programa bem viver

Medo do fogo, temor da enchente: ansiedade climática é rotina no Acre, diz Angela Mendes

Filha de Chico Mendes lamenta que clima não fez parte do debate eleitoral em Rio Branco, que reelegeu bolsonarista

Ouça o áudio:

Brasiléia (AC) teve mais de 75% da cidade alagada em fevereiro e passou por forte estiagem em setembro - Foto: Marcos Vicentti/Secom

No Acre, as primeiras chuvas de outubro foram o bastante para suprir a necessidade de alguns municípios afetados drasticamente pela seca, ao mesmo tempo que despertou alerta na população, principalmente da capital Rio Branco, pelo temor de enchentes. 

Em fevereiro deste ano, o estado amazônico passou por extremos relacionados às cheias, vivendo uma enchente histórica em alguns municipios. Por exemplo, Brasiléia, cidade na fronteira com a Bolívia, onde o rio Acre chegou a mais de 15 metros.  

Passados cinco meses, em setembro, a população viu o afluente alcançar apenas 67 centímetros. Agora, em outubro, passado o pior momento da seca, os moradores enfrentaram problemas com uma chuva de granizo que destruiu telhas na cidade.  

“Ansiedade climática”, define Angela Mendes, filha do seringueiro e líder sindical Chico Mendes, assassinado em 1988. “Esse termo já chegou nas bases, porque não é mais do que definir o que as pessoas veem sentindo, quem está recebendo maior impacto desses extremos climáticos".

“Se durante o período de chuva, que para nós a gente chama de inverno, as pessoas ficam ansiosas sem saber o que esperar, se vai ter enchente e como se preparar, durante o período de estiagem é a mesma coisa, só que com medo do fogo, porque a gente vem tendo recordes de focos de queimada”, explica em entrevista ao programa Bem Viver desta terça-feira (22). 


Angela Mendes é presidente do Comitê Chico Mendes que perpetua legado de seu pai / Cris Uchôa

Embora reconheça estar diante de um problema global, Angela Mendes cobra das prefeituras mais atitude de amparo para a população. Ao mesmo tempo que lamenta que o debate climático não tenha sido um assunto discutido durante as eleições na capital Rio Branco, que elegeu em primeiro turno o atual prefeito Tião Bocalom (PL). 

“A gente não viu, por exemplo, agora nessa última eleição, nenhum debate aprofundado sobre essas questões climáticas. E o atual prefeito que foi reeleito tem um histórico de enchentes durante o mandato dele. E até então a gente não viu nenhuma medida mais concreta”.

Na entrevista, Angela Mendes celebrou candidaturas comprometidas com o clima que foram eleitas no Brasil, como é o caso de Eliete Paraguassu (Psol), primeira vereadora quilombola de Salvador.

Confira a entrevista na íntegra 

As chuvas que chegaram em outubro foram o suficiente para, ao menos, amenizar os problemas gerados pela seca nas comunidades da Amazônia? 

A Amazônia é muito grande, às vezes chove bastante em algum lugar, não chove suficientemente no outro. 

Eu acho que pelo menos amenizou algumas situações. Mas aí a questão agora é a preocupação com as enchentes, afinal vivemos extremos climáticos e é preciso também falar da ansiedade climática. A gente já começa a sentir a chegada das primeiras chuvas com preocupação.

As previsões, por exemplo, sobre temporais aqui no Acre não são nada boas. O início das chuvas vem acompanhada dos temporais. No sábado [19], a gente teve uma chuva de granizo principalmente no município de Brasileia e as pessoas tiveram prejuízos os enormes, com as telhas todas furadas das pedras de gelo. 

Fale mais sobre ansiedade climática. É algo que a população já vem usando para expressar o que está sentido? 

Esse termo já chegou nas bases, porque não é mais do que definir o que as pessoas veem sentindo, quem está recebendo maior impacto desses extremos climáticos.  

Esse sentimento de ansiedade, de preocupação que nos atinge. Eu, particularmente, sofro. Eu não moro na cidade, eu moro na zona de transição, então eu também tive que cavar poços, além disso convivo com o medo de que o fogo entre na minha área.  

Então se durante o inverno, período de chuva que para nós a gente chama de inverno, as pessoas ficam ansiosas sem saber o que esperar, se vai ter enchente, se não vai ter enchente quando ela vem como se preparar, durante o período de estiagem a mesma coisa também, só que com medo do fogo, porque a gente vem tendo recordes de focos de queimada.  

A gente sabe que o Estado não está preparado para atender todos esses focos, eles se alastram de forma incontrolável, entram em propriedades de pessoas que não são responsáveis por esse fogo. 

Então [quando] vão se aproximando esses períodos, as pessoas vão ficando ansiosas e com medo, porque ninguém toma providência, as prefeituras que deveriam se preocupar, pouco debatem sobre isso. 

A gente não viu, por exemplo, agora nessa última eleição, nenhum debate aprofundado sobre essas questões climáticas. 

E o atual prefeito, que foi reeleito, tem um histórico de enchentes durante o mandato dele. E até então a gente não viu nenhuma medida mais concreta.  

A não ser criar abrigos durante os períodos de enchente, manter as pessoas em abrigos E aí, quando elas retornam para casa, distribuir bens ou comida, que normalmente vem através do governo federal, de programas do governo federal. 

Como foram as eleições em Rio Branco? Foi frustrante ver tudo se resolver no primeiro turno, sem aprofundar um debate de ideias sobre mudanças climáticas, por exemplo?

Olha, a gente ainda vem de uma memória de muita criminalização do PT, da esquerda como todo. 

Eu acho que na verdade são vários fatores. Por exemplo, o atual prefeito, ele criou programas que beneficiaram o público [apenas] no período de campanha. 

Um programa, por exemplo, de calçamento de ruas, que ele fez de qualquer forma no período de pré-campanha para ganhar votos, o que é muito natural desses candidatos do centrão e de extrema direita. 

Então a gente está cheio de obras eleitoreiras que não fazem o menor sentido. Os servidores são o nosso grande público eleitoral, os funcionários da prefeitura sejam servidores de carreira ou de empresas terceirizadas, como em todo Acre. 

O principal empregador no Acre são os governos municipais estaduais e eles fazem pressão, eles fazem chantagem usando a máquina pública, principalmente.  

A gente ainda vive essa política de compra de votos, compra e venda de votos, porque o sistema mantém a nossa população tão alienada, tão aprisionada nas suas necessidades, nas suas dificuldades, é que isso sustenta.

Infelizmente, a gente vê mais uma vez a extrema direita ganhando força aqui no Acre. E a população não consegue entender a gravidade desse momento que a gente vive. 

A gente foi para as urnas com a cidade coberta de fumaça. A gente ainda tinha muita fumaça, sabe? Fumaça pra caramba. A gente estava sem poder respirar direito, só engolindo fumaça mesmo. 

Mas infelizmente ainda não há uma conexão entre esse cenário e a necessidade de começar a avaliar sobre o valor do nosso voto, a importância desse voto para o futuro.  

Mas houve vitórias no que diz respeito a vereadores e vereadoras eleitas pelo Brasil, certo?

Eu tive a grata oportunidade de estar em Salvador quando a Eliete Paraguassu lançou a campanha dela e eu jamais poderia deixar de participar de um momento tão importante simbólico. Nessa campanha de uma mulher negra, pescadora, marisqueira, uma ativista que sofre muitas ameaças. 

E nós tínhamos mulheres também incríveis, candidatas em vários outros lugares. Aqui é nossa vizinha Neidinha Surui, em Rondônia, em Porto Velho, ou Antonia Cariongo em São Luís. 

Agora, o que precisamos fazer é voltar às bases para fazer formação política de base,  movimentar a educação popular, porque não tem outra saída para a gente. 

É trazer a educação popular como um pilar de transformação de pensamento da sociedade, como um hackeamento do sistema que nos coloca num sistema de educação que é precário 

A gente precisa melhorar a nossa educação, porque é através da educação, da arte, da cultura que a gente vai transformar, sabe? Eu não acredito que seja por outro caminho que a gente vá despertar a consciência das pessoas.  

Mas ainda tem que superar muita coisa dentro dos próprios partidos, porque nós tivemos companheiras que foram muito prejudicadas dentro desse sistema eleitoral que muitas vezes privilegia homens brancos.


Confira como ouvir e acompanhar o Programa Bem Viver nas rádios parceiras e plataformas de podcast / Brasil de Fato

Sintonize

programa de rádio Bem Viver vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 11h às 12h, com reprise aos domingos, às 10h, na Rádio Brasil Atual. A sintonia é 98,9 FM na Grande São Paulo. A versão em vídeo é semanal e vai ao ar aos sábados a partir das 13h30 no YouTube do Brasil de Fato e TVs retransmissoras: Basta clicar aqui.

Em diferentes horários, de segunda a sexta-feira, o programa é transmitido na Rádio Super de Sorocaba (SP); Rádio Palermo (SP); Rádio Cantareira (SP); Rádio Interativa, de Senador Alexandre Costa (MA); Rádio Comunitária Malhada do Jatobá, de São João do Piauí (PI); Rádio Terra Livre (MST), de Abelardo Luz (SC); Rádio Timbira, de São Luís (MA); Rádio Terra Livre de Hulha Negra (RN), Rádio Camponesa, em Itapeva (SP), Rádio Onda FM, de Novo Cruzeiro (MG), Rádio Pife, de Brasília (DF), Rádio Cidade, de João Pessoa (PB), Rádio Palermo (SP), Rádio Torres Cidade (RS); Rádio Cantareira (SP); Rádio Keraz; Web Rádio Studio F; Rádio Seguros MA; Rádio Iguaçu FM; Rádio Unidade Digital ; Rádio Cidade Classic HIts; Playlisten; Rádio Cidade; Web Rádio Apocalipse; Rádio; Alternativa Sul FM; Alberto dos Anjos; Rádio Voz da Cidade; Rádio Nativa FM; Rádio News 77; Web Rádio Líder Baixio; Rádio Super Nova; Rádio Ribeirinha Libertadora; Uruguaiana FM; Serra Azul FM; Folha 390; Rádio Chapada FM; Rbn; Web Rádio Mombassom; Fogão 24 Horas; Web Rádio Brisa; Rádio Palermo; Rádio Web Estação Mirim; Rádio Líder; Nova Geração; Ana Terra FM; Rádio Metropolitana de Piracicaba; Rádio Alternativa FM; Rádio Web Torres Cidade; Objetiva Cast; DMnews Web Rádio; Criativa Web Rádio; Rádio Notícias; Topmix Digital MS; Rádio Oriental Sul; Mogiana Web; Rádio Atalaia FM Rio; Rádio Vila Mix; Web Rádio Palmeira; Web Rádio Travessia; Rádio Millennium; Rádio EsportesNet; Rádio Altura FM; Web Rádio Cidade; Rádio Viva a Vida; Rádio Regional Vale FM; Rádio Gerasom; Coruja Web; Vale do Tempo; Servo do Rei; Rádio Best Sound; Rádio Lagoa Azul; Rádio Show Livre; Web Rádio Sintonizando os Corações; Rádio Campos Belos; Rádio Mundial; Clic Rádio Porto Alegre; Web Rádio Rosana; Rádio Cidade Light; União FM; Rádio Araras FM; Rádios Educadora e Transamérica; Rádio Jerônimo; Web Rádio Imaculado Coração; Rede Líder Web; Rádio Club; Rede dos Trabalhadores; Angelu'Song; Web Rádio Nacional; Rádio SINTSEPANSA; Luz News; Montanha Rádio; Rede Vida Brasil; Rádio Broto FM; Rádio Campestre; Rádio Profética Gospel; Chip i7 FM; Rádio Breganejo; Rádio Web Live; Ldnews; Rádio Clube Campos Novos; Rádio Terra Viva; Rádio interativa; Cristofm.net; Rádio Master Net; Rádio Barreto Web; Radio RockChat; Rádio Happiness; Mex FM; Voadeira Rádio Web; Lully FM; Web Rádionin; Rádio Interação; Web Rádio Engeforest; Web Rádio Pentecoste; Web Rádio Liverock; Web Rádio Fatos; Rádio Augusto Barbosa Online; Super FM; Rádio Interação Arcoverde; Rádio; Independência Recife; Rádio Cidadania FM; Web Rádio 102; Web Rádio Fonte da Vida; Rádio Web Studio P; São José Web Rádio - Prados (MG); Webrádio Cultura de Santa Maria; Web Rádio Universo Livre; Rádio Villa; Rádio Farol FM; Viva FM; Rádio Interativa de Jequitinhonha; Estilo - WebRádio; Rede Nova Sat FM; Rádio Comunitária Impacto 87,9FM; Web Rádio DNA Brasil; Nova onda FM; Cabn; Leal FM; Rádio Itapetininga; Rádio Vidas; Primeflashits; Rádio Deus Vivo; Rádio Cuieiras FM; Rádio Comunitária Tupancy; Sete News; Moreno Rádio Web; Rádio Web Esperança; Vila Boa FM; Novataweb; Rural FM Web; Bela Vista Web; Rádio Senzala; Rádio Pagu; Rádio Santidade; M'ysa; Criativa FM de Capitólio; Rádio Nordeste da Bahia; Rádio Central; Rádio VHV; Cultura1 Web Rádio; Rádio da Rua; Web Music; Piedade FM; Rádio 94 FM Itararé; Rádio Luna Rio; Mar Azul FM; Rádio Web Piauí; Savic; Web Rádio Link; EG Link; Web Rádio Brasil Sertaneja; Web Rádio Sindviarios/CUT.

A programação também fica disponível na Rádio Brasil de Fato, das 11h às 12h, de segunda a sexta-feira. O programa Bem Viver está nas plataformas: Spotify, Google Podcasts, Itunes, Pocket Casts e Deezer. 

Assim como os demais conteúdos, o Brasil de Fato disponibiliza o programa Bem Viver de forma gratuita para rádios comunitárias, rádios-poste e outras emissoras que manifestarem interesse em veicular o conteúdo. Para ser incluído na nossa lista de distribuição, entre em contato por meio do formulário.

Edição: Nathallia Fonseca