Jogo político

Em meio a disputa de narrativa sobre queimadas, comissão da Câmara aprova convite para ouvir Marina Silva

Pedido inicial era de convocação, mas, para evitar maiores desgastes, governo negociou conversão em convite

Brasil de Fato | Brasília (DF) |
Deputado Evair de Melo (PP-ES), presidente da Comissão de Agricultura da Câmara, reduto da bancada ruralista - Alex Ferreira/Câmara dos Deputados

A Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados aprovou, na tarde desta terça-feira (8), um convite para ouvir a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a respeito do salto no número de queimadas no país. O pedido inicial, proposto por membros da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), solicitava uma convocação, ocasião em que os ministros de Estado são obrigados a comparecer sob pena de cometimento de crime de responsabilidade, mas um acordo entre ruralistas e lideranças da esquerda terminou com a conversão do pedido em convite, modalidade de caráter não impositivo. A previsão é de que Marina Silva seja ouvida pelo colegiado no próximo dia 16. 

A ministra foi alvo de cinco pedidos protocolados na comissão, entre solicitações de informações e requerimentos de convocação, que foram votados e aprovados em bloco. A análise se deu por meio de votação simbólica, modelo de apreciação de pauta em que não há contagem nominal dos votos, por isso não há placar. Os documentos eram de autoria dos deputados Rodolfo Nogueira (PL-MS) e Evair de Melo (PP-ES), ambos da FPA, sendo este último 2⁠º vice-presidente do grupo e também presidente da Comissão de Agricultura, colegiado de tradicional domínio do segmento na Câmara. Dos cinco requerimentos analisados, dois tratam de convocação e um solicita informações sobre o que Nogueira chama de "não conclusão de processos de avaliação de novas moléculas (produtos técnicos e produtos formulados ainda não registrados no Brasil) pelo Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis]".

Os outros dois pedidos requisitam informações a Marina Silva "sobre os planos do governo Lula para confiscar terras de autores de incêndios florestais", assunto já desmentido por diferentes veículos de imprensa nas últimas semanas. O boato surgiu após disseminação de fake news que tratavam do tema nas redes sociais, o que acabou servindo de combustível para alimentar novas investidas da bancada ruralista no Congresso. O segmento tem tentado estabelecer uma disputa de narrativa com o governo no que se refere ao contexto de avanço das queimadas, associando à ministra do Meio Ambiente a responsabilidade pela crise.

Para o deputado Paulo Veneri (PT-PR), suplente da Comissão de Agricultura, o discurso tira o foco do problema. "A gente sabe que a Marina é uma das pessoas que mais têm se empenhado para que tivéssemos recursos suficientes no ministério não só para evitarmos as queimadas, mas também para isso, e ela muitas vezes não foi atendida por vários motivos, inclusive por contenção de recursos."

Além da precariedade na estrutura de combate a incêndios em âmbito nacional e também especificamente nos estados, o cenário conta com um outro conhecido problema: a permanência das ocorrências de queimadas ilegais, que põem em xeque a vegetação e a biodiversidade e aprofundam o desequilíbrio climático. Dados oficiais da Polícia Federal mostram que o órgão já abriu 101 inquéritos para investigar incêndios florestais de teor criminoso. 

Pauta

A Comissão de Agricultura tem em vista ainda outras propostas que miram o governo Lula. Uma delas é um requerimento que pede a convocação do ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, para tratar de supostas "denúncias de que o governo Lula estaria favorecendo a expansão de terras para grupos militantes". O enredo é um dos compartimentos da disputa de narrativa alimentada pela bancada ruralista no que se refere à pauta agrária e tem como foco atingir a política de reforma agrária.

O requerimento em questão é de autoria do deputado Evair de Melo e estava previsto para ser apreciado nesta terça (8), mas não entrou nas discussões do dia. O documento pode entrar em análise nesta quarta, quando o colegiado terá nova reunião.

Edição: Martina Medina