque a potência ocupante não tem direito a autodefesa. Ou por acaso o regime de apartheid na África do Sul tinha direito de autodefesa frente aos negros que lutavam contra o apartheid?

Ou por acaso os Estados Unidos tinham direito de autodefesa no Vietnã? Ou por acaso os britânicos tinham direito à autodefesa na Índia? Ou por acaso os belgas tinham direito à autodefesa no Congo? Ou por acaso os portugueses e os espanhois tinham o direito de autodefesa frente ao extermínio da população ameríndia? Ou, por acaso, os donos dos engenhos tinham o direito de autodefesa contra os escravizados? Evidente que não, e a China foi corajosa ao afirmar isso e nós temos defendido que uma solução duradoura também passa pelos palestinos.  

Em primeiro lugar, reconhecer que eles têm que capitanear até mesmo a liderança do processo de reconstrução de Gaza, de reconstrução de toda a Palestina. Mas para isso é preciso haver uma unidade Palestina. E aí entra o papel da China. A Palestina e os palestinos devem encontrar um meio de reconciliação de todas as forças políticas e sociais. E das organizações não apenas partidárias ou daquilo que nós designamos como resistência. E resistência não é apenas bélica.

Nós, aqui no Brasil, realizamos resistência. Aqui no Brasil, afinal de contas, é preciso combater a narrativa sionista, a Globo, é preciso combater o complexo do genocídio midiático. Isso tudo é resistência. Então, somente com reconciliação, um governo de unidade nacional e de emergência a reconstrução do Estado Palestino ou do embrionário Estado palestino de todas as suas instituições, inclusive a OLP, a Organização para Libertação da Palestina, seu conselho nacional e seu conselho executivo, é que nos levarão a um grande caminho.

Nós estamos defendendo isso há muito tempo. Tem várias notas nossas nesse sentido. A comunidade Internacional deve apoiar isso. Apoiar a investigação do genocídio e começar a boicotar Israel, sancionar Israel tal qual fizeram contra a África do Sul e tal qual se fez contra a Alemanha, só que contra a Alemanha houve mais. A comunidade Internacional pegou em armas contra o nazismo. É preciso pegar em armas contra esse novo nazismo. 

Mas quais são os principais obstáculos hoje para a unidade palestina? E esse acordo na China assinado por Hamas, Fatah e outras 12 organizações palestinas foi suficiente para superar esses obstáculos? 

Até agora [o acordo] não foi dinamitado. Então há uma esperança de que ele se realize, mas atores regionais precisam contribuir mais e não dividir mais os palestinos para corresponder aos objetivos de aliança com o Ocidente, especialmente com os Estados Unidos, afim de obter proteção ou melhores negócios.

O declínio do domínio ocidental deve levar a uma reconfiguração do poder na região. Irã e Arábia Saudita apertaram as mãos para acabar com a falsa cizânia entre xiitas e sunitas, que servia para colocar essas duas grandes potências geográficas, demográficas, econômicas, energéticas e bélicas uma contra a outra e destruir o Oriente Médio. Quando a China bloqueia isso, começa a haver uma nova reconfiguração no Oriente Médio. Então é preciso também haver essa nova reconfiguração. 

O presidente Lula recentemente, numa oposição considerada forte, comparou o que acontece em Gaza com o Holocausto cometido pelos nazistas? Isso causou uma reação de Israel, que o declarou “persona non grata”. Hoje as relações não estão rompidas, mas estão congeladas. Qual a relação da Fepal com o governo brasileiro e a organização exige outras posturas do Executivo? 

Bom, primeiro que ser considerado “persona non grata” em Israel é uma espécie de Oscar ou Nobel dos direitos humanos. Todo mundo gostaria de ter esse título. Então acho que o Lula já está agraciado, já ficou na história com esse título.

O Brasil adotou uma postura muito correta. É claro que há questões pontuais. Utilizar, por exemplo, a palavra de que houve uma ação terrorista, eu acho que isso foi muito mais uma imposição da narrativa daquele momento do que necessariamente uma ideia, a priori, do governo brasileiro. No resto, o Brasil agiu bem. Primeiro, rapidamente disse que era um genocídio.

O presidente Lula, corajosamente, traçou um paralelo com a Segunda Guerra Mundial que nós já dizíamos, inclusive nas nossas comparações. O presidente Lula colocou o dedo na ferida. Claro que o presidente Putin já tinha dito que o cerco a Gaza era igual ao cerco nazista a Leningrado. Portanto, o Lula não estava sozinho nessa comparação. Ele também apoiou a petição da África do Sul e continua apoiando. É bom lembrar que no início do genocídio, o Brasil presidia o Conselho de Segurança da ONU e tentou várias resoluções de cessar-fogo, que foram vetadas pelos Estados Unidos. Portanto, se dependesse do Brasil, não teria esse genocídio. O Brasil foi claramente contra isso. Na prática e do ponto de vista prático, o Brasil também está fazendo coisas muito importantes. Por exemplo, barrar a aquisição de equipamentos pelo Exército brasileiro, que nós nos opusemos e denunciamos.

A compra foi cancelada. Entretanto, isso depende ainda de uma solução final que nós queremos que não seja a que está sendo imaginada por setores da defesa no Brasil. O que não está claro ainda é se ainda há a ideia de construir esses equipamentos aqui no Brasil com a subsidiária da Elbit, que é israelense, no Rio Grande do Sul. Deve ser cessados todos os contatos com Israel. Israel deve ser sancionado, boicotado em nível militar, tecnológico, científico, de segurança, acadêmico, esportivo, político, diplomático, em todos os aspectos. Porque só com isso você isola um regime e força esse regime a obedecer as regras da convivência da comunidade Internacional, do direito Internacional, das resoluções da ONU, do direito de guerra e do direito humanitário. 

Como, concretamente e financeiramente, o Brics pode apoiar uma reconstrução em Gaza? 

Bom, primeiro de tudo, deve haver um processo gigantesco, um esforço econômico. Josep Borrell, responsável de Relações Exteriores da União Europeia, diz que poderia custar US$ 90 bilhões a reconstrução, que estaria entre US$ 50 e US$ 90 bilhões.

Portanto, nós estamos falando de uma fortuna de quase R$ 500 bilhões. Essa reconstrução precisa ser comandada pela ONU, mas sem o Ocidente, e com os palestinos liderando o processo internamente. Exteriormente o Brics.

Sem isso, não haverá reconstrução de Gaza, porque é preciso reconstruir Gaza plenamente e é preciso acabar com o bloqueio a Gaza. É preciso restituir a Gaza a vida normal. É preciso que tudo isso aconteça em um processo de reconhecimento do Estado da Palestina, dentro de um consenso interno palestino e dentro de um consenso Internacional, com base nas regras estipuladas. Deve haver dentre essas regras o direito de retorno dos palestinos. Sem isso, não haverá paz, nem para palestinos, nem para aquilo que se tornaram os israelenses. Pior de tudo, Israel seguirá afetando, no mundo inteiro, a autoridade moral, intelectual, ética e política das pessoas de fé judaica, já que o judaísmo está sendo destruído pelo sionismo. As pessoas começam a enxergar de um modo equivocado no judaísmo o responsável pelo extermínio na Palestina, e nós sabemos que não é isso.

Edição: Rodrigo Durão Coelho