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Eleições: entenda por que políticas públicas de alimentação precisam estar no plano diretor da cidade

Iniciativa organizada por pesquisadores de todo país mapeou ações importantes para o combate à fome nos municípios

Ouça o áudio:

Moradores do Sol Nascente almoçam em Cozinha Solidária de Ceilândia (DF), que faz parte da rede de cozinhas gerida pelo Movimento dos Trabalhadores Sem Teto - Marcelo Camargo/Agência Brasil
A gente não percebe a política municipal, a política local, tomando para si a responsabilidade

Há mais de um ano em vigor, um grupo de pesquisa reúne estudiosos de diversas universidades do país para mostrar à população que o combate à fome é responsabilidade, também, de prefeitos e vereadores. 

É o Cardápio de Ideias para Políticas Alimentares nas Cidades, que reúne pesquisadores de instituições do Rio Grande do Sul ao Maranhão. 

Além de denunciar a escassez de iniciativas municipais para garantir segurança alimentar para a população, o documento também reúne iniciativas de sucesso organizadas pela sociedade civil, como as cozinhas solidárias.

“Muita gente acompanhou o caso das cozinhas solidárias, por exemplo, como foram essenciais por conta do avanço da fome, tanto pela pandemia como também, talvez até principalmente, pelo desmantelamento das políticas públicas de segurança alimentar durante o governo Bolsonaro”, explica o coordenador do projeto Paulo Niederle, dos Programas de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS) e Desenvolvimento Rural (PGDR) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). 

“Então essas experiências que emergiram a partir das sociedades civil nos trazem muitos ensinamentos que podem ser incorporados pelas prefeituras municipais”, diz Niederle em entrevista ao programa Bem Viver desta terça-feira (1). 

Uma das principais reinvindicações que o estudo propõe é que o combate à fome esteja presente nas discussões sobre os planos diretores das cidades. 

“São pouquíssimas cidades que colocam alimentação no plano diretor. Isso é a expressão máxima dessa desresponsabilização", aponta o pesquisador. “O que a gente tem visto é, quando o tema da alimentação entra nos planos diretores, ele entra muito pelo aspecto da gastronomia associada à revitalização de áreas e geralmente num processo de gentrificação”, exemplifica. 

O que o professor exige é que os planos diretores discutam conceitos de pântano ou desertos alimentares, usados para explicar a situação que bairros passam por terem baixa oferta de estabelecimentos que vendem alimentos saudáveis, e não apenas ultraprocessados

“Uma das coisas que a gente chama atenção no documento é que não se trata simplesmente também de colocar uma feira, um restaurante popular, ou mesmo incentivar pequenos negócios alimentares em qualquer área da cidade.” 

“Tem que planejar, tem que saber onde as pessoas passam, o fluxo, o trânsito dessas pessoas para ir para o trabalho. Existem cidades, por exemplo, que colocam iniciativas públicas de acesso a alimentos, como sacolões, em estações de ônibus porque as pessoas estão ali para ir para o trabalho, elas passam para comprar.” 

Na entrevista o professor explica também a importância das feiras, dos mercados locais, hortas urbanas como forma de socialização e como restringir o avanço dos ultraprocessados para a população.

Confira a entrevista na íntegra 

Como vocês têm observado a discussão de combate à fome nas políticas públicas das cidades e também nesta campanha eleitoral?

Tem ganhado espaço, mas um espaço muito pequeno. A gente ainda não tem os dados finalizados, mas a primeira impressão ratifica o que a gente já tinha visto durante o processo de pesquisa. 

Que são poucas políticas em âmbito municipal e geralmente são políticas que administram ou gerem recursos de políticas nacionais. Ou seja, programas nacionais que chegam até os municípios. 

Durante a campanha, como agora, é um tanto estarrecedor. Porque os dados em relação à insegurança alimentar reduziram nos últimos dois anos, por conta, inclusive, da retomada de determinadas políticas. Mas ainda tem muita gente passando fome no Brasil, é visível aos olhos, nas grandes capitais. 

Mas de novo, a gente não percebe a política municipal, a política local, tomando para si a responsabilidade de tratar dessas questões. 

Tanto é que nos planos diretores – várias cidades estão em processo de revisão de planos diretores – que é o principal instrumento de gestão urbana, o tema da alimentação é praticamente ausente, para não dizer completamente ausente. 

São pouquíssimas cidades que colocam alimentação no plano diretor. Isso é a expressão máxima dessa desresponsabilização.  

Como que a discussão de alimentação tem que estar presente nos planos diretores?

O que a gente tem visto é, quando o tema da alimentação entra nos planos diretores, ele entra muito pelo aspecto da gastronomia associada à revitalização de áreas e geralmente num processo de gentrificação.  

Então, é um tipo específico que está muito distante de uma entrada que torna a cidade um elemento fundamental para a gente repensar o acesso a alimentos saudáveis, sustentáveis, de uma maneira justa, enfim. 

Hoje em dia está muito claro que tratar do acesso à alimentação tem a ver, por exemplo, com a distribuição dos alimentos nas diferentes áreas da cidade.  

Pra isso a gente usar os conceitos de desertos e pântanos alimentares, ou seja, tem muitas zonas em que as pessoas não conseguem encontrar alimentos saudáveis por preços justos. Em outras áreas há uma abundância, um exagero de oferta de alimentos ultraprocessados, de baixa qualidade, de baixo preço, e sabemos que o consumo desse alimento está associado a uma série de problemas de saúde pública. 

Uma das coisas que a gente chama atenção no documento é não se trata simplesmente de colocar uma feira, um restaurante popular, ou mesmo incentivar pequenos negócios alimentares em qualquer área da cidade.  

Tem que planejar, tem que saber onde as pessoas passam, o fluxo, o trânsito dessas pessoas para ir para o trabalho, então existem cidades, por exemplo, que colocam iniciativas públicas de acesso a alimentos como sacolões em estações de ônibus porque as pessoas estão ali para ir ao trabalho, elas passam para comprar. 

Isso que é espantoso que não entre na discussão do plano diretor. Não se pensa em como que a mobilidade urbana, por exemplo, vai estar associada ao acesso alimentos. 

Qual a importância do incentivo às hortas urbanas nas cidades?

Existem muitos tipos e muitas razões diferentes para se ter uma horta urbana. 

Em alguns casos, em algumas cidades, elas têm tido uma importância econômica do ponto de vista de abastecer com alimentos saudáveis uma população em situação de vulnerabilidade.  

Ela serve como espaços de reconexão com a natureza, digamos assim. Tem um efeito importante em termos terapêuticos nas cidades. 

A gente vê muitos idosos, por exemplo, que tem naquele espaço da horta urbana uma atividade de lazer, de reconexão social. Inclusive não só com a natureza, mas com as outras pessoas que vão ali trabalhar. É uma dimensão da alimentação para além da ingestão de alimentos, para além do consumo especificamente, mas como espaço de sociabilidades.  

É preciso também discutir a presença de mercados de bairro, em contraponto aos grandes ‘atacarejos’ que estão em expansão no país?

O Brasil ainda tá andando numa determinada direção que outros países já fizeram a meia-volta, isso por várias razões. 

Uma tem a ver com a própria concentração econômica. O setor do varejista alimentar se tornou um oligopólio controlado por grandes corporações.  

Para o consumidor, obviamente que o preço continua sendo um aspecto fundamental para decidir onde comprar seus alimentos. Mas ele começa a ser relativizado por uma série de outras questões.  

 Primeiro pela mobilidade, o transporte é ruim e é caro. Muitas vezes as pessoas começaram a perceber que comprar no mercadinho de bairro, economicamente, pode ser vantajoso, sobretudo se você vai fazer pequenas compras.  

Então vai para o mercadinho de bairro você não tem o custo de deslocamento, tempo, transporte. O tempo é justamente uma outra questão. As pessoas não têm tempo, às vezes, para fazer compras ou o tempo que elas querem.

Elas querem caminhar no seu bairro e ir ao mercadinho, não querem mais ir para um grande varejo. Na verdade, o que tem acontecido, já faz algum tempo, é esse movimento de expansão daquilo que se imaginava que ia deixar de existir. As feiras livres que foram condenadas por vários analistas a desaparecer, porque os grandes mercados tomariam conta das cidades, essas feiras estão voltando a ocupar os espaços e com muita dinamicidade. 

Os mercadinhos de bairro, eles não só voltam e estão crescendo, como as próprias grandes redes do setor supermercadista criaram as suas estratégias. 

A gente tem os mercados de bairro dessas redes também. em grandes capitais. São Paulo em particular, tem esse fenômeno aterrorizante, que se chama Oxxo, que está em todo o que é canto. Quem é de São Paulo, conhece muito bem, que demonstra justamente como esse pequeno varejo nos bairros, nas vilas, nas mais próximas dos consumidores, é um fenômeno em crescimento. 

E os ultraprocessados? Essa também é uma discussão que precisa entrar nos municípios?

Já estão mais do que comprovados os efeitos negativos do aumento do consumo de ultraprocessados. 

Algumas medidas que a gente propõe são muito assertivas. Primeiro, proibir em eventos públicos organizados com patrocínio, a propaganda de empresas que comercializam esse tipo de produto. 

Além disso, há outras medidas que tem a ver com planejamento urbano, como por exemplo as zonas de restrição aos novos empreendimentos de comercialização de ultraprocessados. Algumas cidades no mundo já avançaram [nessa medida] no entorno de escolas e hospitais.


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Edição: Nathallia Fonseca